O Brasil precisa retomar a sua participação em projetos científicos de cooperação internacional. Este foi o principal diagnóstico da mesa-redonda sobre o tema, realizada na última terça-feira (26/07), às 13h, no Anfiteatro 09 do Instituto Central de Ciências da Universidade de Brasília (ICC/UnB).
O evento fez parte da programação da 74ª Reunião da SBPC, que segue com atividades híbridas até o dia 30. Participaram do debate Sergio Machado Rezende, ex-ministro da Ciência e Tecnologia do Governo Lula (2005-2010) e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Luiz Davidovich, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); e Aldo Malavasi, membro do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP). A conversa foi mediada pelo vice-presidente da SBPC, Paulo Artaxo.
Abrindo as falas, o professor Luiz Davidovich trouxe um levantamento realizado em 2018, que listou grandes projetos globais. Davidovich explicou que os projetos científicos de cooperação internacional vêm de problemáticas que integram todas as nações.
“É quando pensamos em grandes problemas, problemas globais que necessitam de colaboração, como a regulação do espaço aéreo, ou seja, a gestão de satélites; os estudos na Antártida, porque um país só pode estar lá se for para fazer pesquisa; a poluição nos oceanos; além de temas mais digitais, como a internet e estudos sobre inteligência artificial.”
Aqui no Brasil, o especialista destacou o papel da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), que já fechou 78 acordos bilaterais com 89 instituições em 56 países, e citou também o acelerador de partículas Sirius, o INPE, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, e o SUS (Sistema Único de Saúde), que considera “o maior sistema de saúde pública do mundo”.
Davidovich concluiu sua fala alegando que o descaso do Governo Federal sobre a ciência global está fazendo com que o país caia posições em rankings internacionais de produção científica, e alertou que a Amazônia precisa ser olhada como foco de colaboração internacional.
“Leva muito tempo para construir um sistema de ciência e tecnologia no país, mas leva pouco tempo para destruí-lo. Nós precisamos de mais ciência, de mais colaboração, até para impedirmos a extinção dessa floresta”, alertou.
Já o professor Aldo Malavasi, do CTMSP, trouxe o panorama da Agência Internacional de Energia Atômica, uma entidade da ONU (Organização das Nações Unidas), que visa acompanhar o desenvolvimento de pesquisas sobre aplicações nucleares para controle em prol da paz.
Destacou as principais aplicações, principalmente nas áreas de segurança alimentar e medicina nuclear – essa última, que conta com atuação do País. “A cooperação brasileira nessa área é muito grande, principalmente nas definições de diagnóstico e tratamento”, pontuou.
Retomada de cooperações internacionais é urgente
Ex-Ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Machado Rezende trouxe um panorama da governança de CT&I no Brasil em sua fala. “O final dos anos 1980 e o início dos anos 1990 foram muito ruins para a Ciência, Tecnologia e Inovação, por conta da falta de recursos, algo que só foi melhorar entre os anos de 1999 e 2002”, explicou.
Rezende disse que, durante a sua gestão (no governo Lula), foi um dos encarregados na elaboração do Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, que contou com 87 programas, que foram realizados no País de 2003 a 2010. E entre os temas desse plano estava a expansão internacional, realizada por meio das agências de fomento federais e dos INCTs, Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia.
Entre os exemplos de programas de cooperação internacional que o Brasil participou, Rezende mencionou o Pierre Auger Observatory, um observatório localizado no deserto de Mendoza, na Argentina, em que o Brasil participou da construção em 2005, e o CERN (European Organization for Nuclear Research), um dos maiores laboratórios mundiais para o estudo de partículas.
Houve também a tentativa de inclusão do país no EsO (European Southern Observatory), uma organização intergovernamental de pesquisa em astronomia, composta por 17 países. “Em 2010, o presidente Lula propôs a entrada do País na entidade para possibilitar a utilização do observatório pelos astrônomos brasileiros, mas não conseguimos entrar até hoje”, detalhou.
Rezende reforçou que entre os anos de 2003 e 2010, o Brasil assinou acordos de cooperação internacional com nove países, e em 2010 foi lançado Sirius, que deve ser usado para pesquisas científicas globais.
“É necessária uma mudança de rumo da Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil de hoje. Nos últimos anos, a situação foi trágica. Só em 2021, dos R$ 5 bilhões arrecadados no FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), foram disponibilizados apenas R$ 500 milhões. Essa queda também atingiu diretamente o MCTI. Mas, no geral, sou positivo. O Brasil já passou por várias crises, e vamos superar a crise hoje”, concluiu.
O vice-presidente da SBPC, Paulo Artaxo, que estava conduzindo os debates na mesa, reforçou o papel do acelerador de partículas localizado em Campinas, e disse que o País precisa lutar para a expansão dos polos científicos:
“O Sirius é a única grande infraestrutura do país. O país que é a 10ª maior economia do mundo só tem um superlaboratório. Isso é constrangedor. E vamos trabalhar para termos um Sirius em cada estado”, ponderou
Rafael Revadam – Jornal da Ciência