Em meio a denúncias de irregularidades, que incluem questões científicas, administrativas e trabalhistas, governo estadual pede cargo ocupado pelo médico à frente da Fundação que administra o Instituto
O secretário de Saúde do estado de São Paulo, David Uip, pediu o cargo ocupado pelo médico Jorge Kalil à Frente do Butantan, órgão subordinado à pasta. A informação foi divulgada hoje (12) na versão eletrônica do Jornal da Ciência, publicação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Em carta dirigida ao governador Geraldo Alckmin (PSDB), o pesquisador Osvaldo Augusto SantAnna, do Centro de Toxinas, Resposta Imune e Sinalização Celular do Instituto Butantan, pede que o estado mantenha Kalil à frente das pesquisas científicas e informa que André Franco Montoro Filho será o novo presidente da Fundação.
Kalil acumulava a presidência da Fundação Butantan, entidade de direito privado que responde pela gestão administrativa e financeira do Instituto, que ao longo de mais de 100 tornou-se referência na produção de soros.
Em junho, o Tribunal de Contas Estadual publicou relatório que apontava diversas irregularidades no Butantan, entre elas o acúmulo de funções de presidente da fundação e de diretor do Instituto por Kalil, bem como a extrapolação do teto constitucional definido para os ocupantes de cargos da administração fundacional, constatada nos subsídios do cargo de superintendente-geral da fundação.
Conselheiro da diretoria do Instituto e da Fundação Butantan, o economista Montoro Filho é ex-secretário de Economia e Planejamento nas gestões Mario Covas e Geraldo Alckmin (1995-2002), com papel de destaque no chamado processo de ajuste e disciplina fiscal e no Programa de Desestatização do Estado de São Paulo (PED). Montoro filho também integra o conselho diretor da fundação.
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do Butantan negou a troca na direção, afirmando que Kalil continua ocupando a direção. Não foi possível apurar se além da Fundação ele deixará também o Instituto. Curiosamente, o site oficial esteve indisponível à tarde.
Até o fechamento da reportagem, a Secretaria Estadual de Saúde não havia se manifestado a respeito. A presidência da Fundação é por mandato. Comenta-se na instituição que o estado teria pedido que ele deixasse a Fundação e permanecesse no Instituto. E que quando aceitou, o estado o tirou dos dois.
A troca no comando do Butantan é divulgada num dia marcado por movimentações na sede no instituto. De acordo com trabalhadores, em meio à circulação da informação de que Alckmin visitaria o local, foram colocadas placas em mais de 30 prédios reformados. O governador não apareceu. Viajou a Brasília, onde foi recebido pelo ministro da Saúde, Arthur Chioro, para discutir sobre ações de saúde para São Paulo.
Por coincidência, hoje a direção do Butantan chamou setores da imprensa para divulgar o fim das reformas de sua fábrica de soros e estoques para atender às exigências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Conforme noticiou a Agência Brasil, Kalil afirmou que a produção do instituto passará de 400 mil doses para 750 mil por ano, que atualmente são produzidos ali 13 diferentes tipos de soro contra venenos e toxinas, e que a Anvisa deverá liberar a produção em fevereiro de 2016.
Foi informado ainda pela agência que o Butantan está renovando o parque fabril das vacinas, que também não se encaixava nas novas especificações e que está sendo terminada a segunda fase dos testes clínicos da vacina contra a dengue, com um pequeno grupo de pessoas.
No entanto, ex-diretores colocam em dúvida a produção no instituto estadual. Ao anunciar a saída do Butantan, Isaias Raw criticou a gestão e a paralisação na produção de soros e vacinas. E segundo o ex-diretor científico Antonio Carlos Martins de Camargo, a instituição não tem os recursos técnicos e humanos necessários para produzir uma vacina contra dengue. “Não há nem sequer virologistas entre os pesquisadores”, disse.
A gestão do Butantan tem sido marcada também por denúncias de irregularidades administrativas, como a contratação sem licitação para reformas que inclui construtoras em descumprimento às leis trabalhistas, e a tentativa frustrada de impor a mudança no enquadramento funcional de seus trabalhadores.