Pesquisadores de diversas universidades brasileiras se reuniram no dia 27 de abril no Instituto Ayrton Senna para apresentar estudos científicos que podem ajudar a melhorar a Educação
Nesta segunda-feira (27/04) aconteceu na sede do Instituto Ayrton Senna, em São Paulo, a segunda reunião da Rede Nacional de Ciência para a Educação (Rede CpE), que contou com a presença de pesquisadores que apresentaram dez estudos científicos que podem ajudar a melhorar a Educação no Brasil. O evento contou ainda com a presença do presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Jorge Guimarães, a presidente e o diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna, Viviane Senna e Mozart Ramos, respectivamente, entre outros.
Roberto Lent, diretor do Instituto de Ciências Biomédicas, do Centro de Ciências da Saúde (CCS), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e um dos idealizadores da Rede CpE, disse que tudo ainda é muito novo e por isso, os encontros ainda estão sendo experimentais. “O primeiro aconteceu em 27 de novembro do ano passado. Hoje optamos por um seminário rápido para conhecermos algumas pesquisas. Estamos testando este formato, que é uma troca de experiências, mas também teremos um simpósio em julho”, disse.
Segundo o pesquisador, todo o trabalho do grupo tem como objetivo ampliar o diálogo em torno do assunto, inclusive com professores e gestores de educação, para que eles no futuro tenham acesso ao que o grupo está produzindo e discutindo. Para Lent, a rede tem caráter abrangente, diversificado, multipropósito, mas sempre com foco em práticas que possam ser desenvolvidas nas redes públicas de ensino. “Não pretendemos tomar o lugar de gestores e professores, nem ensinar ciência. A ideia é construir uma via de mão dupla, mas são os professores que seguem na ponta”, afirmou.
Apoio da Capes
Jorge Guimarães, presidente da Capes, lembrou que a Rede CpE surgiu após Lent ser convidado a representar a Capes em um simpósio sobre “Science of Learning”, em Shanghai, China, em 2013. “Quando ele voltou, já estava encantado com a criação da Rede”, disse lembrando que a Capes apoiou tudo desde o começo.
Guimarães ressaltou a importância da criação da Rede CpE e ainda disse que por conta de seu objetivo, o projeto deverá ter financiamentos. “As informações geradas pelo grupo serão de grande importância para toda a educação, inclusive a básica”, disse. E completa, “a Capes quer estimular mais pessoas a agirem como multiplicadores de profissionais e a rede será uma ótima oportunidade para isso”.
A Rede CpE
Durante a abertura, Lent ressaltou que a curva dos indicadores no Brasil está melhorando, mas o ritmo de crescimento ainda é baixo em relação a outros países. “Se consertamos a educação com aquilo que já sabemos, como tempo integral, melhorar os salários dos professores, que são coisas meio óbvias, muitas coisas melhorarão. Mas para fazermos a diferença, para que a nossa curva seja mais inclinada que de outros países precisamos de ciência. Precisamos criar tecnologias, procedimentos, processos baseados em ciência para melhorar o aprendizado de nossas crianças. Então, estou convencido que temos que começar isso no Brasil”, ponderou. E completa, “os grupos existem, mas eles são dispersos”.
Lent disse ainda que desde novembro a Rede CpE está tomando corpo. “Até o momento constituímos uma pequena equipe, que contará entre outros profissionais, com Daniele Botaro, que será responsável por fazer um levantamento de quem é quem no Brasil em alguma área da ciência. Também temos uma jornalista que será responsável por toda comunicação, incluindo site, redes sociais”.
Já a presidente do Instituto Ayrton Senna, Viviane Senna, disse que está animada com o trabalho da Rede CpE porque a educação brasileira precisa mesmo avançar. “Nós tivemos uma revolução científica gigante nestes últimos 150 anos e esta revolução entrou na vida das pessoas em todos os sentidos, na maneira de viver, de trabalhar, de se relacionar, de se comunicar. Ela só não entrou na educação. A educação continua parada no século XIX, alheia a estas mudanças. Fazendo a mesma coisa, do mesmo jeito. As regras continuam as mesmas, como a maneira de ensinar e aprender. E quando se fala em fazer uma escola para o século XXI, muitas pessoas pensam em colocar a tecnologia dentro da sala de aula, como tabletes, por exemplo. Mas a ciência vai muito além disso. Acreditamos que a ciência possa nos ajudar a melhorar a educação, a melhorar as técnicas de aprendizagem, as políticas públicas. Por muito tempo a educação foi feita na base do achismo e idealismo. Está na hora disso mudar. Por isso, estamos empolgados com a criação da Rede CpE”, afirmou.
Objetivo
A Rede CpE tem como objetivo construir um novo espaço de diálogo entre cientistas, educadores e poder público na busca por melhorias do cenário educacional brasileiro.
Reunidos na UFRJ, o grupo formulou na primeira reunião – que aconteceu em novembro – a carta de princípios que irá orientar os trabalhos da rede e definiram os principais passos para 2015. Entre outras iniciativas, o grupo pretende fomentar pesquisas com bolsas e subsídios e promover encontros para a troca de experiências e resultados obtidos em trabalhos acadêmicos.
A carta de princípios que forma a Rede defende a importância de que “a comunidade científica se associe a outros segmentos sociais e assuma um papel mais propositivo e inovador, criando alternativas baseadas na ciência para as demandas sociais referentes à educação”.
Palestras
O encontro, que aconteceu no Instituto, contou com dez palestras de cientistas que já trabalham para saber como as pessoas aprendem, como se comunicam na relação professor-aluno, quais facilitadores existem para a memória, temas estes que podem subsidiar práticas e políticas educacionais.
Entre os temas das palestras estavam “Competências Cognitivas no Século XXI – Medidas de Processos de Raciocínio, Conhecimento e Criatividade em sistemas de avaliação em larga escala”, de Ricardo Primi; “Bases neurobiológicas da aprendizagem da leitura e da dislexia”, Augusto Buchweitz; “Alguns correlatos psicológicos e sensóriomotores do processo de ensino-aprendizagem”, Hamilton Haddad Junior; “Percepções e reações implícitas: implicações para viés de atitude, julgamento e desempenho”, Eliane Volchan; “Modelos de plasticidade sináptica em redes neurais”, de Antonio Roque; “Materiais e metodologias alternativas para o ensino de ciência: como avaliar cientificamente seu uso”, João Batista Rocha; “Multiplicadores multiculturais promovendo agentividade educacional”, Aniela Improta França e Marcus Maia.
Entre os destaques está a palestra “O sono e a escola ideal”, feita por Fernando Louzada, que abordou a importância do sono. Segundo ele, o sono é importante para consolidar o que a gente aprende. “A gente precisa dormir para aprender. O sono tem um papel ativo. Durante o sono, facilitamos a evocação daquela experiência, daquele conhecimento”, disse. E completa, “durante o sono os neurônios são ativados. Se estou ativando diferentes redes e se esta ativação se repete, aumenta a possibilidade de consolidar, de reforçar as conexões entre os neurônios”. Ele ainda disse que tirar uma soneca, entre 40 min e 1h30 durante a tarde, seria uma estratégia para compensar o sono perdido, principalmente para as crianças.
Outra palestra que chamou a atenção foi dada por Lilian Cristine Hübner, que falou sobre sua pesquisa “Aquisição e processamento de línguas no bi-e multibilinguismo”. Ela discorreu sobre as vantagens e desvantagens de se aprender, inclusive ainda criança, de duas ou mais línguas.
Segundo ela, é preciso dar uma atenção maior ao multilinguísmo no Brasil, repensar políticas de manutenção línguas de imigração – uma vez que elas estão sumindo já que a geração mais nova não está ensinando seus filhos, principalmente no Sul do país. “É preciso repensar e refletir sobre o ensino e a aprendizagem dessas línguas. Sobre a importância de métodos de ensino adequado para a língua estrangeira nas nossas escolas. Pensar no desenvolvimento cognitivo que vem junto com o aprendizado de outra língua. Criar uma postura mais reflexiva da importância do aprendizado de uma língua estrangeira no país e fomentar políticas para tal”, disse.
“A gente percebe algumas vantagens nos estudos da literatura do bilinguismo de crianças e até idosos. Nas crianças há um maior controle inibitório, maior flexibilidade mental, maior consciência metalinguística, maior criatividade. Nos adultos, entre vantagens, aumento de reservas cognitivas, como aumento da neuroplasticidade”. E lembra que há um estudo com idosos com mal de Alzheimer que foi percebido que os idosos que tinham aprendido outro idioma, demoraram quatro anos – em média – a mais para apresentarem sintomas da doença. “Quem é bilíngue conta com uma reserva cognitiva, o que faz postergar um pouco a doença”, finaliza.
(Vivian Costa/SBPC)