Reflexões sobre o processo de ensino e aprendizagem em meio à pandemia

“Que a ciência ilumine a construção dos caminhos que irão guiar nossos passos no combate e na tão esperada reconstrução que virá pós-pandemia”, escreve conjunto de docentes que estão atuando no programa SBPC vai à Escola de Santa Catarina, em artigo

“Que a ciência ilumine a construção dos caminhos que irão guiar nossos passos no combate e na tão esperada reconstrução que virá pós-pandemia”, escreve conjunto de docentes que estão atuando no programa SBPC vai à Escola de Santa Catarina, em artigo

Na semana da Marcha pela Ciência, em tempos de combates em muitas frentes, encontramos um exército de cientistas Brasileiros com força simbólica muito grande. Dentro deste coletivo, encontramos brasileiras e brasileiros dispostos a se aproximar da sociedade, dividindo experiências e trazendo reflexões sobre diferentes áreas da ciência. Nesse ano, somam-se a estes esforços cientistas que acreditam que a educação pública, do ensino infantil ao médio, pode inserir a ciência em suas práticas cotidianas, enriquecendo o ambiente escolar, reforçando os laços entre escolas, estudantes e sociedade.

Somos pesquisadores de instituições de Santa Catarina (UFSC, UDESC, FURB, IFSC) que tiveram propostas aprovadas no programa SBPC Vai à Escola, envolvendo instituições de diferentes regiões do estado. Buscamos construir uma ponte entre os diferentes níveis de formação, fazendo circular saberes que em muito poderão contribuir no processo de ensino e no processo de formação cidadã das crianças e da juventude catarinenses.

Em 2020, nove projetos contribuem para a iniciativa SBPC vai à Escola, do litoral à serra catarinense. Eles preveem atividades sobre: a conservação da biodiversidade de fungos, de primatas e dos ecossistemas costeiros; a compreensão da diversidade genética e da diversidade de gênero; da química dos perfumes aos foguetes no espaço; o engajamento de jovens a pensar sua profissão, incluindo a de ser cientista.

Em meio à alegria pela consolidação desse grupo e pelo início dos trabalhos, nas conversas preliminares de articulação e do planejamento, destacou-se a preocupação sobre o processo de ensino e aprendizagem em meio à pandemia e à quarentena necessária.

Deve-se reconhecer que a pandemia coloca a humanidade, um planeta inteiro, em uma situação nunca antes experimentada. Os mais de três milhões de humanos contaminados, a severidade da doença com seus milhares de mortos, o isolamento/distanciamento social impõem sobre a sociedade demandas inéditas. Neste contexto conturbado, crescem as pressões pela retomada das atividades econômicas, assim como para a retomada das atividades vinculadas ao ensino. Escolas, particulares ou púbicas, se empenham em levar para milhões de jovens catarinenses, e brasileiros, conteúdos diversos de forma virtual.

Entretanto, diversos questionamentos têm sido feitos sobre o quão válida é a retomada às pressas das atividades escolares para garantir a qualidade na formação cidadã. Devemos nos perguntar qual é o melhor formato para desenvolver as atividades nessa condição ora imposta pela pandemia e que irá perdurar em nossa civilização. Nessa análise, deve-se considerar a formação/capacitação da escola, coordenação, professores e estudantes, em interagir pelas plataformas de ensino remoto. Deve-se ainda avaliar essa questão trazendo à luz a gigantesca heterogeneidade social considerando as carências e fragilidades socioeconômicas e as condições mínimas necessárias para construir esse processo de aprendizagem.

Deve-se garantir que a educação seja um processo mais equitativo e que não irá sobrecarregar as condições de trabalho de professores nas escolas públicas, que já sofrem pela contratação temporária, plano de carreira precário, falta de tempo para preparar o conteúdo a ser trabalhado e promover projetos integradores no espaço escolar. A nossa preocupação parte de que há professores sob condições de infraestrutura limitadas, sobrecarga de trabalho e carência de formação para lidar com as tecnologias digitais. Considerando os estudantes, vale lembrar que há um grande contingente que depende do espaço escolar para fazer a sua refeição diária. O que esperar dessas crianças e jovens em relação à disponibilidade de tecnologias e condições mínimas para o processo de aprendizagem? Essas discrepâncias eliminam a necessária equidade para a construção de uma sociedade coesa e harmônica. Se os caminhos e decisões que nos trouxeram até aqui são hoje abundantemente criticados, não podemos deixar que a inércia de um sistema viciado nos mantenha nos trilhos que têm como destino um precipício de crises sociais, ambientais e econômicas. Portanto, que esse momento sirva para cultivarmos a solidariedade e a cidadania.

No âmbito da educação, o Estado brasileiro deve atuar fortemente no combate dos diferentes desdobramentos da pandemia, promovendo conhecimento e oportunidades para se valorizar a ciência e os diferentes saberes. Estado e Escolas devem aproveitar o momento para mapear as vulnerabilidades de sua comunidade, de seu entorno, de seus professores, alunos e famílias. Que o atual cenário seja um momento de aprendizagem de aspectos-chave sobre a importância da educação em um sistema público de qualidade e para todos na sua diversidade de realidades. Que este momento reforce a importância da solidariedade nas relações interpessoais e destaque a instituição escolar como espaço que agrega a comunidade em que está inserida, contribuindo com ações coletivas para a preservação da integridade e do bem-estar social. Que a força da construção coletiva seja reconhecida e incorporada nas práticas educativas. Que a ciência ilumine a construção dos caminhos que irão guiar nossos passos no combate e na tão esperada reconstrução que virá pós-pandemia. Que o Brasil dê a devida importância à educação e à ciência, promovidas como bens públicos para a construção do bem-estar social e da maior resiliência de nossa sociedade diante da crise vivida e daquelas que infelizmente ainda virão.

Sobre os autores

Alessandra Larissa D Oliveira Fonseca OCN/UFSC

Alinne de Lima Bonetti – NIGS/UFSC

Anelise Maria Regiani – QMC/UFS

Carla Ivane Ganz Vogel, UDESC

Eduardo Jara – Projeto Esag Kids – Esag/Udesc

Elisandro Ricardo Drechsler-Santos – BOT/UFSC

Miriam Pillar Grossi  – ANT/UFSC

Muryel de Carvalho Gonçalves – Ciência da Ciência – Berthinha Lutz

Paula Borges Monteiro – IFSC – Campus Florianópolis

Zelinda Maria Braga Hirano- Projeto Bugio/CEPESBI/ FURB

Paulo Horta – BOT/UFSC

André Ramos – Secretário Regional da SBPC em SC