O tema foi debatido na mesa-redonda “Desigualdade social e direitos
humanos” nesta quarta-feira (25), durante a 64ª Reunião Anual da
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece na
Universidade Federal do Maranhão (UFMA) até o dia 27 de julho.
O debate sobre direitos humanos é da mais alta
importância para o desenvolvimento brasileiro, em todas as suas
dimensões. Os desafios apresentados pela situação de desigualdade social
que permanece no País, apesar da aclamada melhora econômica, são
variados e pedem a reflexão da comunidade acadêmica para fomentar
políticas públicas eficazes.
Neste sentido, Maria Jacinta Jovino, doutora em
políticas públicas e professora UFMA, começou o debate pelo início, pela
definição de direitos humanos – como dignidade intrínseca a todo ser
humano -, definidos por uma Declaração Universal que tem mais de 60
anos. A professora definiu a desigualdade social como matriz da violação
dos direitos humanos e argumentou que não é possível pensar em
desigualdade social sem tratar de exclusão, vulnerabilidade e outras
questões de risco. “Diferenças e vulnerabilidade trazem necessidades
especiais, específicas, mas os direitos são os mesmos”, ou seja, “só
pela condição de ser humano ele tem direito a ter direitos”.
A professora fez um retrato da população
brasileira em relação às desigualdades existentes no País e em suas
regiões. Ela apresentou dados dos Indicadores Sociais do IBGE de 2010,
referentes ao ano de 2009, onde 52,8% das famílias no País possuem
rendas abaixo ou até um salário mínimo. “Estamos vivendo, podemos dizer,
uma outra forma de extermínio”, declarou. Jacinta explica que a
distribuição desigual de renda expressa o “acirramento do fosso social
entre a maioria das famílias das camadas mais pobres e a minoria das
famílias ricas”, além de evidenciar também as diferenças entre as
comunidades dos centros urbanos e as que vivem em suas periferias.
Em sua apresentação, Edna Ramos de Castro,
professora da Universidade Federal do Pará e diretora da SBPC, falou
sobre a tendência histórica na sociedade brasileira de concentração de
renda e de propriedade que alimenta a desigualdade. Para ela, a visão
histórica é importante para entender “o tamanho do nosso desafio”. Ela
explica que o modelo de desenvolvimento adotado pelo Brasil definiu essa
estrutura de desigualdade e que a tendência do País de concentração de
riqueza, capital e terra só pode ser revertida com “políticas públicas
combinadas”.
No debate, Edna propôs analisar os direitos
humanos também no âmbito da justiça e incorporou em sua análise os
direitos socioambientais, como o direito à terra. “Direitos humanos
precisam ser vistos dentro da dimensão de justiça social, ampliando esse
conceito para a justiça socioambiental”. A pesquisadora afirma que é
preciso pensar no homem como um ser “bio-sociológico, que vive dentro e
faz parte da natureza”.
Ela falou sobre a resolução da Advocacia-Geral
da União (AGU), publicada neste mês, que libera a intervenção em terras
indígenas sem a necessidade de consultar os índios ou mesmo a Fundação
Nacional do Índio (Funai). Em seu entendimento, a medida viola os
direitos garantidos pela constituição, além de facilitar a exploração de
terras por grandes empresas e flexibilizar os direitos dos povos
indígenas que já estavam estabelecidos. “Esse é um discurso que era
impossível há 10 anos atrás, que não estava presente com tal força para
definir uma portaria, hoje os direitos estão sendo subtraídos e são uma
ameaça a outros direitos que já são legais do ponto de vista da
constituição”, alerta.
Para Edna, “temos que estar preparados para
entender os discursos que estão sendo produzidos sobre as desigualdades
sociais. Momento atual de euforia econômica mas há outros processos que
ocorrem e produzem outras formas de desigualdade e violação dos direitos
humanos. Precisamos de uma leitura mais refinada e transversal para não
deixar escapar as mudanças que estão ocorrendo”. No mesmo sentido,
Jacinta complementa que só é possível diminuir a desigualdade social
quando os mais pobres passarem a se apropriar de uma fatia maior da
renda total da sociedade. “Crescimento econômico isolado pode ser pouco
efetivo para acabar com a pobreza”, setencia.
(Jornal da Ciência)