Espécies
extintas, hotspots e questionamentos políticos em relação a essas regiões movimentaram
o debate na 64ª Reunião Anual da SBPC.
Os biomas brasileiros foram analisados numa mesa-redonda nesta
quinta-feira (26), durante a 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC), em São Luís, mais especificamente
os biomas que existem no estado do Maranhão (Amazônia, Caatinga e
Cerrado) e a Mata Atlântica. A conferência contou com a participação de
Adalberto Luis Val, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (Inpa); Gustavo Martinelli, do Centro Nacional de Conservação
da Flora/Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(CNCFlora/Iphan) e Carlos Martínez Ruiz, da Universidade Federal do
Maranhão (UFMA).
Val, que coordenou a mesa, destacou que o
Maranhão representa um encontro de biomas e uma região de “forte
ebulição biológica”, que promove o “encontro de diferentes
comunidades”. “É uma mina de ouro biológica, é o sonho de consumo de
qualquer biólogo trabalhar aqui e ver como se dão as transições”,
opina.
Carlos Martínez Ruiz completa dizendo que o
Maranhão é “uma encruzilhada geográfica” e que seus biomas concentram
Mata de Transição, Cerrado, Campos, Floresta Equatorial, manguezais e
vegetação de restinga. E enumerou uma série de características da
região, como a biodiversidade intensa, com, por exemplo, setecentas
espécies de aves – o Brasil tem cerca de 1.800. Só o estado possui mais
espécies do que a Europa, que tem por volta de seiscentas.
“Pré-Amazônia”- Ruiz chamou a
atenção para a questão “política” de chamar a parte amazônica do
Maranhão de “pré-Amazônia”. “Isso é falso, a Amazônia maranhense é
Amazônia. Isso a deixa com menor valor para conservação”, alerta. O
pesquisador também falou do equilíbrio climático da região e do papel
regulador dos biomas. “Engana-se quem pensa que se pode resolver os
problemas do Nordeste sem resolver os da Amazônia”, pontua.
Ele também apontou as principais ameaças aos
biomas maranhenses: as carvoarias, “um desastre que explora tudo e não
deixa nem a capoeira”; a pecuária extensiva, “de baixíssimo rendimento
por hectare devastado”; e o agronegócio, “que substituiu as práticas
tradicionais por uma lógica mercantilista que não deixa benefícios para
as populações locais.”
Também sublinhou o fato de as pessoas
“confundirem” o plantio de eucaliptos com reflorestamento. “É muito
cinismo”, opina, lembrando argumentos políticos. O plantio dessa
árvore, usada para a produção de celulose, acidifica o solo e ameaça a
biodiversidade. E lembra que em 2008 o estado contabilizava 17% de
desmatamento de suas florestas e se o ritmo continuar, em 2050 serão
40%.
Mata Atlântica – Por sua vez,
Gustavo Martinelli descreveu características da Mata Atlântica que ocupa
1,35 milhão de quilômetros quadrados do País (cerca de 16%). Fica
atrás apenas da Amazônia (47,65%) e do Cerrado (23,49%). Ele lembra de
alguns ecossistemas do bioma que também existem no Maranhão, como
restingas e mangues.
Ele frisou também o conceito de hotspot para
biomas ou regiões com extrema riqueza, geralmente associados a um
grande processo de destruição. Nesse sentido, conta que 77% da
população brasileira vive em áreas da Mata Atlântica, que abrange
dezessete estados da Federação e é patrimônio mundial da ONU.
Martinelli recorda que, da Mata Atlântica
original, restam 7,9%. Ainda assim, o bioma, o único a ter uma lei
específica para protegê-lo, concentra por volta de 21 mil espécies,
sendo que o Brasil contabiliza 60 mil. No entanto, a lista de extinção
na Mata Atlântica ronda as 700 espécies. “Segundo dados da SOS Amazônia
e do Inpe, o equivalente a um campo de futebol é destruído a cada
quatro minutos”, lamenta.
Perguntado por Val a respeito da lei de acesso à
biodiversidade, que causa polêmica entre os cientistas a respeito da
coleta e acesso aos recursos, Martinelli se disse “extremamente
irritado com esse gargalo”. “Essa MP vinha carregada de uma visão que
todos nós somos biopiratas a não ser que provemos o contrário”. Por sua
vez, Ruiz pediu “mais investimentos em ciência e menos burocracia”.
“É claro que o Brasil precisa se proteger, se
fazer respeitar lá fora, mas é praticamente impossível o País conseguir
proteger toda sua biodiversidade, não pode se tornar um ‘bunker’. A
solução para se tornar competitivo é jogar na defensiva e na ofensiva
também, mexer na biodiversidade antes que outros mexam”, conclui o
pesquisador da UFMA.
(Clarissa Vasconcellos – Jornal da Ciência)