O químico José Israel Vargas ocupou o posto de Ministro da Ciência e Tecnologia de 27/10/1992 a 01/01/1999, começando no governo Itamar Franco e concluindo no de Fernando Henrique Cardoso.
Ele é um dos oito ex-titulares da pasta consultados pelo Jornal da Ciência sobre o cenário atual do setor e estratégias de atuação. Cada um respondeu, por telefone ou e-mail, a três questões: Como vê a Ciência e a Tecnologia no Brasil hoje? Que estratégia sugere para a comunidade científica para atuar nesse cenário? e Que estratégia sugere para o desenvolvimento futuro?
Os oito depoimentos estão publicados na nova edição impressa do Jornal da Ciência que circula essa semana. De hoje até sexta-feira (19/7), o Jornal da Ciência vai publicar no site os depoimentos completos, dois por dia.
Leia abaixo a entrevista:
JC – Como vê a Ciência e a Tecnologia no Brasil hoje?
José Israel Vargas – Vejo a situação da CT&I mal já há algum tempo. Do ponto de vista administrativo, acho desastrosa a fusão do MCTIC com Correios, tirou o foco, a funcionalidade. Segundo problema são os recursos. O país está em crise terrível e crescente desde 2014, a participação da ciência no PIB, que era da ordem de 1%, se tornou ridícula. Realmente a C&TI está muito prejudicada e, em minha opinião, o problema central é o distanciamento do setor produtivo com a ciência e isso tem várias origens. Mas se deve fundamentalmente à situação desastrosa do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), que leva dez a 13 anos para conceder uma patente a invenções e descobertas. Hoje a produção científica e tecnológica das instituições independentes – universidade e institutos de pesquisa – estão produzindo para o estrangeiro, porque você não tem produção.
JC – Que estratégia sugere para a comunidade científica para atuar nesse cenário?
JIV – A Academia Brasileira de Ciência e a SBPC deveriam lançar uma campanha esclarecedora e contínua e muito intensa para uma reforma do Inpi. Países como Austrália, Nova Zelândia, Alemanha, Suécia e Estados Unidos conseguem patentes em prazos extremamente curtos, alguns deles em menos de um ano, enquanto nós precisamos de dez a treze anos. E o grosso das patentes concedidas aqui é dado aos chamados residentes, que na nomenclatura internacional são empresas sediadas no País. Mas de fato os residentes são firmas estrangeiras que registram aqui patentes de descobertas feitas no exterior. Em um artigo que escrevi eu mostrei que o número de patentes registradas no Brasil é maior que o número de artigos publicados por brasileiros, isso é por causa da demora. Dos 20 países que mais tem patentes registradas em vigor, o Brasil é o 19º apesar de o grosso ser de firmas estrangeiras que registram aqui como se fossem residentes, mas na verdade a pesquisa foi feita fora do Brasil.
JC – Que estratégia sugere para o desenvolvimento futuro?
JIV – É preciso valorizar as ideias. Nos EUA, a ideia inovadora tem valor, no Brasil não tem. Primeiro, porque as empresas brasileiras têm pouco capital; segundo, o próprio cientista não tem conhecimento nem do valor de mercado das coisas que são produzidas. Isso porque a exigência dos nossos institutos de pesquisa é a publicação de dois trabalhos por ano, sem dar muita relevância ao valor econômico desse trabalho. Caberia a agencias como a Inpi, a Finep selecionar esses trabalhos e criar um escritório de venda de inovações brasileiras que tem valor econômico. Existem nos EUA firmas que fazem só isso, assumem as pesquisas, as invenções, se for vendável cobram uma porcentagem, 3%, 6%, durante a duração da patente que é de 20 anos.
Leia amanhã os depoimentos de Roberto Amaral e Sérgio Rezende.
Janes Rocha – Jornal da Ciência