Toda matéria do universo é composta pelos elementos químicos que compõem a tabela periódica e esta fantástica compilação de átomos e moléculas é responsável por todas as substâncias encontradas na terra, desde as mais simples e vitais, como oxigênio, água e a amônia, até as estruturas moleculares de enorme complexidade, como o DNA.
A organização sistematizada dos elementos, mundialmente conhecida como a tabela periódica dos elementos químicos se inicia em 1817 com os estudos de Johann Wolfgang Döbereiner, conhecido como a “lei das tríades”, seguido pela curiosidade investigativa de John Newlands e que, em 1869, culminou com a fantástica invenção Dimitri Ivanovich Mendeleev – a organização sistematizada dos 63 elementos conhecidos na época. O trabalho de Medeleev se notabilizou pela engenhosidade de descrever os elementos por símbolos, com massa atómica e propriedades químicas e físicas, numa época em que o conceito atômico ainda não existia e, mesmo assim, agrupou os elementos pelas semelhanças e propriedades apresentadas. Sem dúvida, acredito ser uma das mais belas compilações feitas pelo homem, essencial para o estudo da vida na Terra. Indiscutivelmente, a Química como é a ciência da vida e o estudo das propriedades da matéria e suas transformações é de primordial importância para o desenvolvimento humano e ao seu bem-estar atual e futuro. Em reunião da ONU ocorrida este ano foi declarado que o ano de 2019 será o Ano Internacional da Tabela Periódica do Elementos Químicos (do Inglês IYPT 2019). O reconhecimento da ONU deve-se ao aniversário de 150 anos da criação da primeira tabela de Dmitry Mendeleev, que foi publicada em 1869 e é também uma merecida homenagem de sua engenhosidade.
Mais de 3,5 bilhões de anos de evolução químico-biológica podem ser traduzidos pela formação de milhares de substâncias simples e complexas que compõem a vida na terra. Tais substâncias, conhecidas como metabólitos primários e secundários, são fontes inesgotáveis de inspiração acadêmica e tecnológica para a criação humana. Os metabólitos secundários, ou produtos naturais, se destacam pela incomensurável contribuição que têm dado aos avanços da síntese orgânica moderna e da química medicinal, cujas infinitas aplicações marcaram definitivamente a história do homem no planeta, com destaque para os medicamentos, defensivos agrícolas, fontes renováveis de energia, materiais de higiene, alimentos, cosméticos, entre outros.
O acesso sobre inúmeras informações genéticas, bem como o acelerado desenvolvimento dos estudos “-oma” (Genoma, Transcriptoma, Proteoma e Metaboloma), além do crescente desenvolvimento da engenharia metabólica, tornam a química uma área de investigação científica altamente estratégica, apta a responder inúmeras questões sobre o universo micro- e macromolecular da natureza ainda pouco conhecido, no que se refere ao seu funcionamento e interação intra e interespecífica dos organismos que habitam os ambientes terrestres, aquáticos e marinhos.
A história da química está repleta de exemplos fascinantes de produtos que revolucionaram o mundo e assim, nada mais justo termos um dia inteirinho para celebrar: o Dia Nacional do Químico (18/06). A data deve ser destacada não apenas para celebrar a importância do trabalho desses profissionais, mas, especialmente, para mostrar à sociedade a importância da Química como base para o desenvolvimento tecnológico sustentável, neste momento tão difícil da vida econômica, política e social brasileira. Nas últimas décadas, o País conseguiu aumentar em grande escala o número de profissionais formados em cursos superiores e técnicos de química. Essa conquista, em que pesem as enormes lacunas ainda existentes na educação brasileira e crise econômica agravada nos últimos quatro anos, foi um componente importante no processo de crescimento que levou o Brasil a se situar na oitava economia do mundo em 2017 (Fonte: FMI. WEO abril de 2017). Não há país que consiga responder aos desafios de seu desenvolvimento sem uma indústria química robusta, que exiba eficiência e inovações nos setores essenciais do Brasil atual – alta tecnologia em química fina, novos materiais, petróleo, energia, agricultura, pecuária, fármacos, agroquímicos.
Para os mais jovens vale lembrar, entretanto, que essa trajetória foi repleta de obstáculos, muito trabalho e conquistas. Indústria e academia conviveram, ao longo de muitos anos, com sucessivas crises. Hoje agravada de forma alarmante, convivemos com falta de capital para as tecnologias de vanguarda essenciais ao desenvolvimento empresarial, com recessão, com falta de recursos para pesquisas de ponta em temas estratégicos, com universidades sem orçamento compatível com a realidade, e com momentos de amargo pessimismo e tristeza. No caso da pesquisa científica, chega a ser surpreendente que o País tenha conseguido, em alguns campos, dar saltos tão significativos em quantidade e qualidade da produção. Esta é uma constatação que pode ser confirmada pelo número de pesquisadores de renomados centros internacionais interessados em realizar pesquisas em conjunto com brasileiros. Os resultados alcançados em tempo real, com os estudos de rede internacional sobre o zika vírus, são exemplos.
Avanços que agora parecem “esquecidos do cenário político de Brasília” foram fruto do esforço de muitas pessoas (pesquisadores, professores, políticos, gestores, empresários, outros ramos sociais) persistentes e comprometidas com a visão de que ciência, tecnologia e inovação não são custos para a sociedade e, sim, grandes investimentos, um componente insubstituível para gerar riquezas no século XXI. Nas crises, é uma solução, e nunca um problema! Visão que, no caso do Brasil, convive com a exasperante lentidão das mudanças, este ano agravadas por uma crise institucional, política e financeira deveras preocupantes. O País levou quase 15 anos para mudar uma lei restritiva à pesquisa de sua biodiversidade, causando um atraso tecnológico substancial de um setor econômico mundialmente rentável, num país que abriga uma das maiores biodiversidades do mundo, detentor de uma riqueza molecular imensurável! No entanto, a Lei aprovada, que deveria ser um instrumento de estimulo aos químicos, biólogos, geólogos, farmacologistas e outras áreas de pesquisa, tornou-se um castigo para todos que querem desenvolver pesquisa básica e desenvolvimento tecnológico aqui no País usando a natureza como meio de trabalho acadêmico e/ou tecnológico.
Que hoje, os jovens químicos que estão nos bancos das universidades e dos cursos técnicos, ao celebrar o seu dia, como cidadãos exerçam com excelência, responsabilidade, senso e sensibilidade, a profissão de químicos pesquisadores, professores, gestores, tão edificantes e essenciais para mudar o cenário econômico e social de nosso país. A Química está em todas as partes de nosso corpo, e em tudo que nos cerca. Uma ciência que tem em sua essência a arte e a paixão! Saudações especial aos jovens químicos.
Sobre a autora:
Vanderlan da S. Bolzani é professora titular do IQ-Unesp, vice-presidente da SBPC e da Aciesp