O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou, ao longo dos últimos meses, os resultados preliminares do Censo 2022. Nesta semana, finalmente foram apresentados os dados finais, concluindo um retrato detalhado e expressivo do Brasil de 2022, pós-pandemia. O Censo vai além de números: ele revela quem somos e oferece a base para a criação de políticas públicas capazes de atender às necessidades da população. Afinal, qual é a cara do nosso país hoje?
Além de analisar os dados, é necessário refletir se nossos governos – federal, estaduais e municipais – e o Congresso Nacional de fato refletem a diversidade, as características e as demandas do Brasil. Até que ponto nossos representantes se assemelham ao país que representam?
A imprensa nacional destacou mudanças significativas nos padrões de moradia, como o aumento da proporção de brasileiros que vivem de aluguel, agora 1 em cada 5, número muito maior do que em 2010. A conectividade também alcançou novos patamares, com quase 90% dos lares brasileiros conectados à internet, embora mais de 20 milhões de pessoas ainda vivam sem acesso domiciliar.
Esse é um contraste importante: o Brasil tem uma conexão à Internet muito elevada, mas que convive com deficiências gritantes em saneamento básico, renda, saúde e educação. Em outras palavras, avançamos muito no uso de tecnologias recentes, mas não fomos capazes, enquanto nação, de atender a exigências que nos países desenvolvidos já foram completadas durante o século XX.
A configuração familiar também passou por transformações marcantes. O número de lares chefiados por mulheres cresceu substancialmente, chegando a quase metade das unidades domésticas, enquanto o número de casais do mesmo sexo convivendo sob o mesmo teto aumentou expressivamente, registrando um crescimento de 552% em 12 anos. Por outro lado, a proporção de casais com filhos caiu de forma significativa, evidenciando mudanças profundas nos modelos familiares tradicionais.
Um dado que preocupa muito é a expansão das favelas no país. Em 12 anos, o número dessas comunidades cresceu de 6.329 para 12.348, abrigando mais de 16 milhões de pessoas – 8,1% da população brasileira. Essa realidade, marcada por uma população predominantemente jovem e vulnerável, revela desigualdades estruturais profundas, com alta concentração de moradores pardos e pretos, além de uma precariedade evidente em serviços básicos como saneamento, saúde e educação.
No final de novembro – para citarmos um exemplo da necessidade e utilidade desse tipo de informação – o presidente Lula lançou o programa Periferia Viva, voltado à urbanização de favelas. Esse é o papel do Censo: trazer visibilidade a essas condições, levar luz a problemas que demandam soluções estruturadas. Precisamos conhecer nossa realidade, nossas populações, nossas cidades, nossa zona rural, nossas deficiências, onde estão os problemas, e quais soluções precisamos. Isso sabemos apenas com dados contundentes. Política pública não se faz na base do achismo. Essas informações são essenciais para o planejamento e a construção políticas públicas se queremos reduzir as desigualdades sociais no Brasil.
Os números do Censo 2022 revelam o Brasil de hoje – diverso, desigual e em constante transformação. Cabe a nós, a partir desse retrato, planejar e construir o Brasil que queremos e que, mais do que tudo, merecemos. E voltamos à questão que colocamos no início deste editorial: em que medida nossos representantes efetivamente representam nossa sociedade? E em que medida eles realmente atuam para atender às necessidades de nossos concidadãos?
Renato Janine Ribeiro, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC