Pandemia exige olhar social e compartilhar conhecimentos, dizem especialistas

Pesquisadores de seis países das Américas analisam evolução da covid-19 na região e exploram causas e as perspectivas das vacinas em painel da Associação Interciência

painel-interciencia-outÀ medida que a pandemia da covid-19 evolui no continente americano, fica cada vez mais evidente o impacto diferenciado da doença por classes sociais e raças: pobres, negros e indígenas têm sido muito mais afetados que o restante da população. Foi o que constataram nesta quinta-feira (22/10) alguns dos especialistas de seis países da região que participaram do segundo debate da série de painéis virtuais promovidos pela Associação Interciência.

Organizado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e pela Associação Interciência, o painel virtual teve como tema “A Situação da Pandemia da Covid-19 nas Américas” e foi transmitido pela página da SBPC no YouTube.

Com moderação de Lídia Brito, diretora da Unesco para a América Latina e Caribe, participaram do painel Tomas Pérez-Acle, da Fundación Ciencia & Vida e Universidad San Sebastián, do Chile; Eugenia Corrales-Aguilar, do Centro de Investigación en Enfermedades Tropicales, da Costa Rica; Mayra de la Tire, do Centro de Investigaciones y Desarrollo en Agrobiotecnología Alimentaria, do México; Eduardo Gotuzzo, da Universidad Peruana Cayetano Heredia e Instituto de Medicina Tropical Alexander von Humboldt, do Peru; Adriana Delfraro, da Universidad de la República de Uruguay, e Kathryn Edwards, da Vanderbilt University, dos Estados Unidos.

A pesquisadora mexicana Mayra de la Tirre, a pediatra estadunidense Kathryn Edwards e o médico peruano Eduardo Gotuzzo, relataram sobre a elevada incidência da covid-19 entre os povos negros e indígenas. Para De La Tirre, esse fato pode apontar para uma questão genética, mas também às condições socioeconômicas.

No México, país que se situa entre os 25% com maior desigualdade social do mundo, o desaquecimento econômico e o desemprego causados pela doença aumentaram o número de pobres de 48,8% em 2018 para 56% este ano. “Essa pandemia nos levou a ver as coisas de um modo integral, não podemos deixar de lado as questões sociais”, disse Mayra de la Tirre.

“Nós cientistas temos a tendência de analisar (a covid-19) do ponto de vista do patógeno, da sequência genética, mas esse vírus nos recorda que as diferenças de mortalidade e infecção têm a ver com contextos sociais, econômicos e de pobreza”, acrescentou a costarriquenha Eugenia Corrales-Aguilar.

Os participantes defenderam a necessidade de cooperação científica e governamental para o combate à covid-19. “Seria bom fazermos plataformas de grupos de pesquisa em áreas comuns”, sugeriu o médico peruano Eduardo Gotuzzo. “Em nosso país temos cinco grupos de investigação que poderiam trocar informações com outros grupos sobre os efeitos e a evolução dos pacientes para que a vacina tenha uma resposta rápida”, disse Gotuzzo.

“A ideia é excelente, mas temos que ter plataformas transdisciplinares incluindo pessoas das áreas sociais e, obviamente, da economia”, acrescentou Mayra de la Tirre.

Kathryn Edwards defendeu o esforço global para produção da vacina, mencionando como exemplo os estudos da farmacêutica Pfizer que tem envolvido a colaboração de pesquisadores e voluntários para testes de vários países, inclusiva Brasil e Argentina. “Deve haver um esforço global no desenvolvimento da vacina, é importante ter gente de grupos raciais diversificados para que (o medicamento) funcione” afirmou Edwards.

A pesquisadora uruguaia Adriana Delfraro destacou a importância do diálogo entre as várias disciplinas que lidam com os diversos aspectos da pandemia, que não se restringe às questões relacionadas ao vírus. “Um fator essencial é o diálogo entre as distintas áreas envolvidas: o cientifico básico, quem trabalha com estatísticas e quem trabalha com os pacientes, os intensivistas”, afirmou Delfraro. E completou: “Mas nada disso funciona se não há estrutura, financiamento, fundos e assistência para todos os habitantes”.

Os encontros promovidos pela Associação Interciência serão realizados uma vez por mês com pesquisadores especialistas indicados por associações civis. A ideia é que eles possam compartilhar informações e fazer análises qualificadas da situação da pandemia em seus países, em particular sobre o estado da dispersão do coronavírus, bem como das ações governamentais tomadas, ou não, para o enfrentamento da covid-19.

A transmissão do evento é aberta a todos e gratuita e a próxima sessão será no dia 24 de novembro.

Assista ao debate desta quinta-feira na íntegra, no canal da SBPC no Youtube:

https://www.youtube.com/watch?v=SdBzwjFsfOQ&ab_channel=SBPCnet

Jornal da Ciência