Educadores criticam esse tipo de avaliação e sustentam que a comparação entre as instituições pode prejudicar o ensino superior
Todo ano, avaliações nacionais de cursos universitários e rankings internacionais de universidades são divulgados e funcionam como uma espécie de selo de qualidade para instituições que se dedicam ao ensino superior. Muitos educadores, no entanto, criticam essas avaliações com a preocupação de que o impacto dessas informações pode incentivar a evasão universitária e reforçar ainda mais as assimetrias no ensino superior.
Eles defendem a necessidade de mais investimento público e revelam que a falta de autonomia financeira universitária, falta de transparência, infraestrutura deficitária, burocracia e baixa produção científica estariam entre as principais causas do mau desempenho das universidades brasileiras nas avaliações.
Para Jesualdo Farias, presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições de Ensino Superior (Andifes) e reitor da Universidade Federal do Ceará (UFC), os rankings não são válidos, pois é difícil avaliar instituições com culturas e maturidades diferentes. “No Brasil, a maioria das universidades é muito jovem e, ainda não tem autonomia para avançar em questões específicas. Não se pode comparar a produção das universidades estaduais paulistas, por exemplo, com as mais jovens universidades federais, na sua maioria situada em regiões de difícil atratividade para pesquisadores mais qualificados e, ainda, com infraestrutura em consolidação”, afirma. Ainda segundo Farias, a pesquisa e pós-graduação têm sido fatores decisivos para atrair pesquisadores e estudantes para as universidades situadas em regiões fora do eixo centro-sul do país. “No Brasil, apesar dos avanços, ainda há uma forte concentração de cursos de doutorado no sul e sudeste”, reforça.
Na opinião do presidente da Andifes, a prática dos rankings ajuda na formatação de um mapa das assimetrias do ensino superior. “A cada publicação de um ranking, repete-se praticamente a situação da publicação anterior. Felizmente, quando estes rankings levam em consideração as avaliações nacionais do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) e da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), as assimetrias são reduzidas porque houve investimentos importantes no âmbito dos programas de expansão e do Reuni (Programa de Apoio ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais)”, explica Farias. No entanto, ele alerta que para eliminar as assimetrias é importante a definição de um programa de governo com foco na questão.
No topo das listas dos rankings não há uma grande rotatividade. Segundo Farias, para que as pequenas universidades cresçam e apareçam é preciso investimento público. “É difícil uma grande universidade, que alcançou níveis de excelência nacional e internacional, cair em qualquer ranking. O financiamento para as universidades pequenas e ainda não consolidadas, para que se capacitem e possam concorrer com as grandes universidades, ainda não é satisfatório”, avalia, acrescentando que é preciso mais investimento público para que elas se consolidem e consigam atrair investimentos privados. “Como tem ocorrido nas grandes universidades brasileiras”, compara.
SBPC
Recentemente, o jornal Folha de São Paulo realizou e divulgou o RUF – Ranking Universitário da Folha. Nesta avaliação cinco aspectos foram analisados: ensino, inserção no mercado de trabalho, pesquisa, internacionalização e inovação.
Para a professora Maria Celia Pires Costa, da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), que atuou como secretária regional, conselheira e diretora da SBPC, a iniciativa do RUF é válida e representa um esforço da imprensa para avaliar as universidades brasileiras. No entanto, de acordo com ela, é importante se debater o chamado “efeito ranking” que acaba reforçando sempre as mesmas universidades no topo das listas. “O MEC deveria incentivar essa discussão, em parceria com a SBPC e a ABC (Academia Brasileira de Ciências). A nossa sociedade, infelizmente, perdeu a prática de discutir os seus problemas e desigualdades, principalmente com seus jovens. Essa força transformadora tem sido deixada de lado e o que temos visto são as manifestações públicas dos jovens extravasando todo o seu descontentamento, sem que a sociedade os ouça”, relata.
No ranking da Folha, a UEMA foi avaliada como a 7ª pior universidade pública do Brasil. Segundo a professora, a notícia repercutiu nos jornais locais, blogs, rádios e na Assembleia Legislativa do Estado. O que preocupa a ex-diretora da SBPC é o impacto dessa informação nos jovens. “O mais doloroso é que isso atinge frontalmente os alunos, atiçando o fantasma da evasão na nossa universidade, pois eles começam a se questionar: “Vale a pena continuar na UEMA?”, diz.
No caso da universidade maranhense, Maria Celia aponta algumas causas pelo mau desempenho no RUF, entre elas falta de autonomia financeira, falta de transparência, infraestrutura deficitária, burocracia e baixa produção científica, entre outras. A solução, segundo ela, é responsabilidade de todos que constituem a UEMA, mas não é tarefa exclusiva da instituição. “É preciso transformar a avaliação em um motor de discussão e da busca de superação desse problema em todos os órgãos e colegiados da universidade. Cabe também ao poder público e à sociedade civil, por meio de suas instituições, integrarem-se nesse debate e no desafio de transformar a UEMA em uma grande universidade”, afirma.
De acordo com a educadora ainda faltam pontos a serem abordados no RUF e em outros rankings. “Gostaria de ver, por exemplo, uma avaliação de como os conhecimentos gerados nas universidades têm contribuído efetivamente para produzir emprego, renda e qualidade de vida para pequenos produtores ligados a nossa rica biodiversidade”, sugere.
Outro questionamento da professora diz respeito a como essas avaliações podem ajudar o país a ter uma política de melhoria da qualidade do ensino superior. “Acredito que talvez possam contribuir, pois assim como a Capes publica regularmente seu Sistema de Avaliação da Pós-graduação, um ranking de Mestrados e Doutorados e o MEC publica a avaliação dos cursos, talvez algum dia possamos ver difundido para o grande público as efetivas contribuições das universidades para a sociedade. Essa é uma grande tarefa, para os jornalistas científicos”, opina.
De acordo com a assessoria do ministério, o MEC não faz ranking, é responsável apenas por coletar dados, como no caso do censo da educação superior, ou aplicar exames e divulgar resultados, como no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade). Já a Capes tem o Sistema de Avaliação da Pós-graduação que foi implantado em 1976. O sistema busca estabelecer o padrão de qualidade exigido dos cursos de mestrado e de doutorado e identificar os cursos que atendem a tal padrão.
Listas internacionais
Entre os internacionais duas listas são apontadas como as de maior credibilidade: o Webometrics Ranking Web of World Universities, que avalia a visibilidade na internet das universidades, e a avaliação feita pelo Times Higher Education (THE). O primeiro ranking é divulgado duas vezes por ano e é promovido pelo Conselho Superior de Investigações Científicas da Espanha. Ele leva em conta o número de visitantes em páginas da internet pertencentes às universidades e o número de publicações. Entre os dez primeiros colocados não estão relacionadas instituições brasileiras. Já no THE, a representante brasileira melhor colocada, a USP, caiu de posição e não está mais entre as 200 melhores do mundo. As três primeiras são California Institute of Technology, Oxford e Stanford, que figuram nesses postos a pelo menos dois anos.
(Edna Ferreira / Jornal da Ciência)