Ciências humanas são fundamentais para a democracia de um País

Papel das humanidades na redemocratização do Brasil foi tema de mesa-redonda da 75ª Reunião Anual da SBPC nessa quinta-feira

a-redemocratizacao-e-as-humanidadesAs Ciências Humanas ajudam a compreender melhor o funcionamento de uma sociedade, sua diversidade cultural, sua história e, com isso, entender as pessoas e as relações sociais. Por isso elas são fundamentais para a democracia de um país. O tema foi discutido na mesa-redonda “A redemocratização e as humanidades”, realizada nessa quinta-feira (27), durante a 75ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). A reunião acontece até sábado, 29 de julho, na Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Curitiba.

Nos últimos anos, o Brasil assistiu a um ataque sistemático da ciência, assim como ao desmonte das universidades públicas. Esse cenário fragilizou a confiança da sociedade nas instituições de pesquisa e enfraqueceu a participação democrática de diversos grupos. Porém, a universidade resistiu. “O descrédito científico, especialmente com relação à educação, é muito grave. É importante o conhecimento para pensar os problemas sociais”, apontou Fernanda Antônia da Fonseca Sobral, professora emérita do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) e vice-presidente da SBPC.

Quando as diferenças passam a ser reconhecidas no processo de fazer ciência, ocorre uma maior abertura democrática. “Levar em conta a diversidade nas tomadas de decisões, não é pensar que somos todos iguais, é acreditar que compartilhamos um espaço de tomada de poder, que temos ali um princípio comum e que as decisões são respeitadas de acordo com as nossas origens”, explicou Frederico Augusto Garcia Fernandes, professor do Centro de Letras e Ciência Humanas (CCH) da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Para o pesquisador, o sentido de redemocratização passa pela reabertura do debate quanto ao fazer científico. “Após um longo período em que as universidades foram atacadas e abandonadas pelos governos, agora podemos trabalhar juntos no processo de reinvenção da democracia, que implica trabalhar conjuntamente, na esfera do coletivo.”

Para Geovana Mendonça Lunardi Mendes, professora do Centro de Ciências da Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Educação (ANPEd), o processo de sucateamento das universidades evidenciou não apenas um descaso com o ensino superior, mas com a educação como um todo. “A gente tem a educação como prática social, a gente tem a educação como agenda política, e a gente tem educação como campo científico.”

A pesquisadora afirmou que, nos últimos anos, a sociedade brasileira passou por um “letramento do ódio”, sendo também alfabetizada numa desconfiança contra a ciência – e isso trouxe um impacto severo no direito à educação. “A educação foi muito afetada por esse processo de descrédito científico que a gente passou no Brasil nos últimos seis anos. Com esse horizonte de redemocratização, precisamos dar conta de reverter isso. Esse processo de redemocratização e de defesa da ciência não foi dado de graça, ele foi construído com muita luta e muitos embates.”

Ao priorizar o conhecimento técnico e deixar as humanidades de lado, os próprios fundamentos da democracia são ameaçados, havendo uma aproximação com o modelo cultural de regimes autoritários.

Segundo Edna Maria Ramos de Castro, professora do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), os sistemas democráticos não sobrevivem sem uma diversidade de olhar ou pensamento crítico – que são desenvolvidas especialmente pelas ciências humanas. “As humanidades tiveram o papel de revelar, de mostrar que estava havendo uma preconização de um certo domínio do saber, um domínio sobre esses processos”, pontuou.

Para ela, agora que estão sendo retomados os rumos democráticos no Brasil, é o momento de enfrentar o retrocesso e sugerir políticas públicas para uma nova gestão. “A Constituição de uma nação pontuada pelos direitos humanos e democráticos e pela justiça ambiental exige uma construção coletiva. Para construir novas estratégias, é necessário vontade política de escuta e diálogo, assim como uma participação ampla da sociedade como instrumento de redemocratização.”

Assista à mesa-redonda na íntegra:

https://www.youtube.com/watch?v=3qF0Aj7xQPY

Chris Bueno – Jornal da Ciência