No último mês, o Judiciário britânico deu aval à extradição do jornalista Julian Assange para os Estados Unidos. Assange enfrenta 18 acusações criminais de espionagem e, em caso de condenação, pode receber uma sentença de até 175 anos de prisão. Essa decisão tem gerado debates acalorados, pois muitos enxergam nela uma ameaça à liberdade de imprensa e ao jornalismo investigativo e independente.
Diante dessa situação, um grupo composto por cientistas, jornalistas, professores, sindicalistas, lideranças da sociedade civil e entidades, incluindo a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), uniu forças e coletou quase 3 mil assinaturas em um manifesto. Nesse documento, as entidades solicitam ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que conceda asilo político ao ativista e fundador do WikiLeaks.
Então, o intuito é de reforçar a demanda e aprofundar a discussão sobre o caso de Assange. Também afirmar as implicações para sociedades democráticas, a SBPC organizou um debate na última quarta-feira (5). O evento teve como foco as ameaças à liberdade de imprensa evidenciadas por casos como o de Assange e Edward Snowden. Participaram o professor titular da Escola de Comunicações e Artes da USP Eugênio Bucci e a diretora executiva da Agência Pública, Natalia Viana. A mediação ficou a cargo do presidente da SBPC, Renato Janine Ribeiro.
Jornalismo e ciência
Durante a abertura do evento, Janine Ribeiro destacou a importância da discussão promovida pela SBPC. Ele ressaltou que, quando, há menos de um mês, surgiu a notícia de que um passo adicional havia sido dado rumo à entrega de Assange aos Estados Unidos, o grupo se uniu para redigir o manifesto. O objetivo era pedir ao presidente do Brasil que oferecesse asilo político ao jornalista, proporcionando-lhe a oportunidade de viver em liberdade em território brasileiro, em reconhecimento a tudo que ele fez pela democracia e pela imprensa livre.
O presidente da SBPC ressaltou a relevância das ações de Assange e Snowden em expor abusos de autoridade, enfatizando que tais ações deveriam ser alvo de valorização. “É lógico que, para aqueles que desejam um poder assentado em mentiras, o jornalismo e a ciência são alvos. E, no caso de Assange, é bom lembrar que se trata da revelação de informações sobre falsidades, crimes cometidos por instâncias de poder”, disse Ribeiro.
Imprensa omissa com Assange
Natália engrossou as críticas à condenação. Ela conheceu o jornalista pessoalmente. “Assange me convidou, assim como convidou outros jornalistas independentes, que não estavam associados a um veículo, e demais jornalistas do Sul Global. Por quê? Porque o WikiLeaks tinha estabelecido parcerias com cinco jornais, todos de grandes potências, né? Os colonizadores: na Espanha era o El País, na França era o Le Monde, o The New York Times (nos Estados Unidos), o The Guardian (na Inglaterra) e o Der Spiegel, da Alemanha”, disse.
Contudo, Natália revela que Assange já sabia da postura destes grandes jornais. Seria uma posição de conivência com o poder econômico e com as grandes potências. Então, Natália argumenta que o WikiLeaks possui relevância especial para o jornalismo independente. “Uma coisa que a gente esquece é o papel do Assange na explosão do jornalismo independente. Não existiria Agência Pública sem o WikiLeaks, por exemplo, porque o WikiLeaks deu a oportunidade de muitos veículos pequenos fazerem jornalismo de qualidade, já que o conteúdo dele era distribuído gratuitamente. E, tampouco, haveria outros movimentos de vazamento de informações importantes no Brasil, como a Vaza Jato”, disse.