A notícia da denúncia ao sociólogo Boaventura de Sousa Santos, diretor emérito do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, reacendeu o debate sobre assédio sexual e moral nas universidades.
No caso envolvendo Boaventura, a denúncia partiu de quatro ex-alunas do CES. Após os relatos, outras surgiram, embora o sociólogo negue. O CES informa que está apurando o caso, que tem tido intensa repercussão na imprensa portuguesa.
Essencial lembrar que denúncias não constituem condenações e que todo acusado de práticas ilegais – quaisquer que sejam – se beneficia, nos países democráticos, da presunção de inocência. Mas é também verdade que o assédio, moral ou sexual, tem uma frequência alarmante, que merece ser enfrentada.
Essas acusações se somam a outros relatos de situações de perseguição, humilhação, coerção e abuso registrados no ambiente acadêmico. O mundo da pesquisa e do ensino não está fora da sociedade e, se nesta ocorrem episódios de abuso sexual e moral, infelizmente é inevitável que na academia eles também sucedam. Embora o assunto seja latente e reconhecido socialmente, a prevenção e o enfrentamento à questão pelas instituições de ensino superior e de pesquisa caminham a passos lentos.
Nos últimos anos, diversas instituições de ensino e pesquisa públicas têm criado códigos de ética e resoluções que abordam as questões envolvidas na violência de gênero, como apoio às vítimas que denunciam assédio (sexual ou moral) ou discriminação.
Em 2020, por exemplo, a Universidade Estadual Paulista (Unesp) iniciou a distribuição do Guia de Prevenção ao Assédio, idealizado pela Universidad Complutense de Madri. O guia orienta a comunidade acadêmica sobre como proceder se algum caso for identificado e dissemina o princípio de respeito à diversidade.
Mas o assunto requer muito mais atenção e, na prática, a percepção é de que a resolução, na maioria dos casos, ainda é descentralizada, demora muito e apresenta medidas ainda pouco eficientes de acolhimento às vítimas. Infelizmente por causa disso, muitas desistem da carreira. E isso precisa mudar.
As instituições têm o dever de enfrentar essa prática, criando canais de denúncias e acolhimento, além de ações de prevenção com debates para contribuir na criação de um ambiente respeitoso, saudável e seguro.
Na Editoria Especial desta semana, manifestamos nossas preocupações diante de um assunto tão presente e sensível e que deve ser combatido com energia por parte das instituições. E deixamos nosso canal aberto para ampliarmos as discussões de como enfrentar este problema.
Renato Janine Ribeiro
Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC
Veja abaixo as notas do especial da semana – Assédio no ambiente acadêmico
Jornal da Ciência, com informações da ABC – Cerca de 50% de pesquisadoras afirmam ter sofrido assédio sexual durante a carreira
Abrasco, 26/04/2023 – Abrasco publica nota sobre abuso de poder, assédio moral e sexual nos ambientes acadêmicos
Sul21, 15/01/2023 – 70% das universidades federais no Brasil não têm qualquer medida de combate ao assédio
Jornal da USP, 20/04/2023 – O que fazer para evitar o assédio nas universidades?
Folha de S. Paulo, 27/04/2023 – Pelo fim da cultura do assédio no ambiente acadêmico
Folha de S. Paulo, 10/03/2023 – Após MeToo, universidades brasileiras ainda enfrentam barreiras no combate ao assédio
Correio*, 25/03/2023 – Assédio sexual em universidades leva mulheres a abandonarem carreira acadêmica
Agência Brasil, 8/2/2020 – Unesp possui guia contra assédio no ambiente acadêmico
Pesquisa Fapesp, 10/03/2023 – Universidades inglesas poderão adotar registro de relacionamentos entre docentes e alunos
Metrópoles – Universidade de Coimbra suspende Boaventura Sousa, acusado de assédio
Publico – Boaventura de Sousa Santos diz que vai processar autoras das alegações de assédio
SOL – Governo português cria grupo para combater assédio no ensino superior
Pesquisa Fapesp, outubro de 2022 – Universidades norte-americanas investem em medidas para identificar indivíduos com histórico de má conduta sexual durante a contratação
Pesquisa Fapesp – Universidade de Oxford proíbe relacionamentos íntimos entre alunos e seus profissionais