Mesa-redonda no primeiro dia de atividades da 67ª Reunião Anual da SBPC reuniu Academia Brasileira da Ciência, Conselho Nacional de Educação e Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores para discutir ensino e inovação no Brasil
Educação Superior, pesquisa básica e a política industrial brasileira estiveram no centro do debate sobre desenvolvimento e inovação no país nesta segunda-feira, dia 13 – primeiro dia de atividades da 67ª. Reunião Anual da SBPC, na UFSCar, em São Carlos. Jorge Luiz Audy, vice-presidente da ANPROTEC (Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores), Luiz Davidovich, físico, professor da UFRJ e membro da Associação Brasileira de Ciências (ABC), e Luiz Roberto Liza Curi, do Conselho Nacional de Educação (CNE) apresentaram um panorama da situação do ensino superior brasileiro e discutiram as possibilidades de fazer desenvolver uma indústria inovadora no Brasil.
Audy destacou os atrasos do país, que em termos de inovação, está no mesmo nível que a África. De acordo com o Index de Inovação Global de 2014 da Associação Internacional de Parques Científicos e áreas de Inovação (IASP – https://www.globalinnovationindex.org/content.aspx?page=data-analysis), o Brasil está em 61º. no rank. Ele atribui o baixo desempenho à ausência de um sistema de inovação com impacto na área industrial.
Segundo ele, o desenvolvimento do País é ainda sustentado com a exploração da matéria ao invés do conhecimento. “Estamos muito distantes de transformar conhecimento em riqueza, em valor agregado à sociedade”, disse.
O representante da Anprotec enfatizou a importância de investir na 3ª. missão da Universidade, a extensão. Conforme comentou, esse processo começou muito tardiamente aqui, cerca de 50 anos após os Estados Unidos e décadas após a Europa. Para isso, a chamada relação tripla hélice, entre governo, empresas e universidades deve, segundo ele, ser fortalecida.
Os ambientes de inovação no resto do mundo, comentou, tem uma participação muito forte de empresas no desenvolvimento de P&D, como a Tecnópolis Francesa, o Vale do Silício nos EUA. No Brasil temos também um modelo, que é o Porto Digital, em Recife. Mas, segundo Audy, a ideia de parque tecnológico hoje em dia já está transbordando para o conceito de Smart Cities (Cidades Inteligentes), que, muito além de pensar onde construir esses espaços, pensa em como transformar as cidades como um todo.
O papel das instituições de ensino superior, nesse novo contexto, deveria ser o de buscar romper um pouco com a tradição de ser somente pesquisa e transformar a ciência em valor agregado, conforme ressalta: “As IES devem colocar a tradição e qualidade a serviço da renovação necessária para atender ao cumprimento de sua terceira missão”.
Flexibilidade
O físico Luiz Davidovich destacou a evolução da pesquisa no Brasil, a começar pelo número de doutores formados por ano – 15 mil –, juntamente ao aumento do número de artigos em publicações internacionais, e a consequente elevação no fator de impacto. O professor ressaltou ainda os 18 milhões de estudantes inscritos nas Olimpíadas de Matemática, além do matemático brasileiro, Artur Ávila, o primeiro a ser laureado com a medalha Fields.
Da mesma forma que tivemos progresso, especialmente na última década, Davidovich observa que os gastos anuais do País por estudante é ainda menos que o do México e do Chile. “Aumentamos o percentual do PIB aplicado na Educação, colocando o País no mesmo nível dos países mais desenvolvidos. Mas a relação de gasto por aluno no ensino superior com gasto médio primário revela um investimento extremamente baixo no ensino primário”, disse.
O professor criticou também a falta de flexibilidade no ensino superior nacional e como isso afeta a predominância das instituições privadas. “As universidades privadas poderiam atuar como os colleges americanos. Mas temos que conviver com um sistema engessado”, comentou.
O modelo dos colleges tem por objetivo a formação de pessoas para as profissões que o mercado demanda. As universidades públicas, concentrariam, assim, os estudantes interessados em desenvolver pesquisa, mantendo aberta, como no modelo estadunidense, a possibilidade daqueles provenientes dos colleges de ingressarem nos cursos de pesquisa validando seus créditos universitários. Mas, de acordo com ele, tal modelo só é possível se houver uma flexibilidade curricular, como fez a China em 2004.
Expansão
Para Luiz Roberto Liz Curi, do CNE, as avaliações do ensino superior fizeram pouco pela universidade pública. O que é um problema, uma vez que, conforme aponta, “a expansão da pesquisa ocorre a partir das avaliações”. Porém, o que tem acontecido, é que as avaliações têm servido para que as instituições privadas se ajustem aos critérios mínimos. “O problema de governança decorre do processo de avaliação”, contestou.
Curi dá o exemplo do ENAD, que seria a avaliação de maior impacto, mas, segundo ele, é uma análise comparativa e por isso, não pode constituir-se em um modelo eficaz para definição de políticas públicas.
Curi destacou as discrepâncias na distribuição do ensino superior brasileiro, entre instituições públicas e privadas – dos 32 mil cursos registrados, 21 mil são privados; e, especialmente entre regiões: 46% dos cursos disponíveis estão concentrados na região sudeste, enquanto que o norte fica apenas com 8% do total. “Isso é um quadro que se repete há oito censos. Não cresce a matrícula na região norte. Demonstra um quadro conservador da expansão no país”.
Outro dado que merece atenção são as matrículas em cursos presenciais, que cresceram 75% entre 2002 e 2011, ao passo que os cursos de Ensino a Distância (EAD) inflaram 2800% no mesmo período. “O processo de expansão do ensino superior brasileiro gera três grandes restrições: territorial, de áreas de conhecimento e institucional”, comentou.
Para ele, tais restrições comprometem a qualidade da pesquisa , pois afetam diretamente o processo inovativo, que, no Brasil, permanece dependente da universidade.
(Daniela Klebis/ Jornal da Ciência)