Celebrações dos 200 anos da Independência do Brasil são oportunidades para refletir que futuro queremos para o País

“Rumo às independências – as comemorações do bicentenário” foi tema de painel da 73ª da Reunião Anual da SBPC

RUMO ÀS INDEPENDÊNCIAS – AS COMEMORAÇÕES DO BICENTENÁRIO

Em 2022, o Brasil comemora 200 anos da proclamação da Independência. E cientistas de todas as áreas do conhecimento acreditam que esta seja uma oportunidade para olharmos para o passado, compreendermos o presente e pensarmos o futuro. O assunto foi debatido durante o painel “Rumo às independências – as comemorações do bicentenário”, realizado nessa quinta-feira, 22 de julho, durante a 73ª Reunião Anual da SBPC.

Ildeu de Castro Moreira, presidente da SBPC, ressaltou que não existe ainda nenhuma articulação nacional orquestrada pelo governo atual para comemorar a data como deveria ser. Por isso, acredita que a sociedade civil, incluindo as instituições científicas, acadêmicas e civis, deve se mobilizar para isso. Segundo Moreira, já existem algumas iniciativas em andamento como, por exemplo, a interação com as Fundações de Amparo à Pesquisa (Faps) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para o lançamento de editais, reuniões com instituições e municípios em diferentes estados, edições especiais da revista Ciência e Cultura, publicada pela SBPC, atividades programadas pelas diversas sociedades científicas, mas que tudo isso ainda pode e deve ser ampliado.  “Podemos aumentar o diálogo para desenvolvermos novas ideias”, afirmou.

“Não queremos reduzir as comemorações a apenas discussões históricas. Claro que elas são fundamentais para entendermos o passado. Mas precisamos construir narrativas diferentes, em vários aspectos. Este é o momento de mobilizarmos as diferentes entidades”, disse Moreira.

O filósofo Renato Janine Ribeiro, presidente eleito da SBPC, que toma posse hoje, comentou que seria um momento muito oportuno para rever políticas de nominação e de lugares de memórias. “A única atividade que vejo é a reabertura do Museu do Ipiranga/Museu Paulista da Universidade de São Paulo, que foi fechado por falta de condições de segurança do prédio, há cerca de dez anos, quando a sua diretora teve a coragem de fechá-lo, mesmo sem falar com o reitor na época. Demorou muito para que o governo de São Paulo tivesse recursos para a sua reabertura.”

Para Ribeiro, o País já deveria ter, a esta altura, uma autoridade nacional para organizar essas atividades e promover debates para enriquecer a história e traçar o futuro. “Poderíamos ter editais de pesquisa, procurando analisar temas relacionados à independência. É um ótimo momento para termos mais informações desse período histórico, já que muitos pontos da história são desconhecidos, como, por exemplo, as revoltas nas diferentes capitanias/províncias. As pessoas mal sabem que os estados Grão-Pará e o Maranhão eram separados do Brasil. Não conhecem a existência da Batalha de Jenipapo (um dos confrontos mais sangrentos da Guerra da Independência do Brasil, foi um embate ocorrido no dia 13 de março de 1823 às margens do rio de mesmo nome na vila de Campo Maior, Piauí).”

Valdei Lopes de Araújo, professor associado da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e presidente eleito da Associação Nacional de História (Anpuh), acrescentou que a independência é um processo em disputa, complexo, vivo e aberto e, por isso, o momento é uma ótima oportunidade de discutir o passado, o presente e o futuro. “A história não é esquecida, ela pode ser sublimada e oprimida, mas não é esquecida. Portanto, essa reflexão deve ser feita para a construção de um projeto nacional”, comentou.

Marilene Corrêa da Silva Freitas, professora titular do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), disse que nas atividades comemorativas para o Bicentenário da Independência será também importante levantar e discutir pontos para traçar caminhos para dar autonomia para a ciência brasileira, diante dos interesses do Brasil. “É preciso trabalhar as desigualdades de políticas públicas e de incorporação científica da diversidade brasileira, já que o assunto é um enigma ainda”, afirmou, destacando as dificuldades das instituições no Amazonas.

Para os próximos cem anos, Freitas acredita que é preciso traçar metas para a incorporação das singularidades e a complexidade do “arquipélago cultural” brasileiro nas agendas científicas. “Entre outros pontos, precisamos incorporar também os sujeitos excluídos e invisibilizados no diálogo. Além de varrer o colonialismo e o racismo dos ambientes da produção do conhecimento, da cidadania e dos ambientes da formulação dos interesses da sociedade civil”, concluiu.

O sociólogo e escritor Jessé Souza ressaltou em sua apresentação que é preciso ainda olhar para trás e encarar os pontos que não deram certo e que continuam atrapalhando o desenvolvimento do País, como o racismo. Segundo ele, nesses 200 anos, o fato mais relevante foi a abolição da escravatura, em 1888, mas a República Velha, iniciada um ano depois, deu continuidade a essa escravidão, com outras máscaras, cujas sequelas continuam até hoje na sociedade. “Continuamos vendo pessoas sendo exploradas por sua energia muscular pelas classes superiores, e isso precisa mudar.”

Assista ao painel completo aqui.

Vivian Costa – Jornal da Ciência