Quando se entra em cena a noção de perspectiva, não há como não recorrer a um sentido mínimo deste termo. Ele pode ser aquela vista ao longe, uma expectativa e um sentimento de esperança. Será que o quadro da educação enquanto vista ao longe contém uma expectativa e uma esperança?
Do ponto de vista da inserção da educação como direito em nossa Constituição (que entra em seu trigésimo ano), não há dúvida de que o capítulo que a encerra foi o mais avançado que tivemos em todas as nossas Leis Magnas. É direito da pessoa enquanto indivíduo, enquanto cidadão e enquanto participante de grupos sociais, direito juridicamente protegido por muitos lados: financiamento, gratuidade, obrigatoriedade (dos quatro aos dezessete), gestão democrática, recursos jurídicos quando da omissão do Estado. Além disso, o regime de colaboração, inscrito na Constituição buscar respeitar o federalismo em uma dimensão cooperativa, dada a importância do direito à educação.
Estes princípios foram reinscritos na lei de diretrizes e bases da educação nacional (LDB) a qual incorporou muitas alterações de variada ordem e, mais recentemente, pelo Plano Nacional de Educação (PNE) de 2014. Se a LDB tem como foco predominante a organização pedagógica e recessivamente o financiamento (mas não menos importante), o PNE inverte estes objetivos. Ele tem o financiamento ampliado como infraestrutura para a melhoria da qualidade da organização pedagógica. Logo, um é condição para outro e reciprocamente.
Tanto o capítulo da educação da Constituição, como a tramitação da LDB e a do PNE contaram com intensa participação de educadores e educadoras. E esta participação, ainda que restrita aos trâmites parlamentares, não deixou de existir. Participação esta que cresceu com a perspectiva de que o PNE viesse a garantir alguns fatores indispensáveis para a qualidade da educação: a melhoria da infraestrutura das instituições escolares, a atualização tecnológica das escolas, a universalização do acesso em todas as etapas da educação básica, a formação docente articulando de modo virtuoso a relação teoria/prática, a dignificação salarial dos professores, a ampliação de acesso ao ensino superior. Ora, se há ampliação, melhorias, não como não associar a melhoria da gestão com a ampliação dos recursos.
Pois bem, com a deposição da presidente Dilma Rousseff houve uma mudança nos rumos da educação, seja por razões macroeconômicas, seja por disposições conjunturais. Pelas primeiras, a emenda constitucional n. 95/2017 do regime fiscal que cria um teto para os gastos públicos (despesas primárias) por vinte anos alterando o papel do Estado na promoção do bem-estar social. Como ficam as coisas se o número de habitantes crescer e o PIB também? É verdade que não se pode esquecer que, antes desta emenda, uma das fontes da ampliação dos recursos com os quais se contava, ou seja, os recursos do pré-sal dada a variação do preço do barril do petróleo decresceu.
Com isso, o atual governo pôs o PNE em banho-maria quando não em esquecimento em tudo no que se refere à ampliação de recursos, seja na educação, seja no investimento mais permanente em ciência e tecnologia. Parece que este PNE, tão discutido nos Municípios e Estados, tão participado por meio de associações profissionais e científicas, vai tomando o rumo de seus predecessores: o fracasso. Não é de se espantar que tal rumo ao invés de uma expectativa que gere esperança, acabe por estabelecer um clima de desânimo.
Do ponto de vista conjuntural, o recuo quanto ao PNE foi sendo ocupado por iniciativas, certamente de recorte importante, porém conjunturais quando descoladas do conjunto do PNE. Assim, a propaganda governamental põe na mídia a denominada Reforma do Ensino Médio, a Residência Pedagógica e a Base Nacional Comum Curricular da educação infantil e do ensino fundamental. Nas duas primeiras, praticamente não houve participação mais ampla dos interessados como docentes e estudantes e na terceira, não só o ensino médio (reformado) se descolou da educação básica como parece não contar com participação ampla induzida pelos atuais governantes.
Voltamos à antiga tese trazida por Anísio Teixeira de que continuamos reproduzindo e ampliando a distância entre os valores proclamados formalmente, postos no ordenamento jurídico, e os valores reais, em que as políticas públicas conjunturais acabam por reproduzir o elitismo educacional.