Mais inclusiva e engajada: especialistas discutem qual a universidade que o Brasil precisa

Bate-papo online marca lançamento da primeira edição do ano da revista Ciência & Cultura sobre “Universidade do Futuro no Brasil”

cec - mesa

Qual a universidade que o Brasil precisa? Esta foi a pergunta discutida durante o bate-papo online realizado nessa quarta-feira (22) para marcar o lançamento da primeira edição de 2023 da revista Ciência & Cultura, que tem como tema “Universidade do Futuro no Brasil”.

Na abertura do evento, Renato Janine Ribeiro, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), lembrou que tivemos um avanço muito grande no ensino superior entre os anos 2013 e 2015, com uma grande expansão vivida pelas universidades públicas brasileiras, que praticamente dobraram o número de vagas. Apesar desse ter sido um passo importante para a democratização do ensino superior no País, ainda existem muitos desafios a serem superados. A escassez de recursos, o negacionismo científico e o fortalecimento da extrema direita e seu discurso de ódio surgiram como grandes obstáculos nos últimos anos.

“Além disso, a própria forma de educação mudou. Vivemos hoje uma era em que a internet mudou tudo para nós”, afirmou. “Educar é dar perspectivas a quem não as tinha. É mostrar para um jovem que nunca ouviu falar de artes que ele pode ser um artista, a quem nunca teve formação científica que ele pode se tornar um grande cientista, a uma pessoa humilhada e ofendida que ela pode ser um dirigente, enfim, educar é abrir caminhos e perspectivas. Como nós vamos abrir perspectivas no ensino superior nesse quadro tão diferente?”, questionou.

Fernanda Sobral, professora emérita do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) e vice-presidente da SBPC, afirmou que é preciso não apenas preocupar-se com a qualidade da universidade, mas também em torná-la mais voltada à sociedade. “Cada vez mais, eu me convenço de que a revolução social se faz pela educação”, declarou.

Para os moderadores do evento e editores desse número da revista Ciência & Cultura, Soraya S. Smaili e Naomar Almeida Filho, este é o momento ideal para se discutir o ensino superior no País. Smaili, professora do Departamento de Farmacologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenadora do Centro de Estudos Sociedade Universidade e Ciência (SoU_Ciência), defendeu que o tema é de grande relevância nesse período de início de reconstrução, para podermos resgatar os valores mais elevados das universidades. “Precisamos nos apropriar de qual cenário temos hoje para refletir e projetar as propostas que nossas universidades produzirão com maestria.”

Almeida Filho, professor do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e professor visitante no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), onde ocupa a Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica, apontou que a universidade brasileira precisa conquistar sua independência. Segundo o pesquisador, a universidade não tem autonomia para gestão da própria instituição, sendo ainda dependente desde questões orçamentárias até processos administrativos. “A universidade também precisa repensar o conceito de autonomia acadêmica – não confundir com a liberdade individual, com a valorização excessiva do individualismo. Nós precisamos de mais solidariedade, de processos coletivos de construção e reconstrução social.”

Malvina Tuttman, professora do Centro de Ciências Humanas e Sociais (CCH) da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), concorda que é necessário um processo coletivo de reconstrução, especialmente dentro das universidades. “É fundamental que pensemos um currículo comprometido com as sérias questões sociais do nosso país”, afirmou. Para a pesquisadora, currículo é tudo o que a instituição oferece, não apenas as disciplinas. “Esse currículo é importante para poder formar um profissional consciente do seu papel enquanto cidadão.”

Para Joaze Bernardino Costa, professor do Departamento de Sociologia da UnB, as universidades ainda têm um longo caminho a percorrer na questão da diversidade. “A política de cotas tem promovido avanços inegáveis, mas é necessário avançar não apenas no acesso, mas também na pesquisa. É necessário que essa discussão chegue na pós-graduação”, afirmou. O pesquisador defendeu que é preciso ir além, com a adoção de ações afirmativas na pós-graduação, nas bolsas de pesquisas do CNPq e Capes, assim como em reflexões sobre ações na carreira docente.

Assista ao evento na íntegra:

https://www.youtube.com/watch?v=qzqxF4J5nZs

Chris Bueno – editora executiva da Ciência & Cultura, especial para o Jornal da Ciência