Experimento está instalado no Criosfera 1; aquisição permite medir fluxo de raios na Terra e sua relação com clima global
A missão do módulo de pesquisa Criosfera 1, de ampliar os estudos sobre as variações dos parâmetros atmosféricos para melhor entender as mudanças climáticas na Antártica, ganha mais um reforço.
A última aquisição, um detector de raios cósmicos apelidado de CRE@AT (Cosmic Rays Experiment at Antarctica, na sigla em inglês), junta-se aos raros experimentos deste tipo realizados no continente para medir o efeito desses elementos na superfície da Terra.
Originários do espaço interestelar, os raios cósmicos são partículas energéticas que se deslocam a velocidades próximas à da luz (299.792.458 metros por segundo) e fornecem aos cientistas informações importantes sobre as condições físicas do sistema solar e do universo.
O pesquisador do departamento de Física Experimental de Altas Energias do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF/MCTI) André Massafferri explica que esses elementos do Cosmos interagem na alta atmosfera, criando o chamado “chuveiro de partículas” na superfície da Terra, composto basicamente de múons, que são os “primos mais pesados” do elétron.
Segundo ele, o CRE@AT permite a detecção de tais partículas cósmicas com alta eficiência, além de ser capaz de medir a taxa dessas partículas a cada tomada de dados de dez minutos.
“Essa é a primeira fase do projeto”, diz Massafferri. “Na segunda, pretende-se medir também a direção em que eles incidem na Terra e, na terceira, a energia da trajetória de cada uma dessas partículas”.
A iniciativa é resultado da parceria entre o CBPF, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera (INCT Criosfera).
O CBPF conta, ainda, com a colaboração da Cern (Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear, na sigla em francês), localizada na fronteira franco-suíça e considerada o maior laboratório de física de partículas do mundo.
O coordenador do Criosfera 1, o físico Heitor Evangelista da Silva (Uerj), ressalta o uso de tecnologia baseada em fibras óticas e o design nacional como elementos positivos do CRE@AT.
“A instrumentação é uma das mais modernas já desenvolvidas nesta área e coloca o Criosfera 1 como parte de uma das maiores vocações científicas da Antártica: o estudo da astrofísica de alta energia”, reforça Evangelista, que acaba de chegar da missão bem sucedida para a instalação do primeiro laboratório de raios cósmicos do Brasil no Centro da Antártica.
Correlações
De acordo com o pesquisador do CBPF, as variações no sistema antártico têm grandes implicações em várias partes do mundo, o que serve como uma espécie de termômetro das mudanças climáticas.
Massafferri lembra que estudos recentes, ainda não conclusivos, indicam uma relação entre o clima e os raios cósmicos, tendo por princípio que a formação de nuvens parte de um ponto inicial, seja uma partícula de poeira mineral terrestre ou cósmica, por exemplo.
“Um dos objetos do estudo será justamente a relação de formação de nuvens com o clima e com partículas cósmicas.”
Ele afirma ainda que características peculiares do local onde está instalado o Criosfera 1, no Centro-Oeste da Antártica, são “interessantes” para a realização dessas medidas. Entre os motivos, está o tamanho reduzido da atmosfera em relação a regiões fora dos polos, a direção do campo magnético e a ausência de crosta terrestre.
Plataforma multidisciplinar
O coordenador do projeto, o físico Heitor Evangelista da Silva, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), relembra que, na fase inicial de instalação, o módulo foi apresentado ao Comitê Científico sobre Pesquisa Antártica (Scar, na sigla em inglês) como praticamente uma plataforma meteorológica.
“Isso representa muito pouco para o que ele faz hoje”, avalia. “A partir de 2014, o Criosfera 1 passou ao status de plataforma multidisciplinar de pesquisa polar”, conta.
Outro avanço apontado por Evangelista foi a aquisição de um sensor para verificar a variabilidade de deposição de neve. “Esse dado é monitorado hoje por satélite, mas precisamos ter a medida na superfície para entendermos toda a dinâmica de gelo da Antártica, que está ligada à questão de aumento de nível do mar.”
Além disso, durante as missões de verão, são realizadas pesquisas na área de microbiologia polar.
“Pretendemos a cada ano torná-lo mais amplo e viável para a pesquisa. Por incluir essas novas modalidades, o Criosfera 1 já não pode ser mais considerado como uma base de estação meteorológica”, diz Evangelista.
Sustentabilidade e localização estratégica
Evangelista também ressalta a “sofisticação” do Criosfera 1 em termos de sustentabilidade. “No campo da microbiologia, por exemplo, podemos explorar o potencial biotecnológico de amostras que o Proantar [Programa Antártico Brasileiro] até aqui não poderia oferecer uma vez que sua logística é limitada geograficamente.”
O módulo funciona como uma plataforma operacional 24 horas por dia durante todo o ano.
“Ele já é conhecido pela comunidade científica internacional, pois nesta modalidade só há dois similares na Antártica Central, o laboratório do Polo Sul/USA e o do EPICA/Comunidade Europeia”, ressalta. “Isso coloca o Brasil em um patamar diferenciado na pesquisa antártica.”
Relevância e apoios
O módulo é uma ação do INCT da Criosfera com recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/MCTI). Conta também com o apoio da Secretaria Interministerial para os Recursos do Mar (Secirm), da Academia Brasileira de Ciências (ABC), da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e do Instituto Antártico Chileno.
Desde 2011, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) investiu R$ 2,6 milhões no projeto.
Outras informações podem ser adquiridas no site do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) ou do MCTI.
(Portal Brasil, com informações do MCTI) – http://www.brasil.gov.br/ciencia-e-tecnologia/2015/01/detector-de-raios-instalado-na-antartica-permitira-aprofundar-pesquisas%20