Fórum Permanente das Sociedades Científicas Associadas à SBPC define estratégias para 2018

Encontro realizado na última terça-feira (20), na sede da SBPC, em São Paulo, teve participação de representantes do CNPq, Finep e Capes. Foram definidos cinco pontos de ação nas áreas de ciência, tecnologia, inovação e educação

Cerca de 80 representantes de sociedades científicas de todo o País estiveram reunidos nesta terça-feira, 20, na sede da SBPC, em São Paulo, para discutir e definir estratégias de ações para ciência, tecnologia, inovação e educação em 2018.

O encontro teve a participação de Marcelo Morales, diretor do CNPq, Geraldo Nunes Sobrinho, diretor de programas e bolsas no País da Capes, Jorge Audy, coordenador da Comissão Especial de Acompanhamento do PNPG 2011-2020 da Capes, e Fernando Nielander Ribeiro, representando a Presidência da Finep. Cada um apresentou um panorama atual dos organismos e os planos para 2018, para ouvir as sugestões dos participantes do Fórum.

Morales enfatizou a importância das articulações com outros órgãos neste momento de crise para possibilitar os recursos básicos para manter os projetos de pesquisa caminhando.  “Temos poucos recursos. E, do total que temos, 90% vai para bolsas. Sobra muito pouco para novos editais. Com organização e parceria é possível fazer algo”, afirma.

O diretor do CNPq lembra que um bom exemplo de parcerias foi o edital para pesquisas sobre zika e controle do Aedes Aegypti, que, segundo contou, conseguiu alavancar R$ 65 milhões em uma ação conjunta entre o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação.

Outra possibilidade são parcerias com as fundações estaduais de apoio à pesquisa (FAPs). “É uma forma de ampliar os recursos. Se conseguirmos somar R$ 100 milhões, teremos como apoiar muitos jovens pesquisadores”, disse.

Morales também afirmou que o CNPq em 2017 focou muito em pagar dívidas e agora em 2018, com as contas em dia, o Conselho está deixando de “olhar apenas para o retrovisor” e está focado em criar novos projetos e articulações para viabilizá-los. “Mas, para isso, precisamos da participação efetiva das sociedades científicas. Temos que formular bons projetos para buscar parcerias com outros órgãos públicos. Este é o momento de nos debruçarmos sobre o que queremos para o desenvolvimento científico do País. E trazer todas essas sociedades que vocês representam para essa discussão é extremamente importante”, ressaltou.

Segundo confirmou, o CNPq pagará este ano o Edital Universal 2016 e lançará o Edital Universal 2018.

Fundo privado

Geraldo Nunes Sobrinho disse que a Capes tem estado sob pressão extra por conta do desequilíbrio de financiamento para CT&I. A Coordenação passou também por um momento de estabilização dos recursos, após o fim do Ciência sem Fronteiras, período em que recebeu uma injeção de recursos para custear o programa.  “Nós vivemos um período em que a Capes tinha muitos recursos, mas 50% deles era para o CsF”, disse. Segundo ele, em 2017 os recursos de custeio dos Programas de Pós-graduação receberam um acréscimo de R$ 6,6 milhões em relação ao valor concedido em 2016. E que este ano, o acréscimo será de R$ 13,2 milhões em relação ao valor concedido ano passado. “A grande queda que vemos corresponde aos recursos para o Ciência sem Fronteiras”, explica.

Sobrinho apontou para a necessidade de confrontar o desequilíbrio dentro do Sistema Nacional de Pós-graduação. “Se fizermos uma avaliação de investimentos da Capes vamos ver muita distorção que precisa ser corrigida”.

Um ponto que levantou discussão foi a criação de um fundo privado de apoio à pesquisa, cujos recursos seriam oriundos de empresas dos setores elétrico, de bioenergia e petróleo, de telecomunicações e de mineração. Conforme contou Nunes, a aplicação dos recursos seria decidida por um conselho formado por entidades representativas da comunidade científica juntamente com representações da iniciativa privada. A Capes está estruturando esse fundo, mas, conforme foi ressaltado no encontro, o debate ainda não abrangeu a comunidade científica.

“Essas discussões não foram abertas. Não temos ainda uma posição porque não tivemos acesso aos documentos dessa proposta. Isso deve ser feito de maneira adequada para que programas de pós-graduação das universidades públicas não corram o risco de serem decididos por empresas”, advertiu o presidente da SBPC, Ildeu de Castro Moreira.

Os presidentes da Sociedade Brasileira de Química (SBQ), Aldo Zarbin, e da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), José Gilberto de Souza, também recomendaram que se observe com cuidado a proposta da Capes. “É preciso reflexão, pois temos um projeto que se aproxima muito do setor privado”, disse Souza.

Avaliação

Outra questão debatida foi a avaliação da Capes dos cursos de pós-graduação. A presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP), Deisy de Souza, se disse preocupada com a distribuição dos conceitos da última avaliação, no qual 70% dos cursos foram classificado dentro das médias 3 e 4 ( o conceito máximo é 7). “A nossa pós-graduação não é boa? Ou precisamos rever essa avaliação?”, questionou.

“A avaliação foi importante na construção desse patrimônio nacional que é a pós-graduação, mas o mundo está mudando e precisamos pensar em um novo sistema de avaliação. Mas isso tem que vir debaixo, as instituições precisam colaborar e sugerir novos parâmetros”, respondeu Sobrinho.

Jorge Audy, presidente da Comissão do Programa Nacional de Pós-Graduação (PNPG) da Capes, concordou que o sistema de avaliação precisa ser revisto. Ele contou que o Conselho Superior da Capes encomendou um estudo sobre a proposição de um novo modelo de avaliação junto às instituições científicas. “Um dos objetivos é encontrar um modelo de avaliação que contemple as diferentes regiões”.

Audy apresentou o relatório 2016/2017 do PNPG, que traça um cenário da Pós-Graduação brasileira após os primeiros cinco anos de vigência do Plano Nacional de Pós-Graduação 2011-2020 e, com base no que foi realizado até o ano de 2015, apresentar as projeções e recomendações para o quinquênio 2016-2020.  Uma das recomendações recai justamente sobre a avaliação e a necessidade uma reflexão com os principais atores do Sistema Nacional de Pós-graduação sobre o modelo avaliativo atual, e a proposição de um novo Modelo de Avaliação da PG brasileira.

A Capes estipulou um prazo até 29 de março para receber propostas das entidades relacionadas para esta reformulação da avaliação. Porém, os participantes do Fórum criticaram a falta de comunicação, pois muitos não estavam cientes de que esta discussão já estava para ser concluída. “Poucas sociedades científicas conseguiram se debruçar sobre o tema. É o caso de prorrogar a discussão e disponibilizar o material para ampliar a discussão”, sugeriu o conselheiro da SBPC, Nelson Pretto.

Maíra Baumgarten, também conselheira da SBPC, apoiou a ampliação do prazo para dar a possibilidade das entidades trabalharem melhor a questão: “A avaliação repercute na forma como a pós-graduação é levada. Temos que refletir sobre isso”.

O professor Alfredo Wagner Berno de Almeida, conselheiro da SBPC, ressaltou que é também preciso pensar nas consequências da última avaliação. “O conjunto das universidades públicas da Amazônia, que é excelente, foi prejudicado pela avaliação da Capes. Temos o compromisso de fazer uma discussão e rever os erros da última avaliação”, propôs.

“Orçamento não permite grandes sonhos”

Ribeiro, da Finep, disse que o sistema nacional de CT&I foi fortalecido ao longo dos últimos 15 anos, mas que os cortes de recursos nos últimos anos ameaçam reverter os resultados alcançados. “Políticas de CT&I requerem previsibilidade e estabilidade de recursos. O orçamento atual não nos permite grandes sonhos”, lamentou.

Ele chamou de “coisa perversa” os cortes no orçamento para CT&I e disse que a Financiadora, cuja principal fonte de recursos é o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), está concentrando maiores esforços para garantir o pagamento dos compromissos assumidos. Reiterando a proposição de Marcelo Morales, Ribeiro salientou também a importância das articulações para arrecadar recursos. “Nosso problema não é apenas a falta de dinheiro. Faltam articulações e vontade política também”, afirmou.

O presidente da SBPC também chamou atenção para a gravidade do orçamento movimentável previsto para 2018, aprovado em R$ 4,6 bilhões na Lei Orçamentária, mas que com o contingenciamento anunciado em fevereiro caiu para R$ 4,1 bilhões – mas desse montante o que vai para as áreas de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) é R$ 3,4 bilhões. “Isso é catastrófico”, disse.

Ele lembrou algumas ações encabeçadas pela SBPC para tentar reverter o quadro, como, por exemplo, as manifestações que foram encaminhadas aos parlamentares brasileiros e a audiência pública no Congresso Nacional, em 10 de outubro, que contou com a participação de cerca de 70 entidades científicas.

Estratégias para 2018

Moreira acrescentou que se torna crucial que as entidades estejam unidas para pressionar o governo para revogar a Emenda Constitucional 95, sob o risco de que esse orçamento pífio não tenha perspectivas de aumento pelos próximos 20 anos.

Também é importante recuperar os R$ 500 milhões contingenciados em 2018 e pressionar o governo para que o montante alocado na Reserva de Contingência no Orçamento de 2018, referentes a recursos do FNDCT, sejam progressivamente liberados.  “Essa é uma briga difícil, mas é importante insistirmos”, disse o presidente da SBPC.

Outra ação importante é examinar e apoiar os Projetos de Lei no Congresso que apoiem o Sistema Nacional de CT&I e reivindicar a Reunião do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) pleno, com o presidente da República e pelo menos três ministros – pedido que vem sendo reiterado desde o ano passado.

Entre as estratégias propostas na reunião está também a criação de um “Observatório Legislativo”, uma estrutura oficial e permanente que garantiria a presença mais organizada das entidades científicas em Brasília.

Moreira destacou ainda que é importante definir que tipo de atuação é necessária nos estados com relação à destinação dos recursos das FAPs.

A implantação e o aprimoramento do Marco Legal da CT&I é outra prioridade para 2018. O projeto para uma legislação que promova maior flexibilidade e menos excesso de burocracia na área de ciência, tecnologia e inovação teve início em 2008 na SBPC e a lei foi sancionada em janeiro de 2016, com oito dispositivos vetados.

A luta para derrubar os vetos continua até hoje, mas em fevereiro a comunidade científica teve uma nova conquista, com a publicação do decreto que regulamenta a Lei. “Agora temos uma legislação que tem um grande potencial, mas que tem que ser transformada em prática”, ressaltou Helena Nader, presidente de honra da SBPC, que esteve à frente de todo o processo do Marco Legal. “Um dos pontos centrais é que se tornou possível remanejar os recursos destinados a uma finalidade para outra”, destacou Nader. “É importante que a gente se aproprie dessa legislação”.

Outras fontes

Outra proposta levantada no Fórum é que se faça um levantamento de fontes de recursos para CT&I. O presidente de honra da SBPC, Ennio Candotti, observou que existem recursos de outros ministérios que deveriam ser canalizados para CT&I. “São recursos que podem ultrapassar R$ 10 bilhões, que estão sendo manipulados sem coordenação, sem uma política nacional. Ninguém controla o que é feito com esses recursos, que são pulverizados em transações pouco transparentes”, alertou e sugeriu: “As sociedades científicas poderiam pressionar para reunir todos os ministérios que possuem recursos para projetos na área de CT&I e buscar ações coordenadas de ciência, tecnologia e P&D. Hoje essa política está toda desencontrada”.

Os participantes também discutiram suas preocupações com a educação básica. O presidente do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE), Vicente Molina Neto, questionou as politicas públicas e os investimentos. Outra questão colocada em discussão foi a falta de participação da comunidade científica na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) no que se refere ao Ensino Médio. Conforme destacaram vários participantes do Fórum, as propostas para a adaptação da BNCC ao Ensino Médio após a Reforma deste ciclo em 2017 estão sendo enviadas ao Conselho Nacional de Educação (CNE) sem discussão com as entidades científicas, e isso pode afetar profundamente a educação em ciência dos alunos.

Cinco pontos de ação considerados centrais foram definidos no encontro:

  • a revogação da Emenda Constitucional 95 (do teto de gastos);
  • participação no debate em andamento da proposta da Capes de criação de um Fundo Privado;
  • ampliar o prazo para sugestões sobre o novo Modelo de Avaliação dos programas de pós-graduação da Capes;
  • demandar junto ao MEC a participação da comunidade científica na parte da BNCC relativa ao Ensino Médio;
  • a criação de um Observatório do Legislativo;
  • e fazer um levantamento junto ao Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) de recursos destinados para P&D que não chegam ao seu destino.

Os participantes do Fórum Permanente das Sociedades Científicas Associadas à SBPC se comprometeram a atuar em conjunto nos próximos meses para colocar em ação esses pontos. O presidente da SBPC recomendou que essa mobilização vá além dos representantes, e que se consiga um esforço maior, com a participação de toda a comunidade científica. “É fundamental mobilizarmos mais a nossa base, convocar os estudantes e pesquisadores a atuarem em conjunto conosco nesses pontos”, concluiu o presidente da SBPC.

Daniela Klebis e Vivian Costa – Jornal da Ciência