Encerrando o calendário de reuniões com os presidentes das agências federais de fomento de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) realizou, na última segunda-feira (20/05), um encontro com o presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), Celso Pansera, que foi ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação no final do governo Dilma Rousseff. A conversa contou com as presenças da Diretoria e Conselho da entidade, além de representantes das sociedades científicas afiliadas e secretarias regionais.
No início de sua fala, Pansera confirmou a presença da Finep na 76ª Reunião Anual da SBPC, que acontecerá de 7 a 13 de julho, na Universidade Federal do Pará (UFPA). “Nós moveremos todo o nosso escritório para Belém do Pará, e pretendemos realizar uma das reuniões do Conselho Diretor do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) na Reunião Anual. É muito importante estarmos com as pessoas nos debates de políticas científicas”, pontuou.
Pansera destacou a importância do FNDCT e falou sobre as mudanças em sua gestão com a aprovação da Lei Complementar nº 177, sancionada em 2021, que proíbe o bloqueio dos recursos do Fundo
“A nova lei do FNDCT transformou o fundo em contábil e financeiro. Na prática, ele agora é uma série de contas no Banco do Brasil. Essas contas aglutinam os recursos que o governo arrecada e são destinados ao Fundo. Se os seus recursos não forem utilizados, eles perduram no ano seguinte. E enquanto o recurso estiver nas contas, ele ficará rendendo juros”, explicou.
De acordo com o presidente da Finep, a previsão é que o FNDCT movimente em 2024 cerca de R$ 12,6 bilhões, sendo que R$ 12,4 bi são recursos próprios do Fundo. “É o FNDCT já se autofinanciando. Já em 2028, a previsão de arrecadação do Fundo é de R$ 19,8 bilhões. Nos próximos anos, o FNDCT mudará a realidade da ciência brasileira”, disse.
Sobre a divisão orçamentária dos recursos do FNDCT neste ano, Pansera afirmou que R$ 6,3 bilhões serão destinados como reembolsáveis – que, como o nome sugere, são aqueles recursos normalmente concedidos via empréstimos, e que seus montantes devem ser devolvidos à Finep – e os outros R$ 6,3 bilhões como recursos não-reembolsáveis.
A divisão igualitária entre recursos reembolsáveis e não-reembolsáveis levantou críticas por parte da comunidade científica presente, já que, normalmente, os reembolsáveis são direcionados a indústrias ou empresas em geral, enquanto os não-reembolsáveis são voltados para manutenção e fortalecimento das infraestruturas de ensino e pesquisa, como as universidades. A defesa é de que haja mais recursos não-reembolsáveis para ser possível atender toda a cadeia de CT&I do País.
Pansera respondeu que este é um tema que deve ser trazido às reuniões do Conselho Diretor do FNDCT, mas que também envolve decisões de outros atores políticos. “Esse é um debate que cai no campo fiscalista, no qual o próprio Governo Federal entra para decidir o quanto quer investir em Ciência.”
O presidente de honra da SBPC, Ildeu de Castro Moreira, reforçou a necessidade de uma nova interpretação do FNDCT. “Se a gente olhar a China, por exemplo, só no ano passado, ela investiu R$ 2,5 bilhões em programas para popularização da Ciência. É um montante bilionário para um só tópico da política científica. O FNDCT precisa encontrar novas formas de arrecadação e distribuição de seus valores, porque os recursos para a Ciência e para a Educação precisam estar além de questões econômicas.”
Conselho Diretor do FNDCT também é tema de debate
Outro tema recorrente foi sobre a administração do FNDCT. Em linhas gerais, cabe ao Conselho Diretor decidir sobre a alocação de recursos do Fundo em cada programa e edital da Finep. O presidente da SBPC, Renato Janine Ribeiro, explicou aos presentes que a SBPC e a ABC (Academia Brasileira de Ciências) são responsáveis por indicar – em listas tríplices – seis cadeiras do Conselho Diretor, sendo três titulares e três suplentes.
Uma das cadeiras de suplente é ocupada pelo presidente de honra da SBPC, Ildeu de Castro Moreira, que destacou a presença majoritária de atores governamentais frente à comunidade científica – fazendo com que as decisões do Conselho não reflitam as demandas do setor.
Outro ponto levantado por Moreira foi a ausência das atas das reuniões do Conselho Diretor no site da Finep, o que compromete a participação democrática nesses debates. O presidente da Finep, Celso Pansera, afirmou que existe um problema técnico no site da entidade, mas que priorizará a resolução dessa questão.
Pansera ressaltou também que, por orientação da SBPC e de demais entidades científicas via Conselho Diretor, a Finep decidiu que fará apenas a estratégia dos recursos do FNDCT em 2024, e que novas decisões serão tomadas somente após a 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (5ª CNCTI), cuja nova data de realização ainda não foi divulgada.
“A nossa ideia era aprovar o plano de utilização do FNDCT dos próximos anos, mas a comunidade científica, assertivamente, nos orientou que as discussões sobre a prioridades de CT&I no País virão na 5ª Conferência, logo, é importante que acompanhemos esses debates para depois pensarmos nas aplicações do Fundo”, destacou.
Infraestrutura e mapeamentos
Trazendo a questão das fortes chuvas no Rio Grande do Sul, Pansera afirmou que há uma grande demanda por auxílios para infraestrutura no Estado, mesmo antes dessa tragédia. No último ano, a Finep abriu 13 editais do programa CT-Infra, dedicado à modernização, recuperação e ampliação de infraestrutura das instituições públicas. Esses editais somaram o montante de R$ 1,5 bilhão, mas a quantidade de solicitações do sistema nacional de CT&I totalizou a necessidade de R$ 5 bilhões, portanto, novos editais devem ser anunciados em breve.
Especificamente sobre o Rio Grande do Sul, a Finep está alinhando programas diretamente com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, e um anúncio a respeito desses projetos está previsto para o começo de junho.
Ainda sobre infraestrutura, a Finep abrirá, nos próximos dias, editais direcionados às regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste. “Temos um desafio que é fazer com que os nossos programas cheguem a essas regiões, já que existe uma predominância do Sudeste e Sul no acesso a recursos. Por isso, estamos visitando essas regiões e realizando programas que ensinam como as organizações podem acessar os nossos editais. Além disso, 30% dos recursos destinados nos editais gerais já estão direcionados para essas localidades, mas entendemos a necessidade de mais programas específicos.”
Panoramas de impacto da Finep
Por fim, a vice-presidente da SBPC, Francilene Garcia, apontou a importância de a Finep levantar dados sobre o impacto de seus programas. Segundo Garcia, a entidade precisa entender a consequência direta da destinação de recursos, como a quantidade de bolsas de pesquisa geradas direta e indiretamente, as entidades que foram impactadas, entre outros fatores.
“É importante que a Finep realize esse diagnóstico sobre quantos empregos são gerados por meio dos recursos do FNDCT, tanto na participação das indústrias, quanto no apoio às instituições de ensino e pesquisa. E, por meio dessa mensuração do impacto das suas ações, que ela consiga projetar o quanto precisamos fazer de investimentos na área pelos próximos anos”, complementou Garcia.
O presidente da Finep, Celso Pansera, disse que existe o conhecimento de que os recursos do FNDCT são uma geração forte de receita dos pós-graduandos do País, mas concorda com a necessidade de levantamentos aprofundados. “É uma demanda que estamos olhando para buscar soluções, provavelmente em parceria com o CGEE (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos), mas também levaremos o tema para debate no Conselho Diretor”, concluiu.
A SBPC realizou, ao longo das duas últimas semanas, reuniões com os gestores das agências de fomento federais, de modo que eles trouxessem as realizações de seus respectivos órgãos e que também ouvissem as demandas da comunidade científica. Além da conversa com o presidente da Finep, também foram realizados encontros com o presidente do CNPq, Ricardo Galvão, e com a presidente da Capes, Denise Pires de Carvalho.
Rafael Revadam – Jornal da Ciência