Desde sua consolidação em 1926, a Física Quântica tornou-se uma das bases fundamentais da ciência moderna. Ela descreve o comportamento de átomos, moléculas e suas interações com a radiação, e tem aplicações em diversas áreas da física. No entanto, seu alcance e impacto ultrapassam o laboratório e o meio acadêmico. Três enfoques principais ajudam a entender como essa teoria é percebida e usada: o enfoque científico instrumental, o filosófico e o chamado místico-quântico. Isso é o que discute artigo da nova edição da revista Ciência & Cultura, que tem como tema o Ano Internacional da Ciência e Tecnologias Quânticas.
O primeiro enfoque, científico-instrumental, se refere ao uso prático da teoria por cientistas em experimentos e cálculos. Já o enfoque filosófico questiona os fundamentos e a interpretação da teoria, mesmo quando essas perguntas não são passíveis de teste experimental. O terceiro enfoque, mais controverso, é o místico-quântico, que tenta estabelecer conexões entre a física quântica e a mente ou espiritualidade humana. Essa perspectiva, embora popularizada pela mídia e por produtos culturais, carece de respaldo experimental e é amplamente criticada pela comunidade científica.
O misticismo quântico é visto por muitos cientistas como uma distorção da teoria quântica. Ele utiliza termos e conceitos da física de forma imprecisa, criando uma espécie de “venda espiritual” que, muitas vezes, se apoia em interpretações equivocadas ou não comprovadas. Grupos de cientistas autodenominados “céticos científicos” têm se mobilizado contra esse tipo de abordagem, embora o tom agressivo de algumas críticas possa dificultar o diálogo. A discussão, no entanto, é relevante, pois revela os limites entre ciência, crença e comunicação pública do conhecimento.
Para tentar qualificar melhor essas abordagens, alguns autores propõem subdivisões dentro do que se convencionou chamar de “misticismo quântico”. Uma delas é a “espiritualidade quântica” ou “espiritualismo quântico”, que busca uma conexão entre física e espiritualidade sem necessariamente romper com a racionalidade científica. Outra é a “neuroquantologia materialista”, que rejeita explicações místicas, mas considera que a física quântica pode ajudar a compreender a consciência. Há ainda referências ao “naturalismo animista”, tradição antiga que vê alma em todas as coisas naturais, aproximando-se da visão espiritualista de mundo. “O misticismo quântico é um tema polêmico entre cientistas porque suas afirmações não têm fundamento experimental reconhecido pela comunidade científica”, pontua Osvaldo Pessoa Jr., professor do Departamento de Filosofia (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP).
No debate contemporâneo, surgem também termos como “ocultismo”, utilizado para se referir a crenças em fenômenos não explicados pela ciência tradicional, como astrologia ou parapsicologia. Alguns filósofos da ciência preferem esse termo por considerá-lo menos pejorativo do que “pseudociência”. A discussão sobre o uso de conceitos quânticos fora da ciência toca, portanto, em temas profundos sobre os limites entre conhecimento científico, crenças culturais e espiritualidade. Entender essas diferentes formas de apropriação da física quântica é fundamental para promover uma divulgação científica crítica e acessível. “Quando o termo ‘quântico’ é invocado em diferentes contextos culturais, busca-se fundamentar uma prática cultural sugerindo que ela se baseia em uma ciência bem estabelecida”, diz Osvaldo Pessoa Jr.
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