Da compra de material até a liberação de bolsas. Há burocracia em várias etapas dos estudos
Do início da pesquisa até a publicação dos resultados finais em uma revista de circulação internacional, existe uma jornada longa e tortuosa para percorrer. Estudar e desenvolver experimentos exige paciência. E tempo. Há pesquisas que carecem de 15 ou 20 anos para chegar a um fruto. Os processos, demorados por natureza, entretanto, têm o período de efetivação multiplicado por burocracias, dificuldades para conseguir financiamentos, falta de equipamento ou infraestrutura. Ser cientista, no Brasil, não é tarefa fácil.
É difícil transpor obstáculos. A forma como as licitações são organizadas, explica Dárcio Ítalo Teixeira, coordenador da pós-graduação em Ciências Veterinárias da Universidade Estadual do Ceará (Uece), não favorece a celeridade dos experimentos. O programa tem verba para adquirir dois equipamentos ao longo de 2015. A compra, que deveria ter sido feita ano passado, não aconteceu devido aos trâmites burocráticos. O dinheiro aguarda nas contas da universidade para ser gasto há meses, os alunos de mestrado e de doutorado esperam pela chegada do material – fundamental para a continuação de experimentos. “Até agora não conseguimos fazer a compra. Se não for realizada até o fim deste ano, o dinheiro volta para o Governo Federal. E estamos falando de um recurso na ordem de R$ 100 mil. É bastante”, relata Teixeira.
Exemplos como este se multiplicam nos cursos de mestrado e doutorado. Não são raros os relatos de pesquisas inovadoras que estacionaram a produção por falta de um reagente ou de um aparelho. José Antônio Aleixo, diretor da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), pondera que a situação dos programas de pós-graduação melhorou em comparação a décadas passadas, mas ainda é preciso avançar. “O número de cursos no País cresceu exponencialmente ao lado do número de bolsas para alunos. Antes, era necessário sair do Brasil para cursar certas áreas. Hoje, temos cursos praticamente em todos os campos do conhecimento”, defende. O problema principal é histórico – afirma o diretor – pois ciência e tecnologia sempre estão entre os primeiros atingidos na hora de cortes no orçamento. “Congressistas preferem dar prioridade a outras áreas”, lamenta Aleixo.
Autonomia
As dificuldades são atenuadas nos cursos de excelência. Quando um programa consegue ter alto desempenho na avaliação trienal da Coordenação de Aperfeiçoamento de Nível Superior (Capes), passa a receber mais recursos e a gerir os montantes de forma independente. No Ceará, seis pós-graduações possuem nota seis (ver quadro). É a esperança de maior autonomia, de mais bolsas para mestrandos e doutorandos, de celeridade na chegada dos valores. Geanne Matos, coordenadora do programa em Farmacologia da Universidade Federal do Ceará (UFC), considera a burocracia mais danosa para cursos que ainda não se firmaram no universo acadêmico.
Para sanar as dificuldades, ela explica, equipamentos têm sido compartilhados entre os pesquisadores – gerando oportunidades para cursos menores avançarem nos experimentos. É uma parceria necessária, natural e benéfica para a universidade, afirma Geanne. “Temos aqui, por exemplo, uma ultracentrífuga usada por professores da Física e da Química. Eles ligam para nós, reservam e usam. A ideia é essa, ser multiusuário. Lembrando ainda que a manutenção dos equipamentos é cara. Às vezes, um aparelho de outra sala está quebrado e nós temos um semelhante aqui. Por qual razão não liberar o uso?”, indaga a pesquisadora.