Edição impressa do Jornal da Ciência traz as perspectivas para 2018 na área

A edição 779 do periódico traz os desafios da CT&I para 2018, além de lembrar os 70 anos da entidade

Neste ano de 2018, a comunidade científica e acadêmica brasileira tem muitos desafios diante de si, diversos deles decorrentes do retrocesso que vivemos no País em domínios variados da vida  jciencia_779_versaoweb-01social, econômica e política. Uma questão central para a própria sobrevivência do Sistema Nacional de CT&I, construído com grande esforço nas últimas décadas, será recuperar os recursos para esta área e também buscar novas fontes, em particular atuar pelo uso adequado daqueles destinados a P&D e provenientes de setores econômicos diversos. Apesar de uma pressão intensa junto ao governo federal e ao Congresso Nacional no ano passa- do, foi aprovado um orçamento geral para CT&I, em 2018, bem menor que o inicialmente previsto para 2017. Os recursos para custeio e investi- mento (o orçamento movimentável) do MCTIC alcançaram apenas R$ 4,6 bilhões para este ano. Como se esse valor já não fosse suficientemente desalentador, em fevereiro tivemos o anúncio de um contingenciamento adicional de dez por cento, que reduziu este já parco e combalido orçamento do Ministério em quase R$500 milhões. Isto faz com que tenhamos hoje, para este tipo de recurso, cerca de um terço do que se tinha alguns anos atrás. Ocorreram também reduções de recursos para a Capes, para os institutos de pesquisa, para as verbas de custeio e capital para as universidades públicas, a continuidade do bloqueio de grande parte dos recursos do FNDCT, entre tantos outros. Este quadro geral ameaça ações importantes para a CT&I do País, como editais do CNPq (em particular o Edital Universal), o programa dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia, o funciona- mento de laboratórios e de projetos científicos de cooperação internacional. Certamente uma estratégia central em 2018 será a campanha pela reversão deste quadro, em particular com o descontingenciamento dos recursos do MCTIC e a tentativa de recuperação dos recursos alocados na reserva de contingência do FNDCT, bem como a garantia de que tal fundo não possa mais ter seus recursos utilizados para outros fins.

Uma segunda ação importante para 2018 será a busca por novas fontes de recursos para CT&I  e o uso mais adequado das já existentes. Uma estratégia inicial é fazer um levantamento geral dos recursos, oriundos de empresas, que deveriam ser destinados para P&D, mas que, em muitos casos, não são usados adequadamente para os devidos fins, e buscar estabelecer mecanismos mais adequados e transparentes para sua utilização. Esta poderia ser uma tarefa articulada pelo Conselho Nacional da Ciência e Tecnologia – CCT, para o qual estamos há mais de um ano solicitando uma reunião de seu plenário, ou então realizá-lo pela ação das sociedades científicas. Essa questão está conectada com a iniciativa da Capes de propor a criação de um Fundo Privado para apoio a um programa de excelência para as universidades e instituições de pesquisa, cuja aplicação de recursos seria decidida por um conselho formado por representantes de agências de fomentos, entidades científicas e de setores empresariais. Este é um projeto que poderá ter impacto significativo, mas que deve ser discutido antes, e cuidadosamente, com a comunidade científica e acadêmica.

Ao lado destas ações, será importante a atuação, já iniciada no Congresso Nacional, para aprovar alguns projetos de Lei que apoiem o Sistema Nacional de CT&I, em particular na questão do financiamento. Um deles é o Projeto de Lei 5876/2016, que propõe destinar 25% do Fundo Social do Pré- Sal para programas e projetos na área de ciência e tecnologia. Outros dois projetos  importantes  em discussão pretendem tornar o FNDCT imune  a contingenciamentos, como tem acontecido nos últimos anos com grave prejuízo para a CT&I.  No projeto que transforma o FNDCT em fundo de natureza financeira, o que dificultaria seu contingenciamento, estamos pleiteando que seja mantido o limite de 25% dos recursos destinados para as operações reembolsáveis, como está na Lei nº 11.540/2007. Existe uma intenção de aumentar para 50% este limite, mas as entidades científicas e acadêmicas nacionais com assento no CCT se pronunciaram várias vezes contra esta opção e isto foi acertado, em reunião na Finep em 2017, com diversos setores ligados à CT&I. Uma iniciativa de médio e longo prazo que estamos propondo é a criação de um Observatório do Legislativo para que a comunidade acadêmica e de C&T possa ter uma atuação mais intensa e permanente junto ao Congresso Nacional.

Uma terceira ação importante para 2018 será a implementação do Marco Legal da CT&I, bem como o seu aprimoramento dentro da perspectiva de redução da excessiva burocracia que afeta a CT&I no País e de uma maior flexibilização nas suas atividades, mantida evidentemente a preocupação com o uso adequado e transparente dos recursos públicos. Vamos  continuar  empenhados na derrubada dos oito itens vetados na Lei 13.243/2016, mas será importante a implantação na prática do novo Marco Legal, definido a partir do decreto de regulamentação dessa Lei, publicado no dia 8 de fevereiro. Como todas as legislações abrangentes é fruto de uma concertação de vários setores, ela carrega limitações e também riscos de utilização deturpada. Será estratégico incentivar e acompanhar a sua implementação pelas agências de fomento, universidades, instituições de pesqui- sa, empresas, órgãos governamentais e também nas estruturas estaduais e identificar pontos que podem ser aprimorados.

Em 2018, a SBPC continuará a insistir com as autoridades governamentais sobre a importância do debate aberto e amplo e da participação efetiva das entidades científicas e acadêmicas, das universidades e das escolas e professores nas iniciativas para a reformulação da Educação Básica, em particular no Ensino Médio, o que não foi feito adequadamente no ano passado. Por outro lado, continuaremos em nossas ações em defesa da liberdade de pesquisa e de expressão e do respeito aos direitos civis, garantidos pela Constituição Brasileira. Eles devem ser efetivamente respeitados, o que não ocorreu em 2017, em diversas situações lamentáveis, entre as quais a intimação policial ao Dr. Elisaldo Carlini e nas ações intimidatórias em universidades e instituições de pesquisa. A SBPC, fiel à sua tradição democrática, se juntará a outros setores da sociedade brasileira contra a violência crescente no País, que se traduziu recentemente na brutal execução de Marielle Franco e de Anderson Gomes e em outros casos similares.

Outro desafio importante para a comunidade acadêmica e científica neste ano eleitoral será buscar a definição de questões centrais para as políticas públicas que possibilitem descortinar novos horizontes para o futuro do País. Entre elas, a revogação da Emenda Constitucional 95, que congela os gastos públicos pelos próximos 20 anos, e que torna o cenário para CT&I um caso de tragédia anunciada, como expresso em documento enviado ao Congresso Nacional por algumas das entidades nacionais que têm assento no CCT. A SBPC vai realizar, no primeiro semestre, oito seminários temáticos, em diversas cidades, para discutir propostas para políticas públicas de CT&I, educação básica, educação superior e PG, desenvolvimento sustentável, saúde pública, democratização da comunicação, direitos humanos e Amazônia. Os resultados destes seminários, depois de debatidos pela comunidade científica, serão apresentados à sociedade e aos candidatos ao Executivo e ao Legislativo, em particular na 70ª Reunião Anual da SBPC, em Maceió, no mês de julho. Vamos nos empenhar para que os diversos candidatos se pronunciem clara e publicamente sobre estes pontos. As secretarias regionais da SBPC se encarregarão de produzir documentos semelhantes para os candidatos aos governos e legislativos estaduais.

A SBPC celebrará, em 2018, 70 anos de sua fundação em um momento difícil para o País e para a ciência, tecnologia e educação.  Coerente com a tradição da sociedade, comemoraremos com uma ação contínua e persistente em defesa  da democracia e de políticas públicas adequadas, com uma série de eventos por todo o Brasil. Temos uma história intensa de atuação junto à sociedade brasileira, aos governos, às instituições de ensino e pesquisa, e às entidades científicas e acadêmicas, e estas comemorações certamente estarão ligadas às ações da entidade pela educação, ciência e tecnologia, direitos humanos, desenvolvimento sustentável, saúde pública e outros temas importantes para o País. Todos estão convidados a celebrarem conosco os 70 anos da SBPC e a serem também parte ativa em nossos bons combates em 2018!

 

Ildeu de Castro Moreira, presidente da SBPC

 

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