Tive o prazer e a tristeza de conhecer o Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí. 

Por meio de uma iniciativa pioneira da presidente da SBPC, Helena Nader, articulada com a ex-secretária geral da instituição, Rute Andrade, a SBPC promoveu uma Reunião Regional em São Raimundo Nonato-PI, entre os dias 20 e 23 de abril. 

Com esse nome, claro, ouvi muitas piadas. Escolinha do Professor Raimundo, famoso programa da Rede Globo, foi o mínimo. Associado aos piadistas, se juntavam os curiosos: “o que você vai fazer lá? O que tem lá?”. Ou ainda meus filhos: “mamãe, para três dias de reunião, por que uma semana longe de casa?”

Respondo aos poucos:

1) São Raimundo Nonato é uma cidade com cerca de 34 mil habitantes (segundo estimativas do IBGE para 2015). Menos que um Maracanã com Flamengo X Remo. Essa cidade tem no entorno o Parque da Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham), um campus da Universidade Estadual do Piauí (Uespi), outro da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), e um do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí (IFPI). 

2) Por que a arqueóloga brasileira Niède Guidon largou o cargo de professora na Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales (Ehess), em Paris, e se lançou nesta empreitada em São Raimundo Nonato? Porque qualquer biólogo ou arqueólogo com um mínimo de brios e amor à ciência quer largar tudo e se jogar na imensidão de possíveis descobertas que a região oferece. Comentei com uma amiga pesquisadora: já tenho um senso crítico elevadíssimo em relação à relevância da pesquisa que faço. Ao ver tudo que há para ser explorado aqui, sinto-me tola por pesquisar o que pesquiso. 

Como bióloga, a biodiversidade e ecossistema únicos fazem sonhar. Como arqueóloga, imagino a excitação dos primeiros cientistas ao verem as inscrições rupestres. Estas descobertas abriram caminho para uma rediscussão sobre a origem do Homem nas Américas. Só um louco abriria mão de investigar esses achados. 

3) Por que, para três dias de reunião, fiquei longe de casa uma semana?

Aos meus filhos: Porque o aeroporto de São Raimundo Nonato ainda não recebe voos, não importando todo o investimento feito pelo governo federal, que é o meu, seu, nosso imposto, mais a doação de grande parte do prêmio de R$ 300 mil que a Dra. Niède recebeu, EM SEU CPF, da Fundação Conrado Wessel, em 2013, por sua contribuição à Cultura do País, para usar como lhe conviesse. E ela empenhou para que o aeroporto ficasse pronto. O aeroporto, que levou 12 anos para ser concluído, foi inaugurado três vezes, a última em outubro de 2015, mas ainda não está operando. Segundo relatos que ouvi pela cidade, têm até árvores crescendo na pista. Qualquer semelhança com a ciclovia da orla do Rio de Janeiro é mera coincidência. 

Acredito que este breve relato resume a alegria e a tristeza de conhecer o Parque Nacional Serra da Capivara, os parques adjacentes e a Fundação Museu do Homem Americano. A Dra. Niède Guidon está com 83 anos. O Brasil precisa de menos heróis e mais ações estratégicas, mais política de Estado.

Em triste comparação, os EUA criaram um super parque, chamado Walt Disney World, sobre um grande pântano e fatura muito com Turismo. O Brasil tem um Patrimônio Cultural da Humanidade, reconhecido pela Unesco, e não coloca em operação um aeroporto, o que exige um dia e meio de deslocamento para quem vive no Sudeste do País e deseja conhecer o Parque. Este é o Brasil das ciclovias, como a da orla do Rio de Janeiro. Incríveis recursos naturais, subaproveitados. Viajei para tão longe para ver mais do mesmo: ciclovias e aeroportos. 

Torço e luto pelo dia de levar meus filhos à ciclovia e ao Parque Nacional Serra da Capivara. Sonhos simples, mas que em dias de turbulência parecem muito distantes.