EDITORIAL – Qual o impacto do Brasil ao ser sede de uma COP?

Neste mês de agosto, Manaus sediou duas agendas complementares de preparação para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30): o Encontro da Comunidade Cientifica e Tecnológica da Amazônia com a Presidência da COP30 e a visita da primeira-dama e enviada das Mulheres na COP, Rosângela Lula da Silva (Janja), à Amazônia Legal. Ambos os eventos convergem, direta ou indiretamente, para uma mesma questão: quais os diferenciais de uma COP quando ela é sediada no Brasil?

O primeiro encontro evidenciou a necessidade de ampliar o diálogo com as instituições científicas da Amazônia. Embora temas centrais como mudanças climáticas, desenvolvimento sustentável, transição energética e descarbonização tenham incluído menções à região, é essencial que o conhecimento amazônico tenha espaço para se manifestar de forma plena. Valorizar a ciência produzida na Amazônia e integrar suas contribuições é passo fundamental para fortalecer a agenda da COP30 e seu legado.

Como resposta, mais de 400 pesquisadores da região, vinculados a mais de 70 instituições de ensino e pesquisa e articulados com movimentos sociais, representantes de comunidades indígenas e ribeirinhas, realizaram um amplo mapeamento que evidencia alternativas tecnológicas nascidas na Amazônia e pensadas para enfrentar a emergência climática global. Todos sabem que a Amazônia está entre as regiões mais afetadas pelas mudanças do clima; o que precisa ser cada vez mais difundido é que, além de sofrer os impactos, ela também oferece soluções concretas e inovadoras.

São soluções que nascem do encontro entre ciência e conhecimento tradicional, entre a força da tradição e os avanços dos estudos acadêmicos. Esse diálogo ficou evidente também na agenda da primeira-dama, Rosângela Lula da Silva. Em visita ao Amazonas, para contribuir na construção da Carta das Mulheres à COP30, Janja conheceu de perto a realidade de mulheres da região: ouviu de pescadoras como as mudanças climáticas vêm afetando a disponibilidade de alimentos que garantem renda e sustento; constatou as dificuldades de acesso a serviços básicos de saúde em territórios ribeirinhos; e compreendeu que, para esses povos, o que chamamos de política ambiental é, antes de tudo, valor de vida.

Esta será a primeira vez que uma Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas ocorrerá na região amazônica, e o que se espera é que ela traga visibilidade às necessidades e potencialidades da maior floresta tropical do mundo e demais biomas brasileiros. Mas, para isso, é necessário que a Amazônia não esteja presente apenas como cenário, e sim como colaboradora estrutural dos debates, como ator a ser escutado e consultado pelos chefes de Estado mundiais.

Em paralelo, o Brasil tem a responsabilidade de apresentar os seus esforços na área, com destaque para políticas de energias renováveis e de agricultura de baixo carbono. Infelizmente, as recentes manifestações no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, que visavam flexibilizar a Lei do Licenciamento Ambiental, revelam que ainda há desafios internos a superar. Sediar uma COP exige reconhecer que desenvolvimento sustentável e mitigação das mudanças climáticas não são apenas compromissos internacionais, mas também uma agenda de conscientização e mobilização nacional.

Após o calendário de eventos realizado neste mês, tanto o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, quanto a primeira-dama, Janja da Silva, se comprometeram a olhar para o conhecimento e para as necessidades da Amazônia Legal. Nesta escuta à comunidade científica da região, contou-se também com a presença da ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, reforçando o papel estratégico da ciência amazônica.

Oficialmente, o calendário pré-COP acontecerá nos dias 13 e 14 de outubro, em Brasília. Nesse evento, espera-se que os debates agora semeados na Amazônia se fortaleçam. Afinal, o legado que o Brasil pode levar à COP é a mensagem de que é impossível debater política ambiental sem considerar a ciência.

Francilene Garcia, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.

Veja as notas do Especial da Semana – COP30 e papel do Brasil na discussão

Jornal da Ciência – Enviada especial da COP30, Janja vai à Amazônia e conhece povos tradicionais e comunidade científica da região

Jornal da Ciência – Cientistas da Amazônia entregam contribuições estratégicas à presidência da COP30

Inpa, 19/08/2025 – COP30 – Inpa reforça contribuição da ciência da Amazônia com soluções para crise climática

Inpa, 21/08/2025 – Inpa e comunidade científica da Amazônia entregam documento com contribuições para a Conferência do Clima

Ufam, 21/08/2025 – ICTs amazônicas entregam documento com as contribuições regionais no tema das mudanças climáticas ao presidente da COP30

Agência Gov, 20/08/2025 – Instituições científicas da Amazônia apresentam propostas para a COP 30

Folha de S. Paulo, 04/06/2025 – Pesquisadores da Amazônia esperam valorização de povos tradicionais e da ciência feita na região como legado da COP30

Brasil de Fato, 06/06/2025 – Mais de 30 entidades indígenas exigem poder de decisão efetivo na COP30 e proteção dos territórios como ação climática prioritária

ISA, 09/05/2025 – Protagonismo dos povos indígenas na COP30 é tema de episódio do “Vozes do Clima”

Carta Capital, 16/04/2025 – O que está em jogo na COP30?