Especialistas afirmam que para avançar é preciso equilibrar as desigualdades da região
Reunir experiências quanto aos desafios da formação e fixação de doutores na região amazônica, pelos pontos de vista de uma universidade federal, de um instituto de pesquisa, de uma fundação de amparo à pesquisa e de uma secretaria estadual de ciência e tecnologia. Esse foi o cenário da mesa redonda “Amazônia: Desafio de formação e fixação de doutores”, realizada nesta quarta-feira, 23, dentro da programação da 66ª Reunião Anual da SBPC, em Rio Branco, no Acre.
A coordenação do debate ficou a cargo da professora Tania Araujo Jorge, da Fiocruz, que demonstrou preocupação ao revelar dados sobre a escolaridade no País: 70% dos brasileiros não têm sequer o ensino médio completo. “Isso se reflete na formação de professores. Há uma queda na demanda pelos cursos de licenciatura e em alguns lugares os professores de matemática, química e física estão em extinção. Isso afeta diretamente a formação de doutores”, alertou.
A experiência e as dificuldades da Universidade Federal do Acre foram relatadas pelo professor Josimar Ferreira, seu pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação. Atualmente a Ufac tem nove cursos de mestrado e um de doutorado. Segundo Ferreira, isso ainda é muito pouco. “Precisamos de políticas muito claras para mudar esse quadro. Esse é o caminho para elevar a formação na Amazônia”, desabafou ao lembrar que a região Norte é a que tem menos doutores.
O que fazer para mudar esse cenário? De acordo com Ferreira, a reposta pode estar em formar associações e redes entre as universidades. “É preciso induzir a Capes a formar programas específicos para essas áreas emergentes, por quatro ou cinco anos, até que elas se fixem”, explicou. Ele aponta que para isso são necessárias políticas específicas e uma mudança estrutural.
Problema ou oportunidade?
Para Sergio Luz, do Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD), da Fiocruz Amazônia, o caminho para colocar as pessoas no doutorado tem seu começo na iniciação científica. “Hoje no ILMD temos 30 alunos de iniciação científica e contamos com o apoio da Fapeam [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas]”, contou.
Ele propôs um novo ponto de vista para o debate e levantou a seguinte questão: o número baixo de doutores na Amazônia é um problema ou uma oportunidade? “Temos que encarar como uma oportunidade e espero que os gestores e os governantes também possam enxergar dessa mesma forma”, disse.
Na sequência, a diretora presidente da Fapeam, Maria Olívia de Albuquerque Ribeiro Simão, falou da importância de um trabalho integrado e contínuo de redes e associações para que os resultados apareçam. “Os recursos ajudam, mas é preciso olhar para esse espaço como um espaço estratégico”, frisou.
Ela concorda que a iniciação científica é o começo de um caminho que leva até a formação de doutores. “Acredito que a iniciação científica deva ser incentivada já na educação básica. O professor dessa fase deve ser qualificado para isso. No caso da Amazônia, as ações de C,T&I devem ser descentralizadas, com ofertas de bolsas de iniciação científica e programas de recursos humanos para as cidades do interior”, analisou.
De acordo com Maria Olívia, a Fapeam está conseguindo atrair pessoas por meio de seus programas de Apoio à Excelência Acadêmica (Pró-Excelência), de Apoio à Formação de Recursos Humanos em Tecnologia da Informação (RHTI-Doutorado) e de Pós-Graduação em Rede.
Desigualdades na Amazônia Legal
À frente de uma estrutura que tem apenas um ano e oito meses de existência, Marcelo Minghelli, da Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia do Acre (SECT/AC), afirmou que o estado não tem uma política de formação de doutores. “Temos alguns bons exemplos, não há dúvida, mas para fixar doutores o que conta é o orçamento”, declarou.
Ele lembrou a recente aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE), em que se discutiu mas não se resolveu a questão salarial do professor. “Vocação é fundamental, mas se não tiver salário fica difícil. Precisamos ter três eixos básicos de políticas públicas: formação, infraestrutura para desenvolver as pesquisas e salário”, ponderou.
Por sua grande extensão territorial e diferenças entre seus estados, a Amazônia Legal é marcada pela desigualdade. De acordo com Minghelli, o quadro de mestres e doutores é bastante reduzido porque a região é a que tem o menor número de instituições federais de ensino e pesquisa e uma distribuição desigual de recursos. “Precisamos equilibrar as diferenças para termos políticas sólidas na região. Os recursos são fundamentais para a formação e para se manter o sistema de ciência e tecnologia equilibrado, com um bom fluxo de mestres e doutores, além de pesquisas realizadas”, afirmou o secretário.
(Edna Ferreira/Jornal da Ciência)