Durou pouco mais de três meses a expectativa da UFRJ por uma mínima recomposição financeira em 2022. Em 31 de agosto, o governo enviou proposta ao Congresso reservando R$ 320,8 milhões para as despesas da maior federal do país — valor ainda insuficiente, mas com pequeno avanço em relação aos R$ 299 milhões deste ano. No último dia 6, porém, a Comissão Mista de Orçamento (CMO) aprovou parecer com corte de 6% de todas as universidades. A tesourada significa, na prática, menos R$ 16 milhões para a UFRJ.
“Ainda não é definitivo. Precisa ser apreciado pelo próprio plenário do Congresso. Mas é um indicador extremamente preocupante para nós. Isso nos aponta ficar em 2022 praticamente com o mesmo orçamento de 2021”, explica o pró-reitor de Planejamento e Finanças, professor Eduardo Raupp. O problema é que as receitas atuais já não dão conta do funcionamento da UFRJ, que ainda está com a maioria das aulas em meio remoto. “É o orçamento de um ano completamente atípico que, tudo indica, será mantido para um ano que tenderia à retomada da nossa normalidade”, completa.
A estimativa da reitoria é chegar ao fim de 2021 com um déficit de aproximadamente R$ 48 milhões. Número que pode diminuir com algumas confirmações de gastos nos próximos dias, como contratos de fornecimento com valores que podem ficar abaixo do previsto. “Em função do retorno ainda não ser 100%”, explica Raupp. “Vamos conseguir pagar todas as nossas contas até o mês de novembro. Já boa parte do mês de dezembro teremos que carregar para o ano que vem”.
O pró-reitor diz que é importante mobilizar para a recuperação e ampliação do orçamento. Mas a experiência da tramitação da proposta, no ano passado, não é nada positiva. “Foi ao contrário. Os cortes só foram aumentando”, observa Raupp.
Debate no Consuni
Todos os anos, o Conselho Universitário discute o orçamento interno do exercício seguinte. No documento que será apreciado pelo colegiado ainda este mês, a administração superior trabalha com os números da proposta original do governo. “Sem esse corte da comissão, que é uma indicação do relator (deputado Hugo Leal, do PSD-RJ). Mesmo com o valor original, nós já apontávamos um déficit na casa dos R$ 90 milhões, no exercício do ano que vem. Com mais cortes, o déficit se aprofundaria”, esclarece o dirigente. O corte do relator retira R$ 12,5 milhões para despesas do funcionamento da UFRJ e mais R$ 3,5 milhões de assistência estudantil. Apenas as verbas dirigidas ao Complexo Hospitalar da UFRJ foram poupadas.
E não existe mais possibilidade de ajuste. “Nós estamos com todos os contratos no limite.
Operamos uma série de reduções a partir de análises técnicas. Tudo que era possível fazer em termos de otimização da gestão foi feito”, afirma Raupp. “Mais que isso seria reduzir serviços que são essenciais para o nosso funcionamento”.
Apesar dos sucessivos cortes nos últimos anos, a nova tesourada nas universidades não deixou de ser uma surpresa. Em um encontro do Fórum de pró-reitores de Planejamento (Forplad), na semana passada, o próprio MEC participou e também apontou expectativa de alguma recomposição para as universidades. “É uma surpresa totalmente negativa”, conclui o pró-reitor da UFRJ.
No conjunto das universidades, perda de R$ 300 milhões
A Proposta de Lei Orçamentária (PLOA) do governo reserva R$ 5,1 bilhões para as despesas discricionárias — ou seja, sem contar gastos com pessoal — das universidades. “Do jeito que estava a PLOA, 2022 já estava comprometido. Com o corte, não tem a menor possibilidade de conseguirmos operar”, diz o presidente da Associação Nacional de Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), professor Marcus David. O conjunto das universidades, calcula o reitor, perde quase R$ 300 milhões pelo corte indicado pelo relator.
O orçamento deve ser votado até o início do recesso parlamentar, em 22 de dezembro. A Andifes reivindica a recuperação do orçamento para valores de 2019, corrigidos pela inflação. Seriam aproximadamente R$ 6,9 bilhões, R$ 1,8 bilhão a mais do que o governo propõe.
Na ciência, mais cortes
O sistema federal de Ciência e Tecnologia também sofreu na caneta do relator da CMO. A SBPC registrou um corte de R$ 126,7 milhões na verba do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). O CNPq perderia R$ 60,2 milhões, sendo R$ 52,7 milhões destinados ao pagamento de bolsas.
Na Capes, o corte sugerido é de R$ 33,2 milhões, sendo R$ 2,3 milhões das bolsas. O relator quer tirar ainda R$ 7,5 milhões da Fiocruz e mais R$ 8 milhões da Embrapa.
Entidades de apoio à ciência, como a própria SBPC e a Academia Brasileira de Ciências (ABC), também tiveram suas contribuições reduzidas em R$ 210 mil e R$ 240 mil, respectivamente, o que prejudicaria a divulgação científica.
“Eu me senti chocado ao saber de mais um corte no orçamento da Ciência”, diz o presidente da SBPC, professor Renato Janine. “Devemos lembrar que, se tivéssemos investido na Ciência na hora certa, teríamos tido pelo menos uma, talvez duas ou três vacinas brasileiras, economizando muito dinheiro que gastamos comprando vacinas do exterior”, completa.
A SBPC, a ABC e a Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento — movimento organizado da comunidade brasileira de ciência e tecnologia para atuação permanente junto aos parlamentares — se mobilizam para reverter os cortes. “Vamos continuar lutando, mobilizando a comunidade científica”, afirma Janine.
O orçamento também foi o principal tema do último programa AdUFRJ no Rádio deste ano. Convidado, o professor Eduardo Raupp, pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da UFRJ, explicou os impactos do corte aprovado na Comissão Mista de Orçamento do Congresso. O professor emérito Ricardo Medronho, diretor do sindicato, participou do programa e fez um balanço do retorno das aulas presenciais na universidade. O AdUFRJ no Rádio vai ao ar todas as sextas-feiras, às 10h, com reprise às 15h, pela Rádio UFRJ (www.radio.ufrj.br) e também está disponível em seu agregador de podcasts favorito.