Para a presidente da SBPC, Programa Ciência sem Fronteiras está “depauperando” o FNDCT
Embora o Programa Ciência sem Fronteiras (CsF) seja um dos pilares para a internacionalização da educação brasileira e para a formação de recursos humanos com qualificação, especialistas veem necessidade de ajustes no programa. Esse foi o foco central da audiência pública na Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) realizada na manhã desta quarta-feira, 29, no Senado Federal.
Mediado pelo senador Cristovam Buarque, presidente da CCT, o debate avaliou a política pública de “Formação de Recursos Humanos para Ciência, Tecnologia e Inovação, com especial enfoque para o programa Ciência Sem Fronteiras.”
A mesa de debate reuniu nomes como o presidente do CNPq, Herman Chaimovich, o presidente da Capes, Jorge Guimarães, a presidente da SBPC, Helena B. Nader; e o acadêmico Isaac Roitman, professor Emérito da Universidade de Brasília (UnB) e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC).
Abrindo o debate, a presidente da SBPC, docente da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), fez elogios ao Programa Ciência sem Fronteiras para a formação de RH no País, mas voltou a questionar a fonte de recursos canalizados para o Programa. Ela criticou o fato de o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), criado há décadas para fomentar a pesquisa, desenvolvimento e inovação, ser a principal linha de fomento dessa iniciativa.
“O Ciência sem Fronteiras é um programa que aplaudo de pé, mas ele está depauperando o FNDCT que não foi criado para isso. É aquela história da ´escolha de Sofia´: faltou dinheiro, tira do FNDCT”, avalia a presidente da SBPC.
Despesas cobertas pelo FNDCT
O próprio presidente do CNPq, Chaimovich – que também fez vários elogios ao Programa, sobretudo no que se refere à internacionalização da educação brasileira – reconheceu a necessidade de serem criadas novas fontes de recursos para o programa Ciências sem Fronteiras. “O Programa Ciência sem Fronteiras tem que continuar, mas precisa ser um programa com recursos novos.”
Dados apresentados por Chaimovich revelam que o orçamento do MCTI (sem as emendas parlamentares) está na casa de R$ 6,5 bilhões, dos quais R$ 3,8 bilhões são provenientes do CTPetro. Do total, R$ 1,1 bilhão são extraídos do FNDCT para cobrir despesas do Programa Ciências sem Fronteiras.
Na ocasião, o presidente da Capes informou que de 2011 a 2014 foram aplicados R$ 6,359 bilhões no Programa. A previsão para 2015 é que esses valores somem R$ 9,4 bilhões, no total.
O programa foi criado para ofertar no total 101 mil bolsas, sendo a maioria (79%) cursos de graduação, principalmente na área de exatas. Guimarães apresentou balanço mostrando que 40 mil estudantes bolsistas já voltaram ao Brasil. Outro universo de 32 mil voltará este ano.
No debate, o presidente da Capes saiu em defesa do aumento da participação dos investimentos em ciência e tecnologia no Produto Interno Bruto (PIB) para 2%, principalmente por parte do setor privado, seguindo o modelo de países desenvolvidos.
“Se o país não aplicar 2% do PIB em ciência e tecnologia será difícil ganhar condições para crescer”, observa.
Por sua vez, o acadêmico Isaac Roitman, professor emérito da UnB, também defendeu aperfeiçoamento do Programa Ciência sem Fronteiras. Ele recomendou, dentre outros fatores, a inclusão das áreas Humanas e Sociais no Programa. Sugeriu, ainda, a criação de indicadores de qualidade do programa (de resultados e de impactos); e a revisão das metas quantitativas e critérios de seleção.
Investimento pífio em C&T
O presidente da Capes, Guimarães, destacou que o Brasil investe 1,1% do PIB em ciência e tecnologia e possui números modestos de cientistas e engenheiros. Com a mesma visão, a presidente da SBPC defendeu aumento de número de bolsas de doutorado para formação de recursos para área de CT&I.
Do lado da plateia, o senador Omar Aziz (PSD/AM) fez vários questionamentos aos integrantes da mesa. Interrogou, por exemplo, quais os frutos que o Brasil colherá com os investimentos no Programa Ciência sem Fronteiras e a vocação da pesquisa no Brasil. “Qual é a vocação da pesquisa no Brasil?”, questionou o senador.
O parlamentar aproveitou o debate para criticar o fato de o Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA), criado há anos, ainda não ter saído do papel. “Cuba no passado recebeu 5 bilhões (de dólares) da União Soviética e investiu em pesquisa em saúde. E o Brasil cria ministérios com tanta facilidade mas não consegue colocar o CBA para funcionar.”
Em resposta ao senador, o presidente da Capes disse que a vocação da pesquisa brasileira tem sido a agricultura. O Brasil, segundo disse, ocupa a primeira posição no ranking mundial em conhecimento agrícola. Outro destaque é a pesquisa ligada à medicina tropical, na qual o Brasil responde por quase 20% do conhecimento mundial nessa área. “Não temos vacinas porque nossa indústria farmacêutica é muito fraca.”
Segundo Guimarães, na década de 1960, o conhecimento nessas áreas, em que o Brasil se destaca do mundo, era obtido no exterior. “Hoje não precisamos mais disso”, comemora.
(Viviane Monteiro/ Jornal da Ciência)