Após quase dois anos, CCT se reúne e entidades pedem fim de contingenciamentos

A reunião do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia foi realizada nessa quarta-feira, 1º de agosto, no Palácio do Planalto, em Brasília

Atendendo a pedidos reiterados da comunidade científica, o presidente da República, Michel Temer, convocou reunião do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT), que não se reunia desde o final de 2016.  Na reunião, realizada nessa quarta-feira, 1º de agosto, no Palácio do Planalto, em Brasília, representantes das entidades científicas foram enfáticos ao criticar os cortes de recursos destinados à CT&I e educação. Eles reafirmaram que os artigos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que garantem a não diminuição dos recursos para educação e saúde no orçamento de 2019, não devem ser vetados. Insistiram também na importância de não serem contingenciados, como vem ocorrendo, os recursos do FNDCT.

A reunião, presidida por Temer, foi conduzida pelo ministro Gilberto Kassab e teve as falas do secretário executivo do MCTIC, Elton Zacarias, do secretário de políticas e programas de pesquisa e desenvolvimento do MCTIC, Alvaro Prata, do presidente do CNPq, Mario Neto Borges, do presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, do presidente da SBPC, Ildeu de Castro Moreira, da presidente do Confap, Maria Zaira Turchi, da presidente do Consecti, Francilene Garcia, do diretor-geral do CNEPM, Antonio José Roque e do presidente da Telebras, Jarbas Valente.Os representantes da comunidade científica enfatizaram a importância das reuniões do CCT e a necessidade de que sejam convocadas com maior frequência.

Também foram convidados para a reunião, além dos membros do CCT, outros membros do Conselho Consultivo do MCTIC (como a presidente da honra da SBPC, Helena Nader) e dirigentes de institutos de pesquisa, organizações sociais, agências, empresas e do MCTIC, além do presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luiz Antonio Moreno – que se pronunciou por vídeo e foi representado na ocasião por Hugo Flórez Timorán.

Os representantes da ABC e SBPC, Luiz Davidovich e Ildeu Moreira, reiteraram os termos da carta enviada à Presidência da República há duas semanas defendendo que os artigos da LDO para 2019, aprovado no Congresso Nacional no dia 12 de julho, e que garantem um fluxo não decrescente de recursos para os setores de Educação e Saúde, não sejam vetados. Eles também reforçaram a solicitação de que os recursos arrecadados para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) não sejam desviados para a Reserva de Contingência no Orçamento de 2019. Davidovich manifestou a preocupação da ABC com a situação de sucateamento de laboratórios e com a evasão de jovens pesquisadores brasileiros. Moreira, por sua vez, enfatizou que os recursos para o CNPq e a Capes, agências fundamentais para a ciência brasileira, devem ser preservados e recuperados.

O presidente da SBPC falou também sobre a necessidade premente de se melhorar a qualidade da educação básica no País, em particular a formação científica dos jovens. Defendeu a necessidade de que a proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Ensino Médio seja rediscutida com os diversos setores envolvidos, em particular com as sociedades científicas e educacionais, assim como é necessária uma reavaliação da Lei da Reforma do Ensino Médio. “A educação científica básica é fundamental e a proposta BNCC do EM está ruim e precisa ser rediscutida, assim como precisa haver uma discussão mais ampla e profunda sobre a reestruturação do Ensino Médio e de suas consequências”, salientou Moreira.

As presidentes do Confap e do Consecti, Maria Turchi e Francilene Garcia, ressaltaram a importância da continuidade dos recursos para as Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs) e as Secretarias Estaduais de Ciência e Tecnologia, cada vez mais gravemente ameaçadas pelos cortes orçamentários na área. “O Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia inclui, além das agências federais, as agências estaduais que têm o papel importantíssimo de financiar as pesquisas, mas também de trazer para o cenário nacional as potencialidades dos estados e corrigir as assimetrias regionais”, afirmou Turchi.

Conforme acrescentou Garcia, a queda do orçamento da União desencadeou a redução de investimentos dos estados em CT&I. “Essa reação em cadeia acaba desfavorecendo o País de maneira muito drástica. E sabemos que a descontinuidade de recursos nessas áreas não é recuperada de imediato”, declarou Garcia ao Jornal da Ciência.

Ela destacou também a importância da implementação do Marco Legal da CT&I, cujo decreto de regulamentação foi publicado em fevereiro. Conforme observou, um dos pilares importantes desse processo é a adequação dos estados à nova legislação.

Segundo a presidente do Consecti, a reunião mostrou à Presidência da República o quanto as entidades representativas da comunidade científica, o conjunto das entidades que representam os setores industriais e o próprio MCTIC, estão alinhados. “Essa mensagem uníssona foi levada ao presidente da República e autoridades presentes”, pontuou.

Já o diretor-geral do CNPEM, Antonio Roque, contou que o projeto Sirius, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), está avançando, mas que para que tenha o impacto devido no desenvolvimento científico do País, e para que seu potencial seja utilizado ao máximo, é importante que os grupos de pesquisa nacionais, bem como os laboratórios e toda a infraestrutura envolvida, recebam o apoio adequado para operarem e terem condições de utilizar o acelerador em seus projetos.

Os representantes da comunidade científica citaram também, na reunião, a importância de recursos para a infraestrutura e para a formação e manutenção de recursos humanos, e particularmente a necessidade da recuperação do contingente de pesquisadores dos institutos de pesquisa.

“Não é possível fazer ciência sem recursos financeiros adequados, sem que seja esta a estratégia principal do País. Nesse momento precisamos reiterar que o investimento em ciência, tecnologia e inovação é indispensável para que o País se desenvolva em sua plenitude”, disse ao Jornal da Ciência Maria Zaira Turchi.

A reunião do CCT foi encerrada com a assinatura do convênio entre o Governo Federal e o BID, para a primeira operação de US$ 703,6 milhões para o programa “Inovar para Crescer”, que será executado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Do montante total da operação inicial, o BID financiará US$ 600 milhões e a Finep entrará com US$ 103,6 milhões.Os representantes da comunidade científica ressaltaram a importância dessa iniciativa, mas destacaram que, se não houver recursos para infraestrutura das universidades e grupos de pesquisa, além de recursos humanos adequados, ela pode ter baixo impacto.

Almoço

Após a reunião do CCT, no almoço com os participantes da reunião do CCT, os representantes da comunidade científica tiveram a oportunidade de falar novamente com o Presidente da República e insistiram na importância de serem revertidos os cortes de recursos para CT&I. Eles insistiram com Temer sobre a necessidade de eliminar a reserva de contingência do FNDCT no Orçamento para 2019, dado que os níveis extremamente baixos dos recursos nos últimos dois anos já provocaram prejuízos graves para o setor de ciência e educação e cortes mais profundos podem acarretar danos irreversíveis.O ministro Gilberto Kassab também mencionou que está em trâmite um projeto de lei pelo não contingenciamento de todos os fundos, que valeria a partir de 2020. O projeto é apoiado pelas entidades científicas e pelo MCTIC, no entanto, segundo ressaltou Kassab, é importante o apoio mais geral do governo a ele.

Além das questões dos recursos, Moreira reivindicou, apoiado pelos outros representantes da comunidade científica, a revogação do decreto que regulamentou a Lei de Acesso à Biodiversidade e Conhecimentos Tradicionais (Lei 13.123/2015) e que tem gerado muitos entraves às pesquisas – decisão que cabe somente ao Executivo. O presidente se mostrou disposto a atender à solicitação e solicitou ao Ministro Kassab que desse andamento à elaboração de uma nova proposta de regulamentação, mais de acordo com as demandas da comunidade científica no sentido de reduzir as burocracias e facilitar a pesquisa científica.

Na ocasião, Davidovich entregou a Temer o documento da ABC, “Projeto de Ciência para o Brasil”, com propostas para o fortalecimento de políticas públicas e setores estratégicos para o desenvolvimento nacional e que está sendo entregue aos presidenciáveis. Moreira entregou o caderno da SBPC “Políticas Públicas para o Brasil que Queremos” e o “Manifesto SBPC em defesa da CT&I, da Educação, do Desenvolvimento Sustentável e da Democracia no País”, documentos que reúnem as principais demandas do setor de CT&I, educação, direitos humanos, comunicações e saúde a serem levadas aos candidatos das próximas eleições. Ele entregou também a moção da Assembleia Geral da SBPC sobre a Lei de Reforma do Ensino Médio, a BNCC do Ensino Médio e o cumprimento das metas do PNE.

 

Daniela Klebis – Jornal da Ciência