Universidades, fundações estaduais de fomento à pesquisa, trabalhadores e a comunidade científica protestam contra a interferência do governador Romeu Zema (Novo) na Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig). Por meio de decreto baixado na última quinta-feira (26), Zema retira a autonomia do órgão de fomento à pesquisa científica, um dos mais importantes do país.
Conforme o decreto, a presidência do Conselho passa a ser exercida por servidor da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (Sede), que acumula suas funções na própria Secretaria com a de presidente do Conselho Curador. O presidente e o diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação da Fapemig passam a ser indicados diretamente pelo governador, deixando de cumprir mandato fixo. E o Conselho Curador perderá também a função original, de deliberar sobre o manual da agência, sobre o plano de ação e sobre o orçamento anual e ainda sobre suas eventuais modificações.
Em nota conjunta, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) afirmam que é grave a “intervenção do governo de Minas Gerais na autonomia da Fapemig, que deixa de ser um órgão de Estado para ser um órgão de governo, sem nenhuma autonomia, com o governador podendo nomear e demitir seus dirigentes, que não terão mais mandato fixo”.
E lembram que as fundações de amparo à pesquisa que têm maior sucesso no Brasil são aquelas que atendem a dois requisitos:
- Dirigentes com mandato, garantindo que as decisões e concessões sejam feitas por mérito e não por conveniência política;
- Garantia de recursos em uma proporção fixa sobre as receitas ou o orçamento estadual.
Decreto de Zema é ilegal, alertam SBPC e ABC
As entidades ainda alertam para a ilegalidade do decreto de Romeu Zema. Um decreto estadual anterior (48.333, de dezembro de 2021) estabelece que qualquer reforma do estatuto exige “manifestação de todos os titulares dos órgãos e das entidades com competências afetas à matéria do ato proposto, com considerações de mérito, conveniência e oportunidade da proposta”.
“Como tal consulta não ocorreu, o decreto recém-baixado é ilegal e deve ser revogado. Mas o mais grave é que as alterações agora introduzidas contrariam a boa gestão de um sistema de ciência, tecnologia e inovação, que exige programas e projetos de médio e longo prazos, não dependendo de circunstâncias momentâneas e de governos de ocasião. É o que protege o conhecimento de sobressaltos e interesses menores, salvaguardando esforços de anos e investimentos importantes”, dizem ainda as principais entidades científicas brasileiras.
O Fórum das Instituições Públicas de Ensino Superior do Estado de Minas Gerais (Foripes) também criticou o decreto de Zema.”Esse novo estatuto não apenas despreza a gestão democrática das fundações de apoio, como também alija os pesquisadores e a comunidade científica das decisões da mais importante agência de fomento à pesquisa do Estado, abrindo espaço para atuações político-partidárias, ignorando o necessário envolvimento daqueles que, de fato, fazem ciência no Estado”, diz trecho de nota da entidade.
Entidades apontam regras descumpridas pelo governo
“O respeito à lista tríplice para Presidente e Diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação, a manutenção das atuais regras para a definição do presidente do Conselho Curador e o Estatuto atual asseguram as condições necessárias para que a política científica de Minas Gerais seja conduzida por sua Fundação de Apoio, de forma autônoma, como um projeto de estado em benefício de uma política de indução da
pesquisa e inovação científica independente de amarras políticas e arranjos partidários”, dizem os reitores.
O Conselho Nacional das Fundações de Amparo à Pesquisa (Confap) afirmou que, com a medida, o governo mineiro “está na contramão das boas práticas de gestão e do que é defendido pelos atores do Sistema Nacional de CT&I e pelo Confap, uma vez que o mandato democrático, por indicação dos pares, sem dúvida, gera estabilidade e maior segurança na continuidade da execução das políticas públicas de CT&I.
Em 2022, a Fapemig teve orçamento de mais de R$ 455 milhões, que foram investidos na área de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) no estado. Isso possibilitou o lançamento de 17 chamadas com oportunidades de financiamento para áreas diversas, além da reativação de parcerias e programas como o de Bolsas de Iniciação Científica Júnior.