Painel discute papel da ciência na defesa da democracia

SBPC participa de ato internacional virtual pela democracia brasileira

Painel

A prática da ciência é fundamental para o desenvolvimento da sociedade e da democracia. Isso foi o que concluiu o painel realizado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) durante o II Ato Internacional pelo Dia da Democracia. Intitulado “Fórum pela Democracia”, o painel virtual foi transmitido no dia 19 de setembro pelo canal do YouTube da entidade.

Moderado por Miriam Grossi, professora do Departamento de Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e diretora da SBPC, o painel discutiu o papel da ciência na defesa da democracia, as ameaças e censuras que a ciência e os cientistas vêm sofrendo, assim como as ações e perspectivas futuras.

“Nossa democracia vem sendo atacada como regime político, mas vem resistindo e vai resistir”, apontou Aldo Zarbin, professor do Departamento de Química da Universidade Federal do Paraná (UFPR), membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e do Conselho da SBPC. O pesquisador defendeu que, para fortalecer o sistema democrático, é essencial democratizar o acesso. Zarbin enfatizou a necessidade de democratizar o acesso à educação — principalmente à educação científica e política — que dê condições para que a população tome decisões informadas, proteja-se das fake news e aja com mais responsabilidade social. Mas também ressaltou a necessidade de combater as desigualdades. “Precisamos democratizar o acesso à informação, à educação, e também aos bens primordiais, como saúde e alimentação. Não dá para imaginar um país democraticamente saudável em uma situação de fome e miséria absoluta como a que estamos vivendo hoje”.

Alberto Kornblihtt, professor do Departamento de Fisiologia e Biologia Molecular e Celular da Universidade de Buenos Aires e diretor do Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Técnica (Conicet) também destacou que a educação científica é crucial para a manutenção da democracia. O pesquisador ainda defendeu que a ciência é imprescindível na resolução da maioria dos problemas da atualidade. “Nós precisamos da opinião pública informada em temas críticos, como aquecimento global, violência de gênero, vacinas… Todos esses temas precisam da opinião pública para que a democracia possa avançar sem dogmas e sem pensamentos arbitrários”, afirmou. “E também precisamos da ciência para o desenvolvimento do pensamento crítico, porque lamentavelmente nossa sociedade cada vez vem tomando decisões ou emitindo opiniões que não estão fundamentadas pela evidência”.

Para Flavia Biroli, professora de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), os cientistas também precisam pensar em como podem contribuir para que as sociedades sejam mais fortes democraticamente e mais justas socialmente. A pesquisadora explicou a ciência produzida hoje está inserida em um sistema internacional de direitos humanos, com parâmetros, inclusive do ponto de vista ético, de não aceitação da desumanização de alguns segmentos da população. “As pesquisas sobre desigualdade de gênero, questões relacionadas a desigualdades raciais e étnicas, elas são fundamentais para expor o caráter desigual do cotidiano e da política institucional”, afirmou. Segundo Biroli, essa desumanização é o oposto de uma democracia no sentido de um governo do povo. “A pandemia nos mostrou o quanto décadas de circulação de uma lógica que mercantiliza tudo pode nos afastar desse agir conjuntamente, mesmo quando isso protege a cada um de nós. Então é fundamental essa reconstrução de uma perspectiva coletiva, que o que se construa daqui para diante seja calcado nesse coletivo que nós somos”.

Grossi encerrou o painel enfatizando que os cientistas podem contribuir muito nesse momento de tantos desafios que são globais, e que muitos conceitos deverão ser repensados. “Nós não poderemos pensar o futuro do mesmo lugar. Desde o início da pandemia, estamos assistindo uma exacerbação desse conceito de liberdade: ‘na minha liberdade eu posso não tomar vacina, posso não usar máscara’. Há uma reapropriação da ideia de liberdade como um direito individual que não tem mais ligação o coletivo, como o social, com a essência da democracia. Mas o sujeito não existe sem o coletivo, e é esse coletivo que está em ameaça, e é para esse coletivo que nós, enquanto cientistas, estamos trabalhando, lutando e construindo o nosso conhecimento.”

O evento

O II Ato Internacional pelo Dia da Democracia – ONU é uma iniciativa da sociedade civil em defesa dos valores fundamentais expressos na Constituição Cidadã. Após a abertura presencial, no dia 15 de setembro — que contou com a presença de lideranças políticas, como Alessandro Molon (líder da Oposição na Câmara dos Deputados – PSB/RJ), Antonio Neto (presidente municipal do PDT São Paulo), Fábio Trad (deputado federal – PSD/MS), Fernanda Melchionna (deputada federal – PSOL/RS), deputada federal – PT/PR), Heloísa Helena (porta-voz nacional da Rede Sustentabilidade), José Luiz Penna (presidente nacional do PV), Júnior Bozzella (deputado federal – PSL/SP), Luciana Santos (presidente nacional do PCdoB – vice-governadora de Pernambuco), entre outros nomes da política — o evento promoveu uma vigília virtual de mais de 30 horas em suas redes sociais. A programação iniciou no sábado (18) e incluiu importantes personalidades nacionais e estrangeiras, além de dezenas de entidades civis, com centenas de depoimentos e atrações, e terminou no domingo (19).

Assista ao painel da SBPC na íntegra: I Ato Internacional Direitos Já! Fórum pela Democracia – atividade da SBPC

Chris Bueno – Jornal da Ciência