No início da década de 1960, o renomado físico brasileiro César Lattes embarcou em um intrigante projeto de pesquisa nos confins dos Andes, no observatório do monte Chacaltaya, na Bolívia. Esta jornada científica singular marcou o início da Colaboração Brasil-Japão (CBJ), uma aliança improvável entre dois países que, na época, pareciam distantes geográfica e logisticamente. A parceria foi forjada com um grupo de físicos japoneses liderados por Yoichi Fujimoto, buscando desvendar os mistérios dos raios cósmicos. Isso é o que discute artigo da nova edição da Ciência & Cultura, que celebra o centenário do físico brasileiro César Lattes.
A história por trás da CBJ tem raízes profundas na conexão entre Lattes e Hideki Yukawa, estabelecida com a descoberta da partícula méson pi (ou píon). Em 1959, a colaboração começou a se desenhar, com o Japão avançando em novas técnicas de detecção de raios cósmicos usando emulsões nucleares, chamadas de “câmaras de emulsão nuclear”. Estas, compostas por camadas alternadas de emulsões e placas de chumbo, permitiam uma análise mais precisa das interações de partículas de alta energia. “Foi por meio da interação altamente energética de raios cósmicos com núcleos atômicos atmosféricos que foram descobertos tanto o múon (à época, méson mi), na década de 1930, quanto o píon (méson pi), na seguinte”, explica Takeshi Kodama, professor emérito do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A contribuição japonesa era clara: fornecer as emulsões nucleares e o equipamento necessário. Enquanto isso, o Brasil se dedicava a arrecadar recursos para a expedição e montagem das câmaras nas alturas inóspitas do monte Chacaltaya. Uma das descobertas mais marcantes dessa colaboração foi o fenômeno das “bolas de fogo”, resultado das altíssimas energias liberadas quando raios cósmicos colidem com núcleos atômicos na atmosfera. Esse evento produz múltiplas partículas em um instante de densidade energética extrema, fornecendo pistas fundamentais sobre a natureza das interações entre as partículas elementares.
Desta forma, a CBJ abriu portas para o entendimento dos constituintes fundamentais da matéria e dos mecanismos de interação, um legado que ecoa até os estudos atuais sobre o Modelo Padrão de Partículas e o plasma de quarks e glúons. “Através da análise de densidades das trajetórias deixadas pelas partículas produzidas, foram estimadas pela CBJ as energias da bola de fogo que deu origem a cada evento, tendo identificada a existência de distintos tipos de bola de fogo”, finaliza Takeshi Kodama.
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