A ligação química como um fenômeno de interferência quântica

Estudos com moléculas diatômicas e poliatômicas revelam que a formação de ligações químicas está diretamente ligada à interferência quântica, influenciando tanto a energia cinética quanto a densidade eletrônica nos sistemas atômicos. Confira no artigo da nova edição da Ciência & Cultura

whatsapp-image-2025-06-18-at-09-12-33No final do século XIX, a Química já havia avançado bastante na descrição das substâncias: sabia-se do que elas eram feitas (fórmulas químicas), como seus átomos se organizavam no espaço (estrutura molecular) e como estavam conectados entre si (estrutura química). Mas uma pergunta fundamental permanecia sem resposta: o que faz com que os átomos fiquem unidos em uma molécula? Em outras palavras, qual é a origem da ligação química? A resposta começaria a surgir no início do século XX, quando o elétron foi descoberto e novos modelos sobre o comportamento da matéria passaram a ser formulados. Isso é o que discute artigo da nova edição da revista Ciência & Cultura, que tem como tema o Ano Internacional da Ciência e Tecnologias Quânticas.

Um dos primeiros a propor uma explicação foi Gilbert Lewis, em 1916. Ele sugeriu que os átomos se ligam ao compartilhar pares de elétrons — o que hoje conhecemos como ligação covalente. Essa ideia simples ajudou a entender por que certos átomos se combinam de formas específicas e com diferentes “valências” (número de ligações que um átomo pode fazer). Lewis também ampliou os conceitos de ácido e base com base na troca de pares de elétrons. Apesar de suas contribuições, ele ainda não utilizava os novos modelos atômicos que estavam surgindo, como o de Bohr, com elétrons orbitando o núcleo em trajetórias quantizadas.

Mas foi entre 1925 e 1926 que uma verdadeira revolução aconteceu na ciência, com o surgimento da mecânica quântica. Heisenberg, por exemplo, propôs que para entender o mundo atômico era preciso deixar de lado a ideia de acompanhar a trajetória dos elétrons. Em vez disso, ele focou em quantidades que realmente podem ser medidas, como as frequências de luz emitidas pelos átomos. Suas equações eram complexas e, no início, difíceis de interpretar. Foi com a ajuda de matemáticos como Born e Jordan que se percebeu que essas equações podiam ser descritas com matrizes — estruturas matemáticas que, diferentemente da álgebra comum, não respeitam a ordem dos fatores.

Quase ao mesmo tempo, Schrödinger desenvolveu uma abordagem diferente, baseada em ondas. Em vez de usar matrizes, ele escreveu equações diferenciais — muito mais familiares para os físicos da época — que descreviam o comportamento dos elétrons. Sua famosa equação permitia prever as energias de átomos e moléculas e se mostrou equivalente à proposta de Heisenberg. A ideia de “mecânica ondulatória”, baseada em ondas associadas às partículas, logo foi substituída pelo termo mais geral “mecânica quântica”, pois ficou claro que o mundo subatômico seguia regras completamente diferentes das da física clássica.

Essas novas teorias permitiram reavaliar ideias antigas sobre a ligação química. Um exemplo marcante é a molécula H₂⁺, formada por dois núcleos de hidrogênio e apenas um elétron. Mesmo com só um elétron, ela é estável — o que contradiz a crença de que uma ligação química precisa de dois. Outro mito derrubado foi o de que a ligação surge de uma simples diminuição da energia potencial quando os átomos se aproximam. Estudos mais recentes mostram que isso não explica corretamente o fenômeno. O que realmente faz a diferença, segundo pesquisas atuais, é a interferência quântica.

A interferência quântica acontece quando as ondas associadas aos elétrons interagem de forma construtiva entre os átomos, formando regiões com maior densidade eletrônica entre os núcleos — ou seja, criando a própria ligação química. Esse fenômeno também leva a uma diminuição da energia cinética do sistema, contribuindo para a estabilidade da molécula. O mais interessante é que essa explicação funciona para diversos tipos de ligações, em moléculas simples e complexas. “Nos últimos 15 anos, temos buscado mostrar a generalidade desses resultados, examinando um grande número de moléculas, diatômicas e poliatômicas, apresentando os mais diversos tipos de ligação química”, explica Marco Antonio Chaer Nascimento, professor do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Laboratório de Ressonância Magnética Nuclear de Sólidos do CMCM/IQ-UFRJ. Assim, a mecânica quântica nos oferece não apenas uma nova forma de olhar para a ligação química, mas também uma maneira mais precisa e universal de entendê-la: não como uma atração estática, mas como o resultado de uma dança de interferências no estranho e fascinante mundo quântico.

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