A poucos dias do grande evento científico que tomará conta do Campus Guamá da Universidade Federal do Pará (UFPA), a 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) ganha um importante reforço na busca por “um novo contrato social com a natureza”. Mascote oficial da SBPC Jovem, Tucũ surge com a missão de chamar a atenção para a necessidade de estabelecer uma relação de cuidado com o planeta, em que a valorização da ciência e dos saberes tradicionais esteja no centro das tomadas de decisão, buscando um desenvolvimento sustentável.
Fruto de um trabalho de criação e confecção coletiva, que teve início ainda em março deste ano, Tucũ inspira-se na versatilidade do tucumã, fruto representativo para a Amazônia, que também é objeto de inúmeras pesquisas na UFPA.
O processo de pesquisa foi o ponto de partida para a construção que culminou no nascimento de Tucũ, considerando outros elementos importantes e simbólicos para as discussões que deverão permear a 76ª Reunião Anual da SBPC. “Pensamos uma mascote que fosse além de uma simples mascote. Pensamos algo que pudesse unir arte e ciência. Tucũ nasce para nos fazer refletir e questionar padrões”, aponta o professor da Escola de Teatro e Dança (ETDUFPA), do Instituto de Ciências da Arte (ICA/UFPA), Aníbal Pacha, responsável por desenvolver a proposta da mascote.
Engenheiro, fotógrafo, publicitário, artista de teatro de animação, professor e pesquisador, Aníbal é natural de Belém e herdou a curiosidade artística do pai, o mestre Zeco, um publicitário e artista plástico português. Pesquisador-artista, Pacha é conhecido pelas propostas inovadoras que têm como inspiração a Amazônia, espaço rico para abastecer a criatividade e sensibilidade, a exemplo do Catalendas, um programa de televisão que apresentava narrativas populares do folclore brasileiro, a partir da estrutura de um teatro de bonecos — confeccionados pelo artista —, e que lhe deu projeção nacional.
Boneco habitável – Sem gênero definido, Tucũ é um ser criança que leva consigo uma grande missão e que vaga por entre os espaços onde as discussões estejam voltadas para a construção de um futuro mais sustentável, como é o caso da 76ª Reunião Anual da SBPC.
“A cabeça do boneco seria um tucumã, que faz brotar seus próprios frutos. O cabelo são espinhos, os espinhos do tucumã. E impresso no rosto e bordado em suas roupas, estão circuitos eletrônicos que representam a conexão e o encontro proporcionados pelo espaço de discussão da ciência”, descreve o criador.
“É uma criança que carrega o mundo nas costas, e esse mundo está representado simbolicamente pela inversão das coisas, onde a água é verde e a mata é azul. Essa inversão é proposital para instigar a curiosidade”, explica o professor. “A mascote vem não só como um objeto para ser fotografado, mas também para provocar discussões. Eu acredito que a importância maior da arte não é dar respostas, mas provocar um espaço coletivo de discussão”.
Outra preocupação fundamental do professor, ao encarar o desafio de pensar a construção simbólica da mascote, foi a de desenvolver um modelo não tradicional. Com isso, Tucũ traz o conceito de corpo habitável, em que a pessoa não o veste como uma roupa, mas habita o boneco para conduzi-lo.
Possibilitando o uso de materiais reutilizados em sua confecção, o boneco também proporciona um maior conforto térmico à pessoa que o habita: “O modelo dele não existia, então todo o processo foi feito a partir de experimentações, analisando o que deu certo e o que não deu certo”, explica o professor Aníbal Pacha, que, em sua pesquisa de doutorado, estuda de que maneira os materiais se portam dentro desse processo de criação artística.
“Aparentemente não se vê, mas o boneco é confeccionado a partir de reaproveitamento. No rosto dele não é tinta, são pedaços de revista. É a papietagem com revista que dá a cor; a tinta entra apenas para fazer a sombra. O mundo é todo feito de talas de jupati, que é também a natureza que entrega. O meu trabalho também tem essa coisa de desenvolver um olhar sensível para o que está no entorno”.
Após o período de idealização da mascote, todo o processo de confecção ocorreu no Ateliê 705 Casa de Bonecaria, a partir da parceria com a UFPA. Com o boneco finalizado, o professor Aníbal Pacha ainda coordenou um treinamento com os monitores voluntários e os artistas do Circo Matutagem, que ficarão responsáveis por manipular Tucũ, orientando sobre como deve ser o gestual do boneco.
SBPC Jovem e Cartaz – Trazendo Tucũ em destaque, o cartaz oficial da SBPC Jovem também já está pronto para ganhar os espaços do Campus da UFPA. A peça que integra as estratégias de comunicação do evento foi desenvolvida pelo tecnólogo em produção multimídia Pedro Henrique do Nascimento Cordeiro, da equipe da Editora da UFPA (ed.ufpa). Fazendo referência às cores do caroço do tucumã, grande inspiração para a idealização da mascote, o cartaz traz tons de laranja e amarelo, além do verde. Em toda a peça, observa-se a presença dos símbolos de circuitos eletrônicos, referência também presente no rosto e nas roupas de Tucũ e que representa a conexão proporcionada por espaços de discussão da ciência.
Momento bastante esperado em todas as reuniões anuais, a SBPC Jovem busca incentivar o contato de estudantes e professoras(es) dos ensinos fundamental, médio e técnico com a ciência, a tecnologia e a inovação. A programação é livre ao público e pode ser conferida aqui. O SBPC Jovem está associado à Reunião Anual (RA) da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Nesta edição, o evento deverá acolher mais de 70 estandes, montados em estruturas que variam de nove a 320 metros quadrados, além de palcos e salas multiuso, divididas em oficinas, rodas de conversa e bate-papo com cientistas.
A lenda de Tucũ
Era um dia ensolarado na Amazônia brasileira. Pássaros cantavam e voavam, às margens do rio Tucunduba, em frente à baía do Guajará, no encantado estado do Pará. Lá habitava uma grande comunidade, protetora de um território ancestral e misterioso, harmônico e frutífero, rodeado por águas que transbordam e carregam os sonhos dos moradores daquele lugar. Dizem que aqueles que experimentam os fascínios dessa terra sempre retornam.
Houve um tempo em que a comunidade estava em euforia; todos trabalhavam para um grande acontecimento que uniria nessas terras seu povo e visitantes de diversos lugares, esperando ansiosos pela Grande Reunião. Um dia, perceberam que, ao nascer e adormecer do sol, ouvia-se ao longe um batuque ecoando: “tucũ, tucũ…”.
Na manhã seguinte, encontraram milhares de caroços amontoados às margens do rio, trazidos pelo movimento da maré. Os moradores da comunidade recolheram esses presentes que de bom grado o rio trazia, e logo descobriram formas de utilizá-los. Com eles, as crianças fizeram brinquedos que giravam feito pião. Alguns foram usados como amuleto, pois neles se podia ver um pequeno rosto. Desse caroço germinou uma palmeira, cujo sabor do fruto foi muito apreciado; seu óleo, por sua vez, foi utilizado para curar, perfumar, alimentar e embelezar os moradores.
A comunidade entendeu que aquele era um presságio alvissareiro. Desde então, todos os dias, paravam, nos mesmos horários, para ouvir o batuque do tambor: “tucũ, tucũ…”.
Um dia, porém, algo diferente aconteceu. Aquela manhã não era como as outras: a música enigmática não parou como de costume, o som do tambor estava mais forte e vibrante e a névoa que pairava no ar seguia o sopro do vento na mesma direção, indicando o caminho, como um chamado, e levando a todos para a margem do rio, onde se formava um redemoinho.
Ninguém sentia medo, ninguém dizia uma só palavra, nem os mais antigos conseguiam explicar. Todos estavam reunidos, aguardando por algo que, de alguma forma, sabiam se tratar de um momento importante para o futuro da comunidade.
De repente, o som do tambor parou, o redemoinho se desfez e a névoa foi levada pelo vento. Então todos puderam ver um único e imenso caroço ladeado por seu guardião, com um tambor nas mãos. O batuque foi entoado mais uma vez; a cada batida, o caroço pulsava. Até que o som parou, o caroço começou a abrir lentamente e, diante de todos, surgiu Tucũ.
Um ser criança, nem homem nem mulher, observante e alerta, sensível e em conexão com a natureza e o mundo. Em sua pele, o registro de seus mundos, tatuado em conexões de redes de afeto. Em suas costas, carrega o mundo invertido, onde os elementos água e terra se transmutam, presságio de uma mensagem a quem vive nesse lugar. Tucũ leva consigo toda a ancestralidade dos povos originários, instigando a todos, por onde passa, a repensar o meio ambiente e o nosso planeta.
Tucũ se tornou referência de união para a comunidade e, na Grande Reunião, defende a natureza e propaga os ideais de sustentabilidade. O caroço permanece sendo sua morada, espaço de renovação. Ainda hoje é possível ver esse ser mítico em grandes encontros, quando chamado ao som do tambor. Se você não acredita, procure: Tucũ estará lá, na 76ª Reunião Anual da SBPC na UFPA, interagindo com os participantes entre as tendas, palcos e salas às margens do rio Tucunduba, em frente à baía do Guajará!
SBPC Jovem
Oficinas, rodas de conversa, minicursos, exposições, mostra de feiras, concursos, museus itinerantes e muito mais
Quando: de 8 a 13 de julho de 2024
Onde: No campus Guamá, da UFPA
Acesse a programação completa aqui