Entidades pedem retirada de pauta do PL das Fake News

Posição da SBPC e outras 34 entidades é que o projeto em análise no Senado contém riscos à liberdade de expressão e precisa ser debatido com a sociedade antes de ser votado

Diversas entidades civis, empresas e instituições acadêmicas divulgaram nessa terça-feira, 2, nota conjunta pedindo ao Senado Federal que retire da pauta de votações o PL n° 2.630/2020, que pretende criar novas regras para o combate às Fake News. Na nota, as 35 entidades signatárias apontam a existência de graves riscos às liberdades individuais, censura e violação da privacidade dos cidadãos depois das mudanças propostas pelo relator, senador Angelo Coronel (PSD/BA), sobre o texto pautado no Plenário para deliberação nesta mesma terça-feira. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) é uma das signatárias do documento.

O pedido de retirada de pauta do PL é feito em prol da ampliação do diálogo em torno das fake news e da construção de métodos para combatê-las. Na nota, as entidades frisam que todos os signatários são defensores do direito ao acesso à informação de qualidade e contrárias ao uso da Internet para a promoção de discursos de ódio, mentiras e crimes contra a honra. No entanto, a tramitação açodada do PL, sem diálogo com as diversas esferas que zelam pela qualidade da informação e uso cívico e livre das redes sociais, torna a proposta um risco para os cidadãos, que passariam a ser responsabilizados criminalmente e banidos das redes digitais até mesmo em casos de repasse inconsciente de conteúdos classificados pelas próprias plataformas – e apenas por elas, sem mediação da sociedade – como “desinformação”.

“Senadores da República não podem se ancorar num justo clamor popular para votar um texto que não foi discutido”, criticam as entidades. “O texto do relatório (…) apresenta para votação uma proposta que subverte o propósito do texto inicial do senador Alessandro Vieira, restringe liberdades individuais e pode dar margem à censura e à violação da privacidade dos cidadãos.” Além da SBPC, subscrevem o pedido de retirada de pauta, empresas de fact cheking como Agência Lupa e Aos Fatos; portais de mobilização virtual como o Avaaz; entidades jornalísticas como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji); além de especialistas em direito digital. A União Latina de Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura (ULEPICC–Brasil) e a Federação Brasileira das Associações Científicas e Acadêmicas de Comunicação (SOCICOM), afiliadas da SBPC, também endossam o pedido.

Facebook, Twitter e Google também assinam a solicitação de adiamento, frente aos riscos de censura nas redes sociais. A Coalizão Direitos na Rede foi a responsável pela mobilização pela ampliação do diálogo em torno do PL.

Confira a nota na íntegra enviada aos Senadores da República:

Nota Pública

Votação do PL das fake news põe em risco liberdade de expressão online e não pode ser votado às pressas

Relatório do sen. Ângelo Coronel demanda mais tempo de discussão antes de ser apreciado

Na manhã desta terça-feira, 02, a sociedade brasileira foi surpreendida pelo relatório do Senador Ângelo Coronel ao Projeto de Lei 2630/2020 sobre fake news. Trata-se do texto que, em algumas horas, pode ir à votação no Senado Federal.

As entidades representativas, instituições acadêmicas, organizações da sociedade civil, empresas e cidadãos que subscrevem essa nota e que defendem o direito de todos e todas à informação de qualidade, sendo contrárias ao uso da Internet para promover ódios e crimes e disseminar mentiras, alertam para altos riscos da votação de um relatório que não foi debatido com o conjunto dos senadores, nem com a sociedade.

Em um contexto em que o Senado realiza deliberações por meio do sistema remoto, sem a existência de comissões, o debate aprofundado sobre o tema se mostrou comprometido desde o início. Mesmo assim, nas últimas semanas, diversos esforços foram feitos, por diferentes setores, no sentido de apresentar propostas para coibir o uso indevido de plataformas de internet, ampliar sua transparência e combater a desinformação sem violar a liberdade de expressão e a privacidade dos brasileiros.

O texto do relatório, entretanto, desconsidera esses esforços e apresenta para votação uma proposta que subverte o propósito inicial de discussão de critérios de transparência na Internet – que já trazia preocupações -, restringindo liberdades individuais e podendo dar margem à censura e à violação de direitos fundamentais dos cidadãos. Tais preocupações, que tem sido foco de atenção desde o início da tramitação do PL, agora se apresentam como ameaça concreta neste substitutivo.

Em função disso, pedimos que o Projeto de Lei 2630/2020, que Institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, seja retirado da pauta do Senado, a fim de que seja aperfeiçoado e amplamente debatido com a sociedade brasileira, da forma que uma lei desta envergadura requer.

Assinam esta nota:

Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo)

ABO2O

Access Now

Agência Lupa

Aos Fatos

Asociación Latinoamericana de Internet – ALAI

Associação Brasileira de Imprensa – ABI

Associação Nacional para Inclusão Digital – ANID

Avaaz

Boatos.org

Brasscom

Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação

CamaraEnet

Coalizão Direitos na Rede

Facebook

Fecomércio SP

Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj)

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC)

Google

Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação, USP

Instagram

Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio)

International Fact-Checking Network (IFCN)

ISOC Brasil – Internet Society

Movimento Agora!

Pinheiro Neto Advogados

Projeto Comprova

Repórteres Sem Fronteiras

SaferNet Brasil

Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC

Ulepicc-Brasil (União Latina da Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura – Capítulo Brasil)

TozziniFreire Advogados

Transparência Brasil

Twitter

Whatsapp

 

Adesões individuais:

André Barrence – membro do Movimento Agora!

Flávia Lefèvre Guimarães – ex-conselheira do CGI.br e integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

Flavia Penido – advogada

Gustavo Maia – Colab

João Francisco – membro do Movimento Agora!

Jose Luiz Ribeiro Filho – ex-conselheiro do CGI.br representante da comunidade científica e tecnológica

Leandro Machado, cientista político e ativista

Natalie Unterstell, membro do Movimento Agora!

Nivaldo Cleto – Conselheiro eleito do CGI.br

Marcos Dantas – Professor Titular da Escola de Comunicação da UFRJ e Conselheiro eleito do CGI.br

Pablo Ortellado – USP

Percival Henriques – Conselheiro Eleito do CGI.br

Rodrigo Bandeira de Luna – membro do Movimento Agora!

Tanara Lauschner – professora da UFAM e Conselheira eleita do CGI.br

Thiago Tavares – ex-conselheiro do CGI.br e presidente da SaferNet Brasil

 

Mariana Mazza – especial para o Jornal da Ciência