A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) manifesta profundo pesar pelo falecimento do matemático Jacob Palis Júnior, ocorrido no dia 7 de maio, no Rio de Janeiro. Reconhecido mundialmente por suas contribuições à teoria dos sistemas dinâmicos, Palis foi figura-chave na consolidação da matemática no Brasil. Associado à SBPC desde 1989, atuou como vice-presidente da entidade em três gestões consecutivas (entre 1993 e 1999).
O presidente da SBPC, Renato Janine Ribeiro, destaca que Palis sempre foi um defensor intransigente da ciência, aliado a um trato pessoal extremamente cordial. Ele recorda os anos em que atuaram juntos no Conselho Deliberativo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), entre 1993 e 1997.
“Naquele período, os presidentes do Conselho foram, inicialmente, o professor Lindolpho e, posteriormente, o professor Tundisi, a quem tive o prazer de reencontrar no início desta semana, em São Carlos. Jacob, junto de seu amigo e parceiro Moisés Nussenzweig, demonstrou um compromisso notável com o financiamento e a excelência da ciência brasileira. A convite dele, tive a oportunidade de visitar o Impa, do qual era o diretor altivo e respeitado. Mais adiante, voltamos a nos encontrar em diversas ocasiões, especialmente em 2015, quando eu ocupava o cargo de ministro da Educação e ele presidia a Academia Brasileira de Ciências”, relembra.
Foi também em 2015 que Janine Ribeiro e Jacob Palis participaram da cerimônia de premiação da Olimpíada de Matemática, no Rio de Janeiro, onde o presidente da SBPC teve a oportunidade de homenagear Palis. “Essa homenagem pública foi por conta do papel decisivo que Palis desempenhou, não apenas na formulação de políticas científicas, mas também em minha própria formação nesse campo”, acrescenta.
Janine Ribeiro também ressalta conversas com Palis e Helena Nader — na época em que ela presidia a SBPC — sobre a importância de valorizar, entre os grandes nomes da ciência nacional, pessoas comprometidas com a inclusão social e com o fortalecimento da diversidade nos espaços de liderança científica.
A presidente de honra da SBPC e atual presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Nader, destaca que a morte de Jacob Palis representa uma imensa perda para a ciência brasileira. “Hoje eu perdi um grande amigo e companheiro de importantes lutas, como as do Código Florestal e do Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação. Ele vai fazer muita falta para o Brasil por tudo o que ele fez pela educação, pela ciência, pela tecnologia e pela democracia. Ele foi um batalhador na Constituição, batalhou pelo direito à educação e pelo direito ao pensar livre. A Academia Brasileira de Ciências está de luto.”
Jacob Palis foi presidente da ABC de 2007 a 2016 e defendeu a colaboração entre as instituições de pesquisa. “O que ele fez pela matemática no Brasil é sem palavras. Outra coisa que admirava no Jacob era a parceria. Ele era presidente da ABC e eu vice-presidente na SBPC, depois presidente. Nós éramos parceiros, um complementava o outro nas atividades. O que aprendi com ele, vou levar para o resto da minha vida. Ele sempre estará presente”, diz Nader, lembrando que neste período houve uma grande aproximação entre as duas entidades que se mantém até os dias de hoje.
Nader também enfatiza o firme compromisso de Palis com o financiamento da ciência, sendo um defensor convicto do investimento mínimo de 2% do PIB no setor. “Quando Gilberto Kassab era ministro da Ciência, ele sempre o cumprimentava fazendo o sinal de ‘dois’, como forma de reforçar a importância desse percentual. Kassab, por sua vez, respondia com o mesmo gesto. Jacob dizia que a única maneira de transformar o Brasil era investindo em Ciência.”
O professor titular da UFRJ e ex-presidente da ABC, Luiz Davidovich, expressa profundo pesar pela morte de Jacob Palis e cita a sua imensa contribuição para o desenvolvimento da Ciência no Brasil. “Grande cientista, grande líder da Ciência nacional e internacional, um visionário. E um querido amigo meu, emotivo e sensível, que motivava e incentivava jovens cientistas. Revolucionou as instituições que chefiou. Inovou no Impa, na ABC e na TWAS, nessas duas inaugurando o programa de membros afiliados, jovens cientistas que permaneciam na academia durante cinco anos. Difícil aceitar sua falta. Para mim, não morreu, encantou-se.”
Marcelo Viana, diretor-geral do Impa, instituição que Palis liderou por dez anos, também lamenta a morte do matemático, lembrando a importância que ele teve para o desenvolvimento da área no Brasil. “Jacob é, simplesmente, um gigante da nossa ciência. A sua visão estratégica, a sua liderança e a sua contribuição científica, revolucionaram a face da matemática e da ciência praticadas no Brasil e na América Latina, influenciando instituições e inspirando jovens cujas vidas ele impactou profundamente, e entre os quais eu tenho a honra de me incluir”, diz Viana, que foi seu orientando.
Trajetória
Nascido em Uberaba (MG), Palis mudou-se aos 16 anos para o Rio de Janeiro. Formou-se em Engenharia na UFRJ em 1962, tendo iniciado ainda na graduação sua aproximação com a matemática, por meio de cursos no Impa e no CBPF. Depois de um estágio no Impa, decidiu seguir carreira acadêmica nos Estados Unidos, onde cursou mestrado e doutorado na Universidade da Califórnia, em Berkeley, sob a orientação de Stephen Smale. Suas pesquisas contribuíram decisivamente para a teoria da estabilidade estrutural e da hiperbolicidade em sistemas dinâmicos.
De volta ao Brasil em 1968, Palis passou a se dedicar aos estudos sobre bifurcações e, posteriormente, à teoria do caos, formulando uma conjectura segundo a qual a maioria dos sistemas dinâmicos teria seu comportamento de longo prazo governado por poucos atratores.
No Impa, onde foi diretor-geral entre 1993 e 2003, criou um programa de doutorado de excelência e internacionalizou a instituição. Em 1998, foi eleito presidente da União Matemática Internacional (IMU) e, em 1995, liderou a fundação da União Matemática da América Latina e do Caribe (UMALCA). De 2007 a 2016, presidiu a Academia Brasileira de Ciências.
Publicou mais de 90 artigos científicos e orientou dezenas de estudantes de mestrado e doutorado. Entre os muitos reconhecimentos que recebeu estão a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico (1994), o Prêmio Balzan (2010) e o título de Oficial da Legião de Honra da França (2018). Era membro de doze academias de ciência ao redor do mundo e doutor honoris causa por nove universidades.
Jacob Palis deixa a esposa, Suely Lima, e os filhos Rebeca, Carlos Emanuel e Laura. Seu legado transcende gerações e continuará inspirando a ciência no Brasil e no mundo.
A SBPC se solidariza com a família, os amigos e toda a comunidade científica neste momento de luto.
Vivian Costa – Jornal da Ciência