A degradação da Amazônia está caminhando para um cenário em que não será possível recuperar a perda da biodiversidade. Este foi o principal diagnóstico do 2º seminário da série “Contagem Regressiva para o Bicentenário: Rumos à Independência”, uma realização da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) que procurou refletir sobre a comemoração da Independência do Brasil por meio das demandas sociais e científicas.
Para falar de Ciência e Meio Ambiente e, mais especificamente, do panorama da Amazônia, o evento contou com uma palestra da professora da Universidade Federal do Pará (UFPA) e pesquisadora titular do Museu Paraense Emílio Goeldi, Ima Célia Guimarães Vieira. O debate teve ainda a apresentação de Rosa Carmina de Sena Couto, da SBPC-PA, e questionamentos da professora Edna Maria Ramos de Castro, também da UFPA.
Iniciando sua fala, a professora Ima Célia Guimarães Vieira apresentou um histórico da região do Pará e como a sua integração mais tardia ao território brasileiro impactou diretamente na criação das políticas públicas para a Amazônia. Posteriormente, defendeu o território amazônico como um bem de preocupação global, no qual não estamos respeitando os seus limites.
“Nós já ultrapassamos [os limites] sobre o uso da terra, ou seja, temos já uma situação de muita preocupação em relação ao desmatamento, à degradação, associada, principalmente, à questão da produção de alimentos, essa questão da agricultura. E ao passar dos limites, não conseguimos mais controlar mais as consequências disso”, alertou.
Vieira destacou que a humanidade é a principal responsável pela degradação da Amazônia, e que as entidades que deveriam acompanhar esses limites ambientais, como a ONU (Organização das Nações Unidas), o FMI (Fundo Monetário Internacional) e os países do G20, não estão conseguindo exercer este papel.
Para piorar o cenário, além do crescimento da devastação do território amazônico, nos últimos três anos o Brasil tem vivenciado uma política governamental de enfraquecimento dos órgãos de fiscalização ambiental, como o Ibama, e uma articulação em conjunto com a bancada ruralista da Câmara dos Deputados, que enfraqueceu as políticas de regulação de terras e aumentou a disponibilidade de crédito para a aplicação rural. “Hoje, 22% da floresta amazônica de terra firme foi transformada para dar lugar à agricultura e, principalmente, à pecuária”, destacou a especialista.
Se em 1970, a taxa de desmatamento da Amazônia era de 0,5%, em 2022, são 22% do território sem a cobertura florestal primária. “Todos os anos, o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) apresenta relatórios com as taxas de desmatamento. Isso tem um impacto muito grande na vida da população e na economia, né? E como diz o Papa Francisco, não há duas crises separadas, uma ambiental e uma social, há uma única crise complexa no planeta que é a crise socioambiental.”
Amazônia caminha para um futuro sem passado
Segundo Vieira, se esse panorama sem governança na Amazônia persistir, o País perderá 53% de todo o território amazônico até 2050 e, consequentemente, este será o fim de 60% das espécies de plantas e árvores que ali vivem.
Mas ainda há um caminho para reverter essa situação, e ele começa na política. A professora destacou como urgente a aprovação do projeto de lei nº 1.038/2021 que, em linhas gerais, propõe que os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU sejam usados para pautar a criação das políticas públicas ambientais no País. “O PL precisa ser aprovado, mas nesse Congresso que está aí não será. Então, a gente precisa mudar o Congresso, votar bem para mudar essa legislatura”, defendeu a especialista.
Complementando as falas, a professora Edna Maria Ramos de Castro também criticou a atual conjuntura política, que vem passando por cima de uma preocupação global como o meio ambiente em prol de interesses próprios. “O que nós observamos nesses três últimos anos foi a passagem da boiada, ou seja, um desmonte da legislação ambiental, das regras de controle social, e das decisões que estavam sendo tomadas em relação aos povos indígenas, às unidades de conservação, entre outros temas.”
Para a debatedora, é importante que as pessoas entendam que falar da Amazônia não é falar de uma região isolada do País, mas sim de um ambiente responsável pela vida do planeta e a vida individual de cada um. “O desmatamento não é simplesmente tirar a floresta, é tirar energia da terra, é tirar os nutrientes e criar uma situação irreversível”, concluiu.
O debate completo está disponível no canal do YouTube da SBPC.
Rafael Revadam – Jornal da Ciência