A falta de conhecimento é um dos obstáculos para a implementação do Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação, afirmam participantes da mesa-redonda que debateu o tema durante a 70ª Reunião Anual da SBPC, que acontece na Universidade Federal de Alagoas (Ufal), em Maceió.
Sancionado em janeiro de 2016, o decreto que regulamenta o Marco Legal (Decreto 9.283/2018) foi publicado em fevereiro deste ano. O desafio agora é garantir que essa ferramenta legal – desenvolvida com o objetivo de desburocratizar as atividades de pesquisa e inovação no País, simplificar os convênios para promoção da pesquisa pública e fortalecer a internacionalização de instituições científicas e tecnológicas – seja amplamente divulgada e implementada em todo o País.
Os participantes do debate também frisaram que os pesquisadores e instituições precisam se conscientizar sobre todas as normas do Marco Legal da CT&I para realizar esses objetivos propostos na lei.
A presidente de honra da SBPC, Helena Nader, ressaltou a importância de acelerar a implementação do Marco Legal da CT&I e frisou que a luta não acabou com a sua regulamentação, já que é ainda necessário derrubar os oito vetos impostos na ocasião da sanção da Lei.
Nader disse que o desconhecimento por parte das instituições sobre o Marco pode comprometer o processo de implementação da lei. “O que eu estou vendo em muitas instituições é o seguinte: quem conseguir em seis meses fazer uma parceria (com empresa), é um felizardo. Só que nenhuma relação com o setor produtivo aguenta ou pode esperar seis meses. Nós convencemos o Congresso, o Judiciário e o Executivo (sobre a necessidade de agilizar processos) e não estamos convencendo dentro de nossas próprias casas.”
A diretora de inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Gianna Sagazio, disse que o Marco Legal pode ajudar o Brasil a melhorar seu desempenho na inovação, ou seja, na elaboração de novos produtos a partir do conhecimento científico e tecnológico. “Temos trabalhado para avançarmos e temos tido resultados positivos. Mas, podemos avançar com uma parceria mais firme entre governo, empresa e academia”, disse. Para ela, com os incentivos à inovação, tanto para a indústria quanto para as instituições públicas espera-se que o Brasil se aproxime das primeiras colocações no ranking de inovação, considerando o potencial econômico e o bom corpo técnico-científico. “Quando há investimento há resultados efetivos no país”, disse.
Ela citou que o Brasil subiu cinco posições no ranking mundial de inovação elaborado pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) em parceria com a Universidade de Cornell e com a escola de negócio Insead. Apesar da elevação observada do ano passado para este ano – o País era o 69º no ranking e hoje está na 64ª posição – essa colocação não condiz com o status de oitava economia do mundo, entre os 126 países listados. A Suíça é a líder do Global Innovation Index (GII), pelo oitavo ano consecutivo. Na comparação com 18 economias da América Latina e Caribe, o Brasil aparece na sexta posição. “Melhoramos, mas ainda não está bom. Temos de seguir o exemplo de países que elegeram inovação como estratégia nacional e subiram neste ranking, como, por exemplo, a China”, disse.
Para o Brasil avançar mais rápido, Sagazio explica que é necessário que o governo crie metas junto com o setor privado, invista na capacitação de pessoas e empresas, aumente a capacidade de resposta do Estado, regulações e fomento pró-inovação com segurança jurídica, crie estratégias diferenciadas pelos estágios de desenvolvimento de empresas e ecossistemas e crie programas e instrumentos para sintonizar os centros de pesquisa com as empresas.
A prática
Francilene Garcia, presidente do Consecti, também concorda que o maior problema é colocar em prática as modificações do Marco Legal da CT&I nas instituições estaduais. “Alguns estados já fizeram a adaptação, mas ainda há um desconhecimento. É preciso trabalhar com uma lógica mais adequada. Se não tivermos um alinhamento, não chegaremos aonde queremos”, disse.
Garcia, que também é secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado da Paraíba, explica que as mudanças podem se dar tanto por decretos quanto por lei ordinária. Ela também explica que é preciso mudar a percepção de que os recursos destinados à ciência são gastos. “Eles deveriam ser considerados investimento”.
Alvaro Prata, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e de Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), explicou que a regulamentação é necessária porque a lei apenas legislava o que podia ser feito, mas sem explicar como.
Focando a necessidade de inovação, Prata comenta que o Brasil faz uma ciência de qualidade, mas tem dificuldade em utilizá-la a favor da economia e da sociedade em geral. “Ocupamos a 64ª posição no Índice Global de Inovação e a 81ª no Índice de Competitividade Global. Não somos competitivos porque o Brasil, sendo ainda um país desigual, possui outras prioridades e urgências”.
Ele acredita que o Marco Legal veio para contribuir para a melhoria da para o crescimento da inovação. “Ao não aplicar o conhecimento que estamos produzindo, estamos perdendo oportunidades de crescer”, disse ao reiterar que é necessário ensinar as instituições a usarem o Marco Legal da CT&I. De acordo com ele, o próximo passo é criação de manuais para os usuários sobre a aplicação da lei, com uma ampla divulgação.
Prata comentou ainda que existe um conflito de lógicas do servidor público, que só faz o que a lei permite fazer, e das empresas, de que o que não é proibido, é permitido. “As instituições precisam encontrar um consenso e esclarecer quais os caminhos internos que os processos de formação de convênio ou de contratação em regime especial devem percorrer”, concluiu.
Vivian Costa – Jornal da Ciência