Instituições da sociedade civil abrem diálogo contra a violência

SBPC participa da iniciativa cujo objetivo é incentivar o debate democrático em reação ao clima de intolerância e retrocessos na área de Direitos Humanos, que também afetam a educação e a ciência

Representantes de diversos setores da sociedade civil abriram nesta quinta-feira (15/8) a Mesa Nacional de Diálogo contra a Violência, uma iniciativa para incentivar o debate plural e democrático em reação ao clima de intolerância instalado na sociedade e de retrocessos na área dos Direitos Humanos.

Os autores da iniciativa são a Comissão Arns de Direitos Humanos e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que reuniram um grupo de representantes de instituições, entre eles a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Conselho Nacional dos Direitos Humanos, Conselho Nacional das Igrejas Cristãs (Conic), Instituto Vladimir Herzog (IVH), Conselho Federal de Psicologia (CFP), Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP), Instituto Sou da Paz e Centro Nacional de Africanidades e Resistência Afro-Brasileira (Cenarab).

O vice-presidente da OAB Nacional, Luiz Viana, afirmou que o propósito do grupo é construir e oferecer sugestões para uma nova política de segurança pública no País. Citando o Atlas da Violência, ele ressaltou que os dados atuais mostram que o Brasil é um dos países mais violentos do mundo, com 65.602 homicídios registrados em 2017, 72,4% decorrentes de mortes por armas de fogo. Deste total, 75,5% dos mortos são negros.

De acordo com Viana, a Mesa vai apresentar uma proposta de diálogo que possa unificar o discurso de combate à violência com uma política de segurança pública que signifique a cultura da paz e a preservação de diretos humanos.

A SBPC foi representada pelo antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida, conselheiro da entidade e professor das universidades do Maranhão e do Amazonas, especialista em questões da Amazônia e dos territórios indígenas e quilombolas. Coordenador do Grupo de Trabalho (GT) de Direitos Humanos da instituição, Wagner alertou para os assassinatos de lideranças indígenas, o cerceamento de lideranças quilombolas e ameaças à vida de comunidades que sobrevivem da economia de subsistência da floresta amazônica, como as mulheres quebradeiras de coco babaçu.

“Apenas em Manaus, nos últimos dias, cinco lideranças foram assassinadas e nos últimos oito meses, estamos assistindo não só aos assassinatos de indígenas e quilombolas, mas, sobretudo às ameaças de deslocamentos compulsórios de extensas comunidades”, denunciou.

Wagner relacionou a escalada da violência no Norte do País com os discursos de ódio, desinformação e perseguição que atingem as instituições de ensino e pesquisa e que têm levado a ameaças a reitores e policiais nas portas das universidades, muitas vezes em confronto com os estudantes.

“Estamos vivendo isso em larga escala e acreditamos que devam ser objeto de denúncia pronunciada porque se ligam diretamente ao cerceamento da atividade de pesquisa, da produção da verdade”.

Ele destacou que a SBPC sempre esteve vinculada à problemática da defesa dos direitos humanos e à participação na Mesa Nacional de Diálogo contra a Violência evidencia a capacidade da instituição, em seus 71 anos, de interação com o conjunto da sociedade. “A SBPC não fica encastelada em uma torre de marfim de intelectuais e cientistas, pelo contrário, participa de todos os problemas da vida cotidiana dos brasileiros comuns”.

José Carlos Dias, presidente da Comissão Arns, reiterou a importância da reunião das entidades convocadas. “No instante em que a nossa história está sendo escrita com palavras, gestos e atos que destacam a supremacia da violência, é fundamental ler a Constituição Federal para observar quais são os direitos humanos que estão sendo violados”.

A pastora Romi Becker, secretária geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic), afirmou que ser protestante ou ser evangélico não é sinônimo de violência ou exclusivismo religioso. “Não há nada mais antievangélico que a misoginia, a LGBTfobia e o racismo”.

Makota Celinha, coordenadora do Centro Nacional de Africanidades e Resistência Afro-Brasileira (Cenarab), reivindicou o fim da violência contra os negros e a liberdade de culto, com a contenção de ataques a centros religiosos de matriz africana. “Nós nunca saímos de casa pra quebrar qualquer outro templo ou para catequizar quem quer que seja”.

Na sessão também foi distribuído um manifesto de instalação da Mesa, defendendo a necessidade de buscar a cultura de paz, com respeito aos direitos humanos e a promoção da participação democrática. O documento diz ainda que as entidades se comprometem a levantar as bandeiras da tolerância profunda, do respeito ao direito do outro e da busca da união da diversidade.

Janes Rocha com informações de Mariana Mazza e OAB