Quem já passou por acidente de carro frequentemente conta a mesma história. O tempo desacelera e pode-se perceber em detalhes os eventos que transcorrem nos instantes antes do choque. É como se o movimento quase cessasse na iminência do estrondo violento, num pico de acuidade sensorial que cresce à medida que se aproxima o desastre, tão nitidamente prenunciado e mesmo assim inevitável. Inexorável. Bum.
Estamos em plena capotagem, no tempo veloz, mas paradoxalmente esticado dos desastres em curso. E que desastre! Reflitamos.
O capitalismo predatório, do alto de seus cinco séculos de vida, era até 2019 um bólido titânico rumando celeremente para o precipício da crise socioambiental. Firmemente fundado nos instintos ancestrais de acumulação e opressão, cada vez mais potentes e acelerados, atropelando a natureza à frente, nada parecia capaz de freá-lo.
E então, já numa das últimas curvas do percurso que leva ao desastre fatal, o capitalismo derrapou feio na pista, girando pneus em falso no óleo escorregadio da Covid-19.
A força centrífuga da morte elevou as rodas e o chassi voou, perdendo aderência à medida que a quarentena foi desacoplando as cadeias produtivas. Dois meses depois do anúncio oficial da pandemia pela Organização Mundial da Saúde, cerca de 30% da população mundial segue longe de seus locais de trabalho.
As economias dos países desenvolvidos se contraem violentamente. A do Reino Unido, por exemplo, encolheu 5,8% em março. Trata-se da pior queda desde o início do registro, em 1997. O preço do petróleo despencou para níveis de 1999 —e no final de abril chegou a ser negociado por valor negativo, quando alguns produtores tiveram que pagar para estocá-lo por falta de demanda.
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