Uma energia limpa, com baixo custo e segura. Diferente da fissão nuclear (que foi usada na construção de bombas atômicas e outros armamentos, fazendo a população mundial recear a tecnologia até hoje), a fusão nuclear tem pouquíssimos riscos e não resulta em lixo radioativo. Esse foi o argumento defendido por especialistas que participaram da mesa-redonda “Fusão nuclear: agora é para valer?”, onde discutiram os avanços dessa tecnologia no Brasil e no mundo. A sessão foi realizada nesta quarta-feira (26), durante a 75ª Reunião Anual da SBPC. O evento acontece até 29 de julho, no campus Politécnico da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
“A fissão nuclear corresponde ao processo no qual átomos pesados (isto é, que apresentam muitas partículas nucleares, como o urânio e o plutônio) sofrem uma seção, liberando energia. Isso pode ter uma aplicação danosa terrível, como o uso para causar destruição. Já a fusão nuclear corresponde a um processo no qual átomos leves (como o hidrogênio) se juntam, formando outro átomo e liberando energia”, explicou Sérgio Machado Rezende, professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e ex-ministro da Ciência e Tecnologia (2005-2010), que coordenou a mesa-redonda. O pesquisador apontou que a fusão nuclear é uma energia segura e limpa, que não emite gás de efeito estufa, mas que ainda sofre rejeição por conta de incompreensões sobre o tema.
O consumo mundial de energia vai aumentar em aproximadamente 56% até 2041, segundo relatório da International Energy Agency. Hoje, a demanda energética mundial é suprida principalmente por combustíveis fósseis. Porém, o gás carbônico (CO2) liberado na queima de combustível fóssil causa um impacto negativo no meio ambiente. “Para suprir o aumento de consumo de energia, alternativas precisam ser desenvolvidas”, defendeu Gustavo Paganini Canal, professor do Instituto de Física (IF) da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do projeto de modernização do reator TCABR. “O desafio é encontrar novas fontes de energia que sejam seguras, sustentáveis, economicamente viáveis e compatíveis com o ambiente. Neste cenário, a fusão nuclear tem potencial de se tornar uma nova fonte de energia limpa, segura e praticamente inesgotável.”
Atualmente, mais de 130 reatores experimentais de fusão nuclear, públicos e privados, estão em operação, sendo construídos ou planejados em cerca de 50 países, segundo relatório de dezembro de 2022 da Organização Internacional de Energia Atômica (IAEA). O Brasil é o único país do hemisfério Sul que tem reatores de fusão – três tokamaks (máquina experimental projetada para aproveitar a energia fornecida pela reação de fusão nuclear). O maior deles é o TCABR, instalado no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP). O Experimento Tokamak Esférico (ETE) fica no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e o NOVA-Ufes, operado pelo Laboratório de Plasma Térmico (LPT), está na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
“No Brasil os avanços em fusão nuclear proporcionaram um desenvolvimento tecnológico nacional significativo”, apontou Gustavo Canal. Segundo o pesquisador, a pesquisa em fusão nuclear permitirá o desenvolvimento de bobinas supercondutoras no País, beneficiando vários setores, incluindo a indústria e o comércio. O TCABR, que está sendo modernizado com um sistema inovador de bobinas magnéticas, deve se tornar a primeira máquina do Laboratório de Fusão Nuclear (LFN). Este reator irá realizar todas as provas de conceito necessárias para projetar o primeiro reator de fusão nuclear do País. “Nos últimos dois anos, a gente vê um aumento de 139% do volume de investimento na indústria de fusão”, explicou.
Gustavo Canal também destacou que uma proposta de um Programa Nacional de Fusão Nuclear (PNFN) foi submetida ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). “O objetivo é definir diretrizes e ações de curto médio longo prazo para criar no país as condições necessárias para incluir a fusão nuclear em nossa matriz energética, caso venha se mostrar atrativa no futuro.”
Assista à conferência na íntegra:
https://www.youtube.com/watch?v=tUy-i7USayI
Chris Bueno, especial para o Jornal da Ciência