Brasil 4.0: a revolução da neo-industrialização

Através da ciência e da inovação, o País busca transformar seu setor produtivo, promovendo a pesquisa científica e implementando políticas públicas que garantam um desenvolvimento econômico sustentável
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Jardel Rodrigues/SBPC

A diminuição da participação da indústria no PIB brasileiro tem gerado preocupações sobre a sustentabilidade do crescimento econômico e a criação de empregos nos últimos anos. No entanto, a ciência e a inovação emergem como forças motrizes capazes de reverter esse cenário. Segundo os especialistas que participaram da mesa-redonda “Caminhos para a neo-industrialização do Brasil”, a promoção da pesquisa científica e da implementação de políticas públicas eficazes podem auxiliar o Brasil trilhar o caminho da neo-industrialização, revitalizando seu setor industrial e garantindo um futuro mais próspero e sustentável. O evento foi realizado nesta terça-feira (09/07), durante a 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece de 7 a 13 de julho na Universidade Federal do Pará (UFPA).

A mesa-redonda foi coordenada por Glaucius Oliva, professor do Instituto de Física de São Carlos da USP (IFSC – USP), e contou com a participação de Celso Pansera, presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Jefferson de Oliveira Gomes, diretor de Inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Adriana Ferreira de Faria, professora do Departamento de Engenharia de Produção e Mecânica (DEP) da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e presidente da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (ANPROTEC), e Carlos Augusto Grabois Gadelha, secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde do Ministério da Saúde (MS).

Para Celso Pansera, apesar dos desafios enfrentados no último governo, algumas conquistas importantes começaram a surgir. Uma delas refere-se ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

“Aprovamos uma lei que mudou a história do FNDCT: ele deixa de ser um orçamento na conta única e se transforma num fundo financeiro. Isso significa que agora os recursos são cumulativos, tornando o fundo muito potente. Além disso, proíbe que os governos contingenciem seus recursos”, explicou.

Pansera também destacou a iniciativa da Nova Indústria Brasil (NIB), proposta que visa a impulsionar a indústria nacional até 2033 através de seis eixos: cadeias agroindustriais sustentáveis e digitais; um forte complexo econômico e industrial da saúde; infraestrutura, saneamento, moradia e mobilidade sustentáveis; transformação digital da indústria; bioeconomia, descarbonização, e transição e segurança energética; e tecnologias de interesse para a soberania e defesa nacionais. Ele frisou que os principais desafios para a Nova Indústria Brasil são a perenidade do programa e seu financiamento, além de consolidar e ampliar seu alcance e integrar a academia com o setor privado. “É importante que o FNDCT ajude a financiar um sistema de reindustrialização para gerar emprego para a pós-graduação brasileira e também para levar o que temos nas prateleiras das universidades para o mundo real, o mundo produtivo”, afirmou.

Jefferson de Oliveira Gomes enfatizou que o sistema industrial está interessado em trabalhar parceria com a academia. “Nós sempre ouvimos que a universidade está distante da indústria, mas é importante perceber que a indústria também está distante da universidade”, afirmou.

Ele ressaltou os diversos aspectos que colaboram para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras pelas universidades. Além de seu papel essencial como espaço de debate, formação e pesquisa de qualidade, as universidades podem atuar como catalisadoras de inovação e desenvolvimento. A relação entre indústrias e academia é fundamental para o avanço da agenda de inovação no país.

Ele destacou que o desenvolvimento industrial e o social não estão dissociados – muito pelo contrário. Cada vez mais se demonstra que os dois devem caminhar juntos. “Se pensarmos nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), o primeiro é erradicar a pobreza. Se alcançarmos isso, vamos tirar 1,5 bilhão de pessoas da zona de pobreza. Isso significa 1,5 bilhão de pessoas consumindo, o que se traduz em crescimento, pois nosso modelo de cálculo de crescimento é o PIB”, explicou.

Segundo Adriana Ferreira de Faria, a Nova Indústria Brasil também utilizará o potencial de compras públicas para estimular o desenvolvimento de setores estratégicos para a indústria brasileira, promovendo a inovação no país. Ela destacou que a matéria-prima para a inovação é o conhecimento científico, mas quem faz a inovação são as empresas. “O Brasil avançou muito na produção científica. Fazemos muita pesquisa, produzimos muita ciência e publicamos bastante. Mas temos dificuldade em converter esse conhecimento em inovação.”

Ela alertou que, para avançarmos nesse quesito, precisamos olhar com mais cuidado para a educação. Faria apontou que o Brasil ficou entre os piores na avaliação do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) e em último lugar no quesito educação no estudo do IMD World Competitiveness Center, que comparou a prosperidade e competitividade de 64 nações, analisando o ambiente econômico e social do país para gerar inovação e se destacar globalmente. “Não vamos fazer ciência, tecnologia e educação no Brasil se não tivermos um olhar mais cuidadoso para a educação”, alertou.

Carlos Augusto Gadelha apontou que o mais difícil na inovação não é a técnica, mas a transformação social que nos permite libertar do passado e construir um futuro. Para ele, temos um longo e desafiador caminho pela frente. “Como reconstruímos um país que é um dos mais desiguais do mundo, com uma população que voltou a ter fome, e como temos um padrão tecnológico e produtivo sustentável?”.

Ele destacou que o programa Nova Indústria Brasil é crucial para reverter a desindustrialização precoce do País. A nova política prevê a articulação de diversos instrumentos de Estado, como linhas de crédito especiais, recursos não-reembolsáveis, ações regulatórias e de propriedade intelectual, além de uma política de obras e compras públicas com incentivos ao conteúdo local, para estimular o setor produtivo em favor do desenvolvimento do país.

Para Gadelha, as missões da Nova Indústria Brasil podem transformar a economia nacional em direção a uma economia mais equânime e sustentável, associando desenvolvimento econômico ao social e sustentável. “Um novo modelo de país que é inovador, dinâmico, que cresce o PIB. A área social e a ambiental aparecem como grandes vertentes de uma nova economia. O bem-estar social e o meio ambiente não apenas cabem no PIB, mas são novas frentes de expansão de uma economia inovadora e sustentável.”

Finalizando, Glaucius Oliva relembrou os anos difíceis do governo anterior de luta contra o negacionismo e a perseguição à comunidade científica. “Hoje vemos um FNDCT renovado, com mais transparência, e iniciativas que nos deixam otimistas e nos estimulam muito”.

Assista à mesa-redonda na íntegra:

https://www.youtube.com/watch?v=ICpixc5hyzI

Chris Bueno – Jornal da Ciência