A melhor maneira de combater a proliferação de doenças infecciosas causadas por microrganismos como vírus, bactérias, protozoários e fungos, como leishmaniose visceral (LV), chikungunya, dengue, zika, hanseníase, dengue e o novo coronavírus, é a educação. A opinião é de Selma Maria Bezerra Jeronimo, professora do Departamento de Bioquímica e diretora do Instituto de Medicina Tropical (IMT) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), durante sua conferência “Impacto da urbanização e globalização no padrão de doenças infecciosas”, realizada no último dia do segundo ciclo da 72ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), no dia 9 de outubro. A atividade foi apresentada pela diretora da SBPC, Lucile Maria Floeter-Winter.
Para a cientista, é super importante entender o processo de transmissão cada uma das doenças infecciosas para saber como preveni-las. “Com conhecimento sobre as causas da doença, conseguimos diminuir o risco, conseguimos ter o controle urbano de vetores transmissores dessas doenças. A população precisa ser educada, ter conhecimento para ser proativa, porque o governo, por si só, não tem condições de examinar todos os lares para ver, por exemplo, se tem algum foco e cuidar de todos”, diz, sugerindo uma ineficácia das políticas públicas de controle dos vetores.
Jeronimo descreveu a urbanização da leishmaniose visceral (LV) no Rio Grande do Norte e a infecção assintomática por Leishmania e disse que isso permitiu estudar fatores genéticos envolvidos no risco de desenvolver doença. “Vimos que o processo de mudanças se deu pelo processo de migração de locais rurais para as áreas urbanas sem a devida infraestrutura habitacional.”
A Leishmaniose visceral ou calazar, transmitida pelo mosquito-palha ou birigui (Lutzomyia longipalpis) que, ao picar, introduz na circulação do hospedeiro o protozoário Leishmania chagasi, tem entre os sintomas febre intermitente, fraqueza, emagrecimento, anemia, palidez, aumento do baço e do fígado, comprometimento da medula óssea, problemas respiratórios e diarreia.
Segundo a diretora do IMT, a doença se expandiu nos últimos 30 anos no Brasil. “Não houve incidência, mas um espalhamento dela. Tem casos no País todo, mas o nordeste e centro-oeste continuam sendo as regiões que têm mais casos”, comenta. A cientista cita ainda que no caso de co-infecção, ou seja, infecção simultânea, de HIV. Por exemplo, a chance de morte é ainda maior. “É o caso de 7,8% dos casos registrados no Brasil”, explica.
Ao falar sobre hanseníase, a cientista observa que o diagnóstico precoce ainda é um dos principais obstáculos para a erradicação da doença. “A hanseníase ainda é um problema de saúde no Brasil, já que existe um diagnóstico tardio e o estigma continua grande, já que as pessoas eram isoladas do convívio com a sociedade e a família”, explica. Doença infecciosa causada por uma bactéria chamada Mycobacterium lepra e ou bacilo de Hansen, que sente afinidade pelas células cutâneas e nervos periféricos, a hanseníase atinge principalmente pessoas pobres em áreas com baixo acesso aos serviços de atenção básica em saúde e saneamento.
De acordo com Jeronimo, havia uma impressão que havia poucos casos de hanseníase no Estado do Rio Grande do Norte, mas quando começaram a estudar as áreas que já havia histórico da doença, novos casos foram descobertos. “Essa doença tem uma evolução lenta, cujos sintomas se manifestam principalmente por sinais como lesões e manchas na pele que pode surgir até 20 anos após a infecção”, comenta.
Além das doenças conhecidas há décadas no País, Jerônimo também apresentou estudos sobre o coronavírus. A UFRN realizou em torno de 41 mil testes por RT-PCR (molecular – Reação em Cadeia de Polimerase) e IgG-Ig. E, considerando os dois exames, 30% das pessoas testadas foram infectadas pelo novo coronavírus. “Ao fazer uma distribuição espacial dos casos de Sars-CoV-2, entre os municípios de Natal e Mossoró, foi observado que a maioria dos casos foi registrada em regiões de maior vulnerabilidade, já que os habitantes não têm condições para cumprir o isolamento social por conta da falta de espaço e saneamento, vital para a higienização”.
A cientista e professora da UFRN encerrou sua apresentação chamando a atenção para os problemas do pós-pandemia. “Não é porque existe uma pandemia que as outras doenças acabaram. Por isso, acredito que teremos que repensar como vivemos e como trabalhamos, e para isso, devem também surgir novas ferramentas de acompanhamento de pessoas e uma reorganização da força de trabalho.”
Assista à conferência na íntegra pelo canal da SBPC no YouTube.
Vivian Costa – Jornal da Ciência