No final da Idade Média, com o avanço do capitalismo e seu entrelaçamento com a ciência, o homem deixou de prestar atenção aos sonhos como conselheiros e guias. Mas sonhar é importante, porque auxilia a cognição, aumenta o desempenho nas tarefas diárias, consolidar a memória, além de estimular a criatividade. Essas foram algumas pontuações feitas pelo neurocientista Sidarta Ribeiro, formado em biologia pela Universidade de Brasília (UnB) e fundador e vice-diretor do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), durante sua conferência “A importância dos sonhos”. A atividade, que faz parte da 72ª Reunião Anual da SBPC, foi apresentada pelo reitor da UFRN, José Daniel Diniz Melo.
No início de sua explanação, o cientista falou sobre a importância que os povos antigos, como os ameríndios, davam para os sonhos, e cita alguns históricos de personalidades que os interpretam como premonições. “Muitos povos e em diferentes momentos acreditaram que os sonhos eram importantes como conselheiros e guias. Isso começa a mudar há cerca de 500 anos, no final da Idade Média, com o desenvolvimento do capitalismo e de seu entrelaçamento com a ciência”, explica Ribeiro, que também é diretor da SBPC.
Mesmo assim, Ribeiro comenta que no decorrer da história se acumularam evidências da relação entre sonho e criatividade, como por exemplo, a criação da máquina de costura, que foi oriunda de um sonho e do trabalho do pintor espanhol Salvador Dalí.
Segundo o neurocientista, por muitos anos os sonhos foram relegados pela ciência por serem objetos pouco compreensíveis, muito distantes da objetividade científica. De acordo com ele, no final do século 19, por conta do trabalho de Carl Jung e Sigmund Freud sobre o assunto, os sonhos voltaram a ser objetivo de interesse de estudiosos. Jung, por exemplo, contribuiu muito com suas teorias sobre a imaginação ativa e a dirigida como forma de explorar a imaginação e a compreensão de que a mente abriga, muito mais do que a própria representação do ‘eu’. Já Freud foi quem desenvolveu toda uma análise sobre os sonhos e seu impacto na constituição psíquica do ser humano. Ribeiro cita, por exemplo, que em seu livro “Interpretação dos sonhos” publicado pela primeira vez 1899, traz três pontos importantes: (1); os sonhos contêm restos diurnos; (2) desejos são o motor dos sonhos; e (3) sonhos são a via régia para o inconsciente.
Ribeiro explica que sonhos permitem acessar o banco de memórias e suas combinações possíveis, revelando a estrutura da mente do sonhador e o aprendizado adquirido no período em que a pessoa está acordada. “É um momento em que a gente toma contato com desejos e temores que muitas vezes a gente não reconhece”, disse.
Segundo o neurocientista esse fenômeno natural pode funcionar como um verdadeiro oráculo probabilístico. Para lembrar os sonhos, e até se programar mentalmente para que sejam produtivos, Ribeiro sugere trazer os sonhos para a vida, ou seja, falar sobre eles, gravar áudios, fazer um diário. “Com essas memórias em mãos fica fácil compreendê-los e lembrá-los. Os sonhos são o quebra-cabeça daquela pessoa que está sonhando.”
Quanto à qualidade do sono, o neurocientista diz que o sono é o regulador da saúde, junto à alimentação e aos exercícios físicos, e por isso, é parte importante do nosso bem-estar. “Sem o sono profundo existe um prejuízo cognitivo, o aprendizado e a atenção ficam prejudicados, o humor fica prejudicado. Dormir é importante para consolidar memória, fazer triagem de memória, regulação emocional, diminuir a sua reatividade a estímulos negativos e agressivos, estimular a criatividade. Dormir é muito bom, e sonhar é a cereja do bolo.”
Assista aqui à conferência na íntegra.
Vivian Costa – Jornal da Ciência