O aprimoramento do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação e o aumento orçamentário do setor para 2% do PIB (Produto Interno Bruto) são caminhos essenciais para a retomada do crescimento científico no País. Este diagnóstico é parte de uma análise apresentada pela vice-presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), Fernanda Sobral, em aula magna realizada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Convidada pelo Programa de Pós-graduação em Política Científica e Tecnológica da Unicamp, Sobral falou na última sexta-feira (24/03) sobre o ‘Projeto para um Brasil Novo’, uma iniciativa realizada pela SBPC durante a campanha presidencial de 2022, que visou apresentar aos novos membros do Parlamento e do Executivo diretrizes e propostas de políticas públicas para a reconstrução do País, a partir de uma série de debates com especialistas.
“Esse projeto mostrou que Educação e Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) devem estar sempre associadas ao desenvolvimento do País, inclusive mostrou como a Educação é importante para CT&I”, ressaltou Sobral.
O projeto contou com um ciclo de debates cobrindo diversos temas: Ciência, Tecnologia e Inovação; Educação básica; Ensino Superior; Pós-graduação; Saúde; Meio Ambiente; Direitos Humanos; Segurança Pública; Diversidade de gênero e raça; Mudanças climáticas; Cultura e Questão indígena.
Com as considerações e metas a serem definidas em cada temática, foi estruturado um documento compilando as urgências do País. O documento foi entregue aos presidenciáveis nas últimas eleições, e muitos se comprometeram com as ações ali recomendadas.
“Algumas diretrizes recomendadas no documento já começaram a ser contempladas, como o aumento nos valores das bolsas da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Mas outras demandas urgentes ainda não ocorreram, como a revogação da Emenda Constitucional nº 95 de 2016, conhecida como Teto de Gastos, que não tem possibilitado um financiamento adequado, como a liberação dos recursos do FNDCT”, alertou Sobral.
A especialista também reforçou a necessidade de fortalecer o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, o que envolve o aumento do investimento no setor para, pelo menos, 2% do PIB – hoje, o recurso chega a 1% do PIB – e a reestruturação do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia. “Uma nova Conferência Nacional de CT&I precisa ser realizada já em 2024.”
No debate sobre Educação, a vice-presidente da SBPC defendeu um reforço ao ensino básico, principalmente para olhar os impactos negativos da pandemia na alfabetização de crianças. Também repercutiu as falas do ex-reitor da Universidade Federal da Bahia (UFSB) e da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Naomar de Almeida Filho, sobre a necessidade de tornar as universidades públicas mais autônomas. Por fim, defendeu o ensino interdisciplinar em todas as esferas:
“Eu acho muito importante esse modelo de formação mais aberto, principalmente com o intercâmbio entre instituições nacionais. Um Ciência com Fronteiras”, brincou. “Mas essa relação entre as instituições precisa ocorrer com menos burocracia, porque existe uma dificuldade em reconhecer os créditos [de disciplinas cursadas] no Brasil.”
Ainda no campo de políticas públicas, Sobral apontou outra meta listada no Projeto para um Brasil Novo e em elaboração pelo Governo Federal, o novo Plano Nacional de Pós-graduação (PNPG).
“Nós sabemos que já foi nomeada uma comissão do PNPG, mas esperamos que o próximo Plano contemple debates mais aprofundados sobre alguns temas, como saúde mental e cotas. E, também, precisamos olhar para os jovens que saíram do País, mas para isso precisamos de dados oficiais, um estudo que contemple quantos saíram, em quais áreas, entre outros pontos. Precisamos de mais informações sobre essa questão.”
A ciência precisa ser transformada pela diversidade, ressalta Sobral
Passando por temas como meio ambiente, questão indígena e saúde, a vice-presidente da SBPC ressaltou que debater Ciência, hoje, é debater a pluralidade de públicos do País.
“A gente precisa aldear e aquilombar a Ciência. Conviver com o diferente, seja de gênero, raça, idade ou de área. Isso é um processo de aprendizagem, mas também um exercício da democracia. E será que a Ciência transformada pela diversidade não poderá contribuir para transformar a sociedade?”, refletiu Sobral.
Questionada sobre os próximos passos do Projeto para um Brasil Novo, a especialista afirmou que, hoje, a SBPC e as demais entidades científicas estão acompanhando as ações governamentais.
“Estamos na vigília. Todo dia há uma observância do que está sendo feito pelo Governo Federal. E, quem sabe, não possamos criar um observatório desse projeto? Para apresentar o que já foi cumprido e o que ainda precisa ser feito”, concluiu.
O documento elaborado pelo Projeto para um Brasil Novo, com políticas públicas e diretrizes para a retomada científica no País, pode ser baixado neste link.
Rafael Revadam – Jornal da Ciência