Na última terça-feira, 23, o Brasil caiu mais duas posições no Global Innovation Index, principal indicador da inovação no mundo, estando agora na 66ª posição. Ainda que os rankings mundiais não considerem todas as peculiaridades dos países e seu potencial de avanço, parâmetros como o Global Index são um indicativo de que o Brasil continua deixando a desejar em suas políticas de fomento da inovação. E boa parte do problema é a falta de uma estratégia de longo prazo para dar vazão ao potencial brasileiro.
“O desafio da inovação no Brasil” foi tema de mesa redonda nessa quarta-feira, 24, na 71ª Reunião Anual da SBPC, realizada em Campo Grande no campus da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). Para a professora da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Francilene Garcia, que coordenou os trabalhos, é inegável a necessidade de um plano estratégico se o Brasil quiser de fato avançar em P&D e transformar esse conhecimento em riqueza. “A bioeconomia, por exemplo, que é um dos temas desse encontro da SBPC, é algo precioso e estratégico para o País. E para avançar nessa área é preciso um pacto que requer um dimensionamento da questão e que toda a sociedade se faça presente para construir esse avanço”, analisou.
Um dos instrumentos fundamentais para que esse pacto tenha efeitos concretos em todas as áreas é a operacionalização do Marco Legal de CT&I. Aprovado por lei em 2016 e regulamentado em decreto de 2018, o Marco Legal é a base para uma atividade voltada para a inovação brasileira, mas a falta de estabelecimento prático das regras ali contidas mantém até hoje um quadro de insegurança jurídica que tolhe universidades e empresas de agirem dentro das novas premissas.
Esse ambiente que, na prática, ainda se mostra hostil às parcerias entre universidades e empresas tem sido um grande limitador do avanço brasileiro, com reflexos amplos na competitividade e produtividade do País. As políticas adotadas até o momento expandiram o volume de trabalhos acadêmicos e citações, mas para quem trabalha no campo da inovação, ainda é crítica a incapacidade do Brasil de converter esse conhecimento em valor comercial. “Como é que um país, que nem é mal posicionado em publicações e produção acadêmica, ser tão ruim em competitividade?”, questionou Francisco Saboya, superintendente do Sebrae/PE e vice-presidente da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec). “É que a gente não consegue fazer a tração; converter esse conhecimento em inovação de mercado.”
Para Saboya, existem três pontos que o País precisa superar para trilhar um caminho virtuoso de inovação: buscar um entendimento de como o Brasil quer se ver no futuro, superar a cultura da cópia e vencer a cultura burocrática e da inação. A insistência dos brasileiros de se mirar em exemplos de outros países, ao invés de se debruçar sobre suas próprias potencialidades e peculiaridades, tem impedido a construção tanto de um plano nacional de longo prazo quanto à superação da “cópia”, citada pelo superintendente do Sebrae.
Quanto à burocracia, este é um elemento de bloqueio que assola todos os elementos do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), atrapalhando ações importantes, como é o caso da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), organização social (OS) que mantém contratos com a administração pública. “Há uma atuação negativa, e vou falar bem alto isso, dos procuradores”, provocou o presidente da Embrapii, Jorge Almeida Guimarães, ao listar as dificuldades intrínsecas do setor. Guimarães faz coro com os demais especialistas sobre os danos gerais provocados pela falta de um plano estrutural de fomento da inovação. “É preciso eleger prioridades e, para eleger prioridades, é preciso haver planejamento.” Segundo ele, há uma “absoluta incompetência do governo de estabelecer prioridades” e isso está no cerne dos problemas enfrentado pelo Brasil neste campo.
Apesar dos desafios, iniciativas específicas tentam romper o imobilismo e estabelecer alternativas. É o caso do Plano Regional de Desenvolvimento do Nordeste (PRDNE), do qual a professora Francilene Garcia participou da concepção. O projeto, organizado em conjunto com o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) e pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), busca usar a ciência e tecnologia em sinergia com as problemáticas mapeadas na região, mas tendo como foco a base estruturante de desenvolvimento econômico. Planos como o PRDNE podem servir de base para uma política de longo prazo para o estímulo, não apenas das estruturas de inovação, como para uso desse conhecimento para a melhoria da qualidade de vida e da economia da região.
Mariana Mazza – Jornal da Ciência