60 anos do golpe: Operação Guarani vigiou Reunião Anual da SBPC na Unicamp

Regime militar montou conjunto de ações para espionar realização de encontro em julho de 1982 em Campinas

O nome é caro à alma da cidade – Operação Guarani – remetendo à ópera famosa do compositor e maestro campineiro Antônio Carlos Gomes (1836-1896). Pois foi este nome o escolhido pelo regime militar para uma das mais emblemáticas ações de monitoramento da cidadania em Campinas durante a ditadura, a Operação Guarani, montada por um conjunto de órgãos de repressão e da “comunidade de inteligência” para espionar e, eventualmente, reprimir, a realização na Unicamp, entre 6 e 14 de julho de 1982, da 34ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

De fato, houve uma grande articulação de bastidores na época, envolvendo o reitor da Unicamp, José Aristodemo Pinotti, e o presidente da SBPC, Crodowaldo Pavan, para evitar uma intervenção direta dos militares durante o evento.

Todo o desenrolar da Operação Guarani foi objeto de um detalhado relatório do Centro de Informações do Exército (CIE), o Relatório Especial de Informações 07/82.

O documento, que pode ser encontrado no site Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional, é muito revelador de como agia a “comunidade de inteligência” no regime militar. O envolvimento de um grande número de instituições ligadas à ditadura mostra, por sua vez, a importância que o regime dava para o conjunto da comunidade científica em geral e, em particular, para as Reuniões Anuais da SBPC, que se tornaram um dos principais espaços de crítica aos militares, entre o final da década de 1970 e início da década de 1980.

 

O presidente da SBPC, Renato Janine Ribeiro, enviou o seguinte comunicado:

“A SBPC fica muito grata ao portal por divulgar esse fato tão irritante que mostra um período bem negativo da história do Brasil, a saber a ditadura, com a hostilidade direta à inteligência, ao trabalho científico e intelectual que era sistematicamente considerado como comunista e subversivo, quando não era. Quando é trabalho de conhecimento que sempre agrada a uns e desagrada a outros, e desagradava muito à Ditadura, porque ditaduras crescem e se mantêm, sobretudo, pela negação da verdade, pela mentira, pela violência.

Quanto aos fatos, a atual Diretoria da SBPC não tem nenhuma condição de comentar, de fazer qualquer reparo ou mudança, uma vez que não testemunhou o que aconteceu há tantas décadas e os personagens que desse evento participaram, como o reitor da Unicamp e o presidente da SBPC, já faleceram. Porém, a SBPC manifesta, mais uma vez, seu mais veemente repúdio a esse tipo de acontecimento. A ideia de que repartições de repressão política se ocupem do que deve ou não deve ser autorizado numa reunião científica é absolutamente indigna. Esse tipo de medida é inaceitável e, por isso, nós nos manifestamos claramente contra esse tipo de prática que ocorreu no passado e esperamos que nunca mais volte a ocorrer. Mas para nos livrarmos disso de uma vez com todas, para termos o devido livramento, nós precisamos estar sempre atentos na defesa das causas democráticas.”

Veja o texto na íntegra: Hora Campinas