A recuperação do Brasil no pós-pandemia passa pelo investimento em inovação – tecnológica e social – para avançar a transformação digital e a indústria 4.0, que serão o esteio da recuperação na maioria dos países. Essa foi a visão que permeou o painel “O desafio da inovação no Brasil”, realizado nesta quinta-feira (8/10) durante o segundo ciclo da 72ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Apresentado pelo presidente da SBPC, Ildeu de Castro Moreira, o painel em versão virtual foi coordenado por Lúcia Carvalho Pinto de Melo, pesquisadora titular da Fundação Joaquim Nabuco. A atividade contou com a participação de Jorge Almeida Guimarães, presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii); Marcelo Bortollini, diretor da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e José Ivonildo do Rêgo, professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e diretor do instituto Metrópole Digital (IMD) de Natal.
Participaram também Fábio Deboni, gerente-executivo do Instituto Sabin, e Guilherme Ary Plonski, diretor do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) e também coordenador científico do Núcleo de Política e Gestão Tecnológica da USP.
O presidente da Embrapii, Jorge Almeida Guimarães, falou das dificuldades de incentivar a inovação industrial no País. Os maiores obstáculos, segundo seu relato, têm a ver com a falta de entrosamento entre setor público e privado nos principais polos de produção inovativa, que são as universidades, especialmente as federais.
Do lado do setor privado, disse Guimarães, há falta de investimentos em inovação e falta de uma visão de longo prazo, que se refletem na apresentação de projetos. “Na Embrapii, cerca de 10% dos projetos são na área de saúde, quase nada na área biológica, e a covid-19 pegou muitos países de calça curta. Não à toa sofremos com questão de testes, vacinas e biofármacos”, comentou.
Marcelo Bortollini, da Finep, expôs o histórico da agência que tem 53 anos de investimentos em grandes projetos no País. Bortollini destacou como alguns dos entraves ao desempenho da agência o excesso de burocracia e a infraestrutura de pesquisa, de pequeno porte e muito fragmentada no País, com poucos centros especializados.
Mas frisou que, apesar das dificuldades, a agência ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovações (MCTI) está investindo R$ 350 milhões este ano em projetos ligados ao combate à pandemia do coronavírus (pesquisa, parcerias com universidades, laboratório de campanha para testes de covid-19 e outros).
“Estamos trabalhando em tecnologias e infraestrutura de pesquisa para que as coisas possam caminhar. Acho que o rumo que devemos tomar é trabalhar em direções alinhadas e parcerias com instituições como a SBPC, CNPq, Embrapii, todos juntos trabalhando em prol do desenvolvimento”, disse Bortollini.
O engenheiro José Ivonildo do Rêgo fez um balanço das atividades do IMD e apontou deficiências básicas, como a falta de conexão de internet em grande parte do Brasil como um dos obstáculos ao desenvolvimento tecnológico e de pessoal especializado. “Vejo com grande preocupação a falta de rumos do País na área tecnológica”, afirmou. “Estamos vivendo a 4ª revolução industrial e parece que não estamos enxergando isso, não temos um plano nacional para enfrentar essas questões.”
Fábio Deboni, gerente-executivo do Instituto Sabin alertou para a necessidade de incorporar aspectos socioambientais para tornar a inovação mais inclusiva. Reiterou a importância da subvenção estatal, mas disse que no campo da inovação social surgem novas fontes de recursos que incorporam vários elementos de mercado, desde a doação, financiamentos não reembolsáveis até participação acionária (equity). ”A gente entende que o governo é necessário, mas também a empresa, o cidadão, o mercado de capitais. Vamos precisar de todos os bolsos para poder dar conta dos desafios colocados, mas há espaço para todo mundo”, declarou Deboni.
Guilherme Ary Plonski pediu que se evitasse “a fetichização da inovação”, como se patentes fossem a solução para todos os problemas do País: “Acho que precisamos evitar confundir inovação tecnológica com sofisticação, aquela para ganhar prêmios em rankings”. Para ele, o Brasil precisa fazer o básico e aproveitar os recursos existentes. Exemplificou: “Houve uma inovação social muito importante chamada agentes de saúde, que, nessa pandemia, foi subutilizada. Então o problema não é fazer inovação. Inclui inovação, mas tem outras dimensões”, afirmou Plonski.
Para Lúcia Carvalho Pinto de Melo, é preciso encontrar novas métricas para avaliar a produção do conhecimento em relação às necessidades da sociedade. “O grande desafio para o século 21 será como garantir condições de desenvolvimento sustentável e isso não se dá sem conhecimento cientifico forte nas áreas de fronteira.”
No encerramento do painel, o presidente da SBPC destacou que o debate deixou claro que o tema da inovação é central e que há a necessidade de construir um projeto de país mais rico, menos desigual, que aproveite as potencialidades e incorpore os jovens. “Neste momento, estamos em uma luta aguerrida dentro do Congresso Nacional e junto ao governo para ter mais recursos, porque essa inovação de que falamos aqui depende de bolsas, depende de pessoal, depende de laboratórios funcionando”, afirmou Ildeu Moreira.
Assista ao debate sobre inovação na íntegra pelo canal da SBPC no Youtube
Jornal da Ciência