A Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) realizou na segunda-feira (4) uma sessão especial para comemorar o bicentenário de nascimento do naturalista Fritz Müller. Ele foi o primeiro cientista a fornecer evidências conclusivas do mecanismo da seleção natural, que havia sido proposto por Charles Darwin e Alfred Wallace, a partir de seus estudos com crustáceos. Ele foi também pioneiro ao utilizar modelos matemáticos no domínio da biologia e explicou um tipo de mimetismo nas borboletas: o mimetismo mülleriano.
Johann Friedrich Theodor Müller, popularmente conhecido como Fritz Müller, nasceu na Alemanha em março de 1822 onde se formou em matemática, história natural, filosofia. Fez todo o curso de medicina, mas não recebeu o diploma por não aceitar jurar em nome de Deus, já que era ateu. Atuou na revolução alemã de 1848, tanto que se inscreveu no Partido Democrático, tornando-se um militante. Em função da situação na Alemanha e das dificuldades para encontrar um emprego, imigra, em 1852, para o Brasil, em 1848, comi sua mulher e filha e com seu irmão.
Colono e lavrador no Vale do Itajaí (atual Blumenau), Fritz Müller foi um grande naturalista, fez muitas excursões pela Mata Atlântica e, também, por um período, foi professor de matemática e ciências naturais no Liceu Provincial em Desterro (Florianópolis). Em 1864, publicou o livro “Für Darwin”, na Alemanha, cinco anos após o britânico publicar “A origem das espécies”. O livro impressionou tanto Darwin, que ele mesmo pagou a tradução do alemão e a publicação da obra em inglês sob o título “Facts and Arguments for Darwin”. Os dois mantiveram uma intensa correspondência e amizade até a morte de Darwin, em 1882. Fritz Müller é o terceiro cientista mais citado em “A origem das espécies” e publicou quase três centenas de artigos científicos, grande parte deles em periódicos internacionais, como a Nature, a partir de suas observações da flora e da fauna desta região de Mata Atlântica. Fritz Müller faleceu em 21 de maio de 1897, aos 75 anos.
Na sessão especial da Alesc, foram homenageadas 33 personalidades e instituições, dentre elas a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que atuaram com destaque na preservação da memória e do trabalho do grande naturalista teuto-brasileiro.
Ildeu de Castro Moreira, presidente de honra da SBPC, ressalta que as obras de Fritz Müller contribuíram para fundamentar e enriquecer a teoria da evolução das espécies por meio da seleção natural de Darwin, com quem manteve intensa amizade e correspondência. “Fritz Müller é um personagem do século 19, mas que puxou o século para frente, na educação, na ciência e em vários outros aspectos”, destacou Moreira que é também professor do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“É importante lembrar as inúmeras citações que Darwin faz de Fritz. Ele é o cientista mais citado no conjunto dos livros de Darwin, um dos cientistas mais importantes de todos os tempos. Isso mostra o status científico que Fritz Müller alcançou, além de ter sido também um pioneiro na educação científica em Santa Catarina e na divulgação da seleção natural no Brasil”, enfatiza o presidente de honra da SBPC.
Moreira cita ainda que a SBPC é uma das instituições que mais tem contribuído para difundir a história de Fritz Müller no Brasil. “A SBPC realizou diversas ações para ressaltar o papel deste grande cientista, tanto que já o homenageou com um Simpósio, em 1966, em sua 18ª Reunião Anual, em Blumenau. Ali também organizou uma Reunião Especial sobre a Mata Atlântica em 1997. Recentemente a SBPC colaborou com o “Grupo Desterro Fritz Müller/Charles Darwin – 200 anos”, no lançamento da segunda edição do e-book “Fritz Müller 200 anos: legado que ultrapassa fronteiras”, além de estar atuando em parceria com o Grupo na tradução e publicação dos livros sobre Fritz Müller, que foram escritos por Alfred Möller e David West. Também está promovendo em Brasília, a exposição “Fritz Müller 200 anos”, explica. A mostra ficará em exibição até 2 de maio no Espaço Cultural Ivandro Cunha Lima, localizado no corredor do Anexo I da Congresso Nacional.
Para Miriam Grossi, diretora da SBPC, a sessão especial foi meritória e justa por mostrar os benefícios não apenas científicos, mas também sociais, educacionais, políticos, administrativos e culturais deixados por Fritz Müller. “Foi um reconhecimento público e institucional da obra científica e da contribuição desse alemão que adotou o Brasil e deixou sementes importantes na nossa nação”, comenta Grossi, que é professora titular do Departamento de Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Mário Steindel, coordenador científico do Grupo Desterro Fritz Müller — Charles Darwin 200 anos, também ressalta a contribuição que Müller deu à ciência mundial com as primeiras provas factuais que suportam a teoria da Evolução e lembra que neste contexto é um personagem ainda pouco (re) conhecido. “O Brasil tem vários cientistas de renome mundial em sua história a partir do século XIX. No entanto, Fritz Müller é sem dúvida o mais destacado de todos, não só pela relevância, pioneirismo e densidade das pesquisas que desenvolveu, mas também pelos parceiros com quem colaborou. Charles Darwin evidentemente se destaca, pois é uma referência mundial conhecida”, observa ele que é professor do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da UFSC.
“Homenageá-lo como se está fazendo agora por ocasião da comemoração do seu bicentenário de nascimento é sem dúvida um gesto de grandeza notável por parte da comunidade científica e pelas instituições de Estado. Contudo, é preciso perenizar o reconhecimento desse notável naturalista promovendo a difusão de seu legado nas escolas por meio da inserção de conteúdos na grade curricular do ensino básico e superior”, afirma Steindel.
Marcondes Marchetti, coordenador geral do Grupo Desterro Fritz Müller/Charles Darwin – 200 anos, também enfatizou a importância de fazer o cientista ser reconhecido pelo público em geral. “O objetivo do esforço comemorativo é para que Fritz Müller passe a ser reconhecido como uma figura importante na história de Santa Catarina e do Brasil.”
O deputado Dr. Vicente Caropreso (PSDB), que presidiu a sessão, enalteceu Fritz Müller e lamentou que muitos ainda não o conheçam. “Sou de Blumenau, estudei na cidade a minha vida inteira e mesmo sendo do município, pouca coisa se falava deste gênio. Uma pessoa que tinha todo conhecimento científico, de respeito à natureza, um poeta, um pintor, um homem que tinha todas as habilidades possíveis. O grande legado que ele deixa é o respeito à natureza. O Brasil e Santa Catarina ganham com essa homenagem, nós reverenciamos a vida e trajetória deste alemão naturalizado brasileiro, amado por nós, para que isso se perpetue e para que nas escolas seja levado o conhecimento sobre a vida e obra de Fritz Müller”, destaca.
O senador Esperidião Amin (PP), por sua vez, salientou que a homenagem resgata uma dívida da sociedade catarinense e brasileira com esse importante naturalista que faz parte da história científica mundial. Ele destacou também a atuação do Grupo Desterro e da SBPC nesta empreitada. “Nós estamos recuperando o tempo perdido e prestando homenagem devida àquele que sempre a mereceu. Fritz Müller é um cientista sem paralelo na nossa história, pelo seu pioneirismo, pelas condições rústicas que produziu suas obras, e pela importância que tem no mundo”, finaliza.
Veja a relação das personalidades e instituições homenageadas durante a sessão especial da Alesc:
- Os tataranetos de Fritz Müller: Raquel Charlotte Schindle, Roberto Schindler e Ivens Freytag;
- Senador Esperidião Amin;
- Prefeito de Florianópolis, Topázio Silveira Neto;
- Prefeito de Blumenau, Mário Hildebrandt;
- Presidente da Academia Catarinense de Letras, jornalista Moacir Pereira;
- Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, Augusto Cesar Zaferino;
- Administrador do Museu Histórico de Santa Catarina, Palácio Cruz e Souza, Marcelo Seixas;
- Museu de Ecologia Fritz Müller, de Blumenau, representado pelo gerente de unidades de Conservação e Museus, Vanderlei Balduzzi;
- Arquivo Histórico de Blumenau, representado pela diretora de Patrimônio Histórico Museológico da Fundação Cultural de Blumenau, Sueli Maria Vanzuita Petry;
- Instituto Histórico de Blumenau, representado pelo presidente da instituição, Marcos Schroeder;
- Instituto Carl Hoepcke, representado pelo primeiro vice-presidente da instituição, Luiz Henrique Tancredo;
- Centro Empresarial e Científico Brasil-Alemanha, representado pelo vice-presidente da instituição, Hans-Dieter Beuthan;
- Fundação Catarinense de Cultura, representado por Edson Lemos;
- Grupo Fritz Müller Darwin 200 anos, representado por Marcondes Marchetti;
- Coordenador geral do Grupo Fritz Müller/Charles Darwin – 200 anos, Marcondes Marchetti;
- Comissão dos 200 anos de Fritz Müller Florianópolis, representado pelo presidente da comissão e prefeito de Florianópolis, Topázio Silveira Neto;
- Comissão Legislativa Temporária de Representação da Câmara Municipal nos eventos e atividades do Bicentenário de Fritz Müller de Blumenau, vereadora Cristiane Loureiro;
- Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), representada pelo professor Ildeu de Castro Moreira e pela professora Miriam Grossi;
- Vereador da Câmara de Florianópolis, Adriano Flor, o Adrianinho;
- Consulesa honorária da República Federal da Alemanha em Blumenau, Susanne Klems Adam;
- Cônsul honorário do Reino Unido em Santa Catarina, Michael Delaney;
- Professor, geógrafo, botânico e escritor Marcelo Vieira Nascimento;
- Professora e historiadora de Blumenau Ana Maria Ludwig Moraes;
- Professora e historiadora de Blumenau Sueli Maria Vanzuita Petry;
- Secretário de Cultura de Blumenau, Rodrigo Rogério Ramos;
- Professor Alberto Lindner;
- NSC Jornal, representado pelo jornalista Evandro de Assis;
- Pelo trabalho de preservação da memória científica, educacional e cultural do naturalista Fritz Müller, jornalista Evandro de Assis;
- Médico e escritor Cesar Zillig; [Ele não estava presente]
- Senhora Glória Weissheimer;
- Senhor Luiz Roberto Fontes;
- Professor Lauro Eduardo Bacca;
- Professor Mário Steindel.
Jornal da Ciência, com informações da Agência AL